Houve uma época em nosso País que o profissional mais importante na área financeira de uma empresa era aquele que reunia conhecimentos para lidar com o ambiente de alta inflação, tirando proveito das vantajosas taxas de juros nas operações Overnight: o tesoureiro. Muitos, eu tenho certeza, se lembram dessa situação.
Por outro lado, a economia fechada a produtos importados permitia certa situação de conforto para que as companhias reajustassem os preços de venda repassando para o mercado tanto a elevação dos custos como também as ineficiências de gestão. A própria inflação, sempre nos dois dígitos, mascarava os resultados e o foco em produtividade era praticamente inexistente. Havia iniciativa do governo para controle dos preços, mas mesmo assim não era tão difícil ganhar dinheiro naqueles tempos.
O ambiente de negócios tem mudado desde o início dos anos 90. A abertura comercial por meio da redução significativa dos impostos sobre a importação, a diminuição da inflação interna, a elevação da carga tributária para equilibrar as contas públicas, o fortalecimento dos sindicatos e sua busca por reajustes de salário acima da inflação, o avanço da produção manufatureira na Ásia a custos extremamente baixos e a concorrência mais acirrada em todos os segmentos, inclusive no setor automotivo, provocou nas últimas décadas grande atenção no controle financeiro dos negócios. Claro está que também no chão de fábrica têm acontecido mudanças significativas permitindo algum ganho de produtividade, mas não na extensão necessária para manter a indústria competitiva.
O jeito é fazer mais com menos, trabalhando com organizações enxutas e mitigar a dependência na tomada de recursos junto a bancos por meio da boa gestão do caixa. Qualquer descuido ou lentidão em tomar atitudes para corrigir o rumo dos negócios pode ser fatal, levando a empresa à bancarrota.
Agora vivemos no Brasil uma situação dificílima pela queda acentuada da demanda e entramos em quadro de recessão econômica cujo término parece distante. Se já tínhamos de fazer a gestão com todos aqueles desafios, agora se soma a queda do ritmo de negócios por trimestres a fio.
A Serasa Experian registrou aumento da inadimplência das pessoas jurídicas de 4,3% no período acumulado de janeiro a julho na comparação como o ano passado. E os protestos de títulos, na mesma série comparativa, cresceram 15%. As falências somaram 1 mil 156 até agosto desse ano, ante 1 mil 82 há um ano. Foram decretadas 586 falências nos primeiros meses de 2015, e ainda segundo a Serasa, 766 recuperações judiciais foram requeridas este ano, sendo que no mesmo período de 2014 foram 541.
No setor automotivo os dados de produção interna em todos os segmentos, sem exceção, registram queda consistente nos volumes produzidos em séries anualizadas desde dezembro de 2013. A queda mais acentuada foi nos caminhões e ônibus, de 48% nos doze meses acumulados até agosto. O setor de máquinas agrícolas ficou negativo em 34,5% para o mesmo período. A queda menos expressiva se deu em automóveis, com variação desfavorável de 23%.
Não resta dúvida, portanto, que a situação é muito complicada, asfixiando as empresas do setor de maneira generalizada e com certeza mais gravemente aquelas que já estavam fragilizadas, ou por dificuldades na gestão dos recursos financeiros e dos negócios em geral ou mesmo por inabilidade.
É preciso manter as finanças equilibradas, sempre!
O equilíbrio na gestão financeira exige de um lado muito rigor por parte do corpo diretivo, com ações concretas e sérias no dia-a-dia, e de outro a adoção de práticas inteligentes para financiar os negócios tanto nas necessidades de curto prazo, de capital de giro, como para executar a estratégia de longo prazo.
A correta gestão do capital de giro – contas a receber, estoques, contas a pagar – pode mitigar consideravelmente a necessidade de tomada de recursos junto a bancos, enquanto os investimentos em itens do ativo fixo exigem análise profunda sobre o retorno esperado com a iniciativa versus o custo de capital. Aí sim a empresa deve definir qual a fonte de recurso mais apropriada, menos custosa e de menor risco para amortização.
Especificamente em relação a recursos para financiamento de projetos de longo prazo é bom levar em conta o BNDES. Está certo que na atual conjuntura suas linhas de crédito estão mais restritas e as taxas de juros foram reajustadas, mas ainda assim é uma boa alternativa.
Cabe aqui lembrar também que a distribuição de resultados – seja na forma de dividendos ou juros sobre capital próprio, ou mesmo de remuneração dos donos do negócio – deve ser estrategicamente pensada na gestão dos recursos financeiros. Em algumas situações é preferível não fazer a distribuição ou retirada.
No planejamento tributário é recomendável dedicar muita vigilância à possibilidade, de maneira responsável, da empresa fazer valer seus direitos, seguindo a legislação. Há casos em que é possível reivindicar de modo estruturado o crédito de impostos ou a eliminação de sua incidência sobre as transações.
Pode ser ainda uma alternativa interessante no planejamento tributário observar regiões geográficas que estimulam, via benefício fiscal, a instalação de empreendimentos. Isso não é novidade no setor automotivo, mas nunca é demais lembrar que a contribuição ao caixa pode ser significativa, ajudando a manter o tão desejado equilíbrio.