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30 Fevereiro 2021 | AutoData OPINIÃO » FORD POSIÇÃO DELICADA É preciso muita atenção para o fato de que a indústria automobilística precisa se reinventar em todo o mundo e que os esforços no caminho da eletrificação estão cada vez mais intensos e rápidos. A corrida para chegar a uma fórmula viável está deixando para trás empresas e países que entraram tarde ou ainda nem estão participando desta disputa. E esta infelizmente pode ser exatamente a situa - ção do Brasil, ainda mais delicada quando vislumbramos a intensa crise de credibili- dade institucional e política, com atrasos de várias reformas estruturais urgentes. Pelo menos é isto o que dizem as prin- cipais entidades empresariais do País. Para a Fiesp, por exemplo, a decisão da Ford deve ser vista como “triste notícia”, além de alerta para os custos de produzir em solo brasileiro. AAnfavea preferiu não comentar direta- mente o assunto, afirmando que “trata-se de uma decisão estratégica global de uma das suas associadas”. E “isso corrobora o que a entidade vem alertando sobre a ociosidade da indústria (local e global) e a falta de medidas que reduzam o custo Brasil”. A associação alerta para o problema de competitividade do setor automotivo há pelo menos dois anos. Em março de 2019 apresentou estudo da consultoria PwC que mostrava a diferença de custo de produzir umcarro no Brasil e noMéxico, comvantagens óbvias para os mexicanos. O termo ‘manicômio tributário’ que ilustra a perversidade do sistema brasileiro surgiu pela primeira vez em conversa do presi- dente Luiz Carlos Moraes com jornalistas. Nos fornecedores a decisão da mon- tadora, apesar de considerada grave, não trouxe grandes preocupações vez que a Ford já vinha convivendo com produção debilitada em termos de volumes nos últimos anos. Entende-se que o vácuo deixado rapidamente poderá ser preen - chido por outra marca, a exemplo que já aconteceu nos caminhões. Terceiro ou quarto maior mercado Outro aspecto deve ser observado com muito cuidado: talvez ainda como reflexo dos problemas com a pandemia, no ano passado o mercado brasileiro de 0 KM foi de pouco mais de 2 milhões de unidades e no mesmo período as vendas de usados ultrapassaramdez milhões. Boa parte desses negócios foi fechado com consumidores que não conseguemmais acesso aos novos. Nunca é demais lembrar que o Brasil é campeão mundial de tributos automoti- vos, commais de 30%. Os demais grandes mercados têm taxas de 15% em média e China, Estados Unidos e Japão, os três maiores mercados mundiais de veículos no ano passado, não chegam a 10%. Questionado no Congresso AutoDa- ta Perspectivas 2021, no último outubro, sobre o comportamento do mercado se tivéssemos política tributária parecida com a do resto do mundo, Rodnei Bernardino de Souza, diretor da área de veículos do Itaú, não teve dúvidas: “Boa parte das ven- das de seminovos migraria para os novos, que seriam algo como sete milhões de unidades por ano. O Brasil seria terceiro ou quarto maior mercado do mundo”. Em 2020 a Ford vendeu somente 119 mil veículos no Brasil, 39%menos que em 2019. Sua produção não ultrapassou uma centena de milhar. Se tivéssemos esta tal política tributária compatível com o res- to do mundo e vendêssemos estas sete milhões de unidades/ano, a decisão teria sido a mesma? Não é difícil imaginar a resposta... “ Tanto os produtos como a forma de produzir e comercializar estão se transformando e serão totalmente diferentes no futuro próximo.” Ricardo Bacellar, sócio-líder da KPMG

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