De janeiro a novembro deste ano, 1,4 milhão de veículos foram afetados por defeitos do sistema de airbag e chamados para recall no Brasil. O volume é 43% maior do que a incidência verificada no mesmo período de 2015. Segundo dados do Procon, Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor, 24 montadoras foram obrigadas a convocar proprietários de veículos em 2016, mas apenas 19% dos donos de carros com problemas compareceram para realizar os reparos, o número mais baixo dos últimos vinte anos.
Segundo o engenheiro mecânico Hélio Cardoso da Fonseca, autor do livro Recall Em Veículos Automotores – o que há por trás disso? e ex-diretor do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de São Paulo, os altos volumes ainda são resultados dos defeitos nos airbags fornecidos pela empresa japonesa Takata. “Essa situação ainda deve se arrastar por pelo menos mais dois anos. Os problemas foram muito graves e a baixa adesão dos consumidores é motivo de preocupação.”
Segundo o engenheiro, a média histórica de adesão dos motoristas sempre permeou a faixa dos 40% a 50%. “Esta é a primeira vez que o índice está tão baixo. Uma das explicações é a banalização dos recalls e a dificuldade de encontrar concessionárias”, acredita. De acordo com Fonseca, a queda nas vendas de veículos também provocou o fechamento de centenas de revendas no País, o que dificultou ainda mais o agendamento dos serviços.
A falta de um controle rigoroso dos reparos e a comunicação mais efetiva dos defeitos são preocupantes. “Em países como os Estados Unidos e os da Europa, os consumidores recebem cartas registradas informando a necessidade de recall e, a partir daí, passam a ser responsáveis pelos reparos, sendo até mesmo responsabilizados legalmente em caso de algum acidente decorrente do defeito”, diz Fonseca. “No Brasil, as comunicações são superficiais e nenhum órgão específico controla os reparos.”
Mas além do defeito nas bolsas de ar, que recentemente motivaram chamados de montadoras como FCA e Toyota, os problemas encontrados depois que os veículos deixam as fábricas também afetam outras áreas. Afinal, cada carro recebe cerca de 5 mil componentes em sua montagem – de dezenas de fornecedores. “Na sequência do airbag, os maiores problemas estão nos sistemas de freios e na configuração de módulos”, afirma o engenheiro.
Uma das prováveis explicações para o aumento do volume de recalls para automóveis fabricados no Brasil é a constante necessidade de redução de custos das montadoras. “Com processos cada vez mais rápidos e econômicos, as fabricantes acabam fazendo os testes dos produtos quando os carros já estão nas ruas,” revela Fonseca. “Não há mais um laboratório de pente fino em possíveis defeitos antes dos lançamentos.”
Segundo ele, a crise econômica que afeta o país contribui para deixar a situação ainda mais alarmante. “Houve redução do número de funcionários nas montadoras, acúmulo de funções, menos treinamentos e desmotivação dos trabalhadores”, avalia. “É uma situação que pode se tornar irreversível sem um controle adequado.”