São Paulo – As projeções de vendas ao mercado doméstico automotivo, de 3,5 milhões de unidades em 2022, estão mantidas. Mesmo diante de desafios adicionais aos já postos, como o incerto cenário macroeconômico composto por dólar, juros e inflação nas alturas, eleições e PIB próximo de zero, e um fator extra, e que pode trazer ainda mais hesitação para este ano: a guerra de Rússia com Ucrânia.
O presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes mencionou, durante a abertura do Seminário Megatendências 2022, realizado de forma online pela AutoData Editora até quarta-feira, 16, que os mercados dos dois países em conflito é estimado em 1,8 milhão de veículos. E que as montadoras já estão ajustando a produção nos, e para os, destinos. Avaliou, no entanto, que por ora o embate no Leste Europeu não altera as projeções para o Brasil.
“Estamos falando de 180 mil unidades a mais com relação a 2021, que tem uma base baixa de comparação. Trata-se de projeção conservadora. O que é possível, considerando que 50% do volume será destinada ao varejo, em que temos o desafio de lidar com os juros ascendentes e risco de aumento de inadimplência, mas que tem demanda, e a outra metade para locadoras, que estão com a frota desatualizada e também com demanda. É possível entregarmos de 500 a 600 mil veículos a mais. Mas, dentro de uma estimativa razoável, manteremos os 2,3 milhões para venda e 2,5 milhões para produção. Não vamos mudar esses números por enquanto.”
Luiz Carlos Moraes
Moraes ponderou que o impacto da redução do IPI, que considerou o primeiro passo da reforma tributária, ao estímulo ao consumo de veículos, acabou sendo ofuscado por causa da guerra. A ideia era que os juros continuassem reduzindo a inflação e tornassem o produto mais acessível e que, com a normalização da onda de afastamentos trazida pela ômicron em janeiro e fevereiro, que resultou em absenteísmo adicional de 6% a 7% em alguns períodos, a produção também voltasse à normalidade, o que ocorreu neste mês.
O presidente da Anfavea destacou também que importantes matérias-primas para a fabricação de semicondutores são originárias da Rússia e da Ucrânia. Ou seja, há um indicativo de novos problemas. Em linha com o dirigente, com quem partilhou o painel, Dan Ioschpe, presidente do Sindipeças, analisou que deve haver retração no volume global de veículos e que é aguardada diminuição do crescimento econômico no Leste Europeu pela metade, o que afeta bastante o segmento de veículos comerciais, que vinha bem no continente:
“Temos alguns itens fabricados nessa região, sistemas e conjuntos, por exemplo, os chicotes, em que a Ucrânia é produtor relevante, especialmente para Europa. Mas há importantes matérias-primas, como titânio, alumínio e neon, chaves para a produção de semicondutores. Haverá, portanto, agravamento da situação da cadeia de suprimentos quando o que esperávamos seria a melhora”.
Dan Ioschpe
Para Ioschpe, portanto, esse é mais um desafio porque a situação traz inflação global, o que eleva os preços de matérias-primas e pressiona os já elevados fretes marítimos e aéreos: “Como consequência os juros ficam mais elevados, a renda, comprometida, e o risco de inadimplência sobe, o que não ajuda a comercialização de bem tão significativo como veículos. Podemos até ter mais chips, mas será preciso ver como a questão do conflito avançará nas próximas semanas e meses”.
Os dirigentes convergem também com relação à necessidade de o Brasil reduzir a dependência de outros países e de melhor estruturar plano estratégico de médio e longo prazos para a indústria de transformação brasileira, a fim de ter participação global e se blindar na medida do possível, diante de conflitos externos.
Dan Ioschpe também enfatizou a necessidade de se estabelecer agenda de inovação, em que haja ambiente favorável para acelerar em pesquisa e desenvolvimento, e da urgência de, internamente, haver incentivo à renovação da frota e à inspeção técnica veicular.
O Sindipeças também manteve sua projeção de crescimento da cadeia de autopeças em 10,8% este ano, aos R$ 181,3 bilhões, o que, espera-se, seja atingido por uma maior atividade industrial e não por efeito de inflação.