Ainda que na esfera da política o cenário permaneça um tanto quanto conturbado e indefinido no mundo da economia alguns parâmetros que começam a se definir parecem indicar que o pior, de fato, pode já ter ficado para trás. O Relatório da Inflação divulgado pelo Banco Central na terça-feira, 28, por exemplo, cravou projeção de 7% na inflação deste ano e, mais importante, de 4,7% em 2017, praticamente já dentro do centro da meta.
É bem verdade que, de um lado, o fato de estes índices serem ligeiramente superiores aos da edição trimestral passada deste relatório – que especificava respectivamente 6,9% e 4,5% – levou os analistas a adiar de agosto para outubro ou novembro o mês do provável início da redução da Selic. De outro lado, todavia, eles indicaram aparente convicção do Banco Central de que a inflação está sob controle e com viés de queda acentuada com relação aos dois dígitos registrados no ano passado, o que abre as portas para a real e concreta viabilidade do processo de redução da Selic se manter por bom tempo ao longo do ano que vem.
Trata-se, sem dúvida, de alento significativo para quem tem de planejar o futuro das empresas de um setor, como o automotivo, cujas vendas têm forte dependência da disponibilidade e do custo do crédito. Alento duplo, por sinal. Afinal, a própria redução da inflação, em si, já tende a abrir mais espaço dentro do orçamento doméstico para prestações resultantes da compra financiada de bens de consumo de forma geral.
Neste primeiro semestre, tomado em separado, a insegurança dos consumidores diante da manutenção futura do emprego também contribuiu de forma marcante para a dificuldade das vendas. E em particular a dos automóveis, um bem cujo valor implica financiamentos que, na média, flutuam de 24 a 36 meses.
Foi o resultado natural e prático das 3,4 milhões de demissões anotadas nos doze meses anteriores a maio, o dado mais divulgado pelo IBGE, e que elevaram o total de desempregados para 11,9 milhões de pessoas.
Neste mesmo maio, todavia, a taxa de desemprego, que vinha crescendo mês a mês de forma acentuada, permaneceu nos 11,2% que haviam sido registrados em abril. Não melhorou – o que provavelmente somente deverá acontecer mais para o fim do ano. Mas, ao menos, parou de piorar, o que já representa outro alento na medida em que pode contribuir para um começo de redução deste clima generalizado de insegurança.
Ao menos aparentemente, depois do susto nos primeiros meses do ano, as empresas e seus trabalhadores passam, agora, a encontrar formas de se acomodar à nova situação sem recorrer tanto a demissões em massa. Dentro do próprio setor automotivo Ford e Chery são bons e bem recentes exemplos deste tipo de ação.
Outro alento importante vem do mercado externo: de janeiro a maio as vendas domésticas de veículos na Argentina, ainda o principal mercado no exterior dos produtos fabricados no Brasil, somaram 283 mil unidades, nada menos que 28,9% acima do registrado no mesmo período do ano anterior.
Na semana passada, além disso, Brasil e Argentina renovaram por mais quatro anos acordo automotivo que se encerraria em 30 de junho. E com regras definidas já para todo o período.
Há anos que este acordo vinha sendo renovado a conta gotas, sempre com validade máxima de doze meses, período demasiadamente curto para um setor cujos investimentos necessitam, em geral, de quatro a cinco anos para se efetivar.
Volta a se abrir, assim, a concreta possiblidade de uma volta ao inicio do Mercosul quando as montadoras e fabricantes de componentes repartiam a produção pelos dois países com foco específico nos ganhos de escala. Época em que raramente fabricavam o mesmo veículo nos dois países. Mais um bom parâmetro definido.
Aos poucos as empresas também parecem começar a reencontrar relativo equilíbrio dentro da nova e desagradável situação do mercado. Dados divulgados em meados de junho pelo Sindipeças indicam que, no primeiro quadrimestre, para uma queda 26,09% na produção, o faturamento líquido nominal consolidado registrou redução de 9,9%.
E em abril, em particular, em confronto com o mesmo mês do ano passado, para uma redução de 17,55% na produção a queda do faturamento ficou em módicos 3,32%.
Parece haver no ar, na verdade, uma certa mudança do clima de negócios em geral: pesquisa que acaba de ser divulgada pela FGV constatou, em junho, retomada disseminada da confiança por empresários dos vários setores da economia. Em particular no comércio e nos serviços. É bem verdade que antes de julgamento definitivo do impeachment da presidente afastada, em meados de agosto, qualquer projeção com relação ao futuro traz a bordo boa dose de risco de erro.
Parecem, porém, ser cada vez mais consistentes os indícios de que o brilho que começa a ser visto no fim do túnel é, agora, de fato, uma luz e não uma locomotiva vindo em sentido contrário, tal como aconteceu no início no ano.