Está ocorrendo agora uma grande transformação na engenharia de produto da indústria automotiva, levando à crença de que em dez ou quinze anos os meios utilizados para a mobilidade das pessoas, notadamente os veículos de uso individual e coletivo, trarão um conteúdo extremamente avançado quanto a alguns pontos fundamentais, como segurança; economia energética, emissões e conforto e dirigibilidade.
Segundo dados publicados pela Strategy&, empresa que sucedeu à Booz Co., as empresas globais mais inovadoras têm investido em pesquisa e desenvolvimento, R&D em inglês, aproximadamente US$ 650 bilhões, 40% dos quais nos Estados Unidos. Em segundo lugar vem a Europa, com quase US$ 194 bilhões, ou 30%, e depois segue o Japão, com investimentos de US$117 bilhões. A China está avançando em P&D e no ano passado publicações indicam US$ 30 bilhões investidos ali.
A análise segmentada desse volume imenso de recurso financeiro na área de P&D mostra em primeiro lugar as áreas ligadas à computação e eletrônicos, com 28%, seguidas de “cuidados com a saúde”, 22%. A indústria automotiva é o terceiro maior segmento em investimentos em P&D, com 16% do total ou pouco mais de US$ 100 bilhões em 2014.
É importante destacar que a empresa global que mais investe em P&D, segundo a Strategy&, é a Volkswagen, com US$ 13,5 bilhões, superando Google, Microsoft, GE, Apple. Sim, o primeiro lugar em investimentos de P&D pertence a uma empresa do setor automotivo.
Na indústria automotiva as empresas que seguem a VW são Toyota, com US$ 9,1 bilhões investidos em P&D, General Motors, com US$ 7,4 bilhões, Ford, US$ 6,9 bilhões, e Daimler, que completa a lista das cinco primeiras do setor, com US$ 5,7 bilhões. A Honda vem em sexto lugar, US$ 5 bilhões.
Os investimentos em inovação da indústria automotiva global decorrem de iniciativas ligadas à estratégia de crescimento e de diferenciação de produto, mas também visam a atender a leis e regulações impostas ao mercado quanto à economia de combustível, diminuição do nível de emissões e segurança. Muitos de nós sabemos que esses fatos externos à indústria exercem grande influência. Para tanto é só lembrarmos o advogado estadunidense Ralph Nader, que ao fim dos anos 1960 e início da década de 1970 defendeu com vigor a proteção de segurança aos usuários de veículos: a partir dali a instalação de air bags nos veículos em território daquele país tornou-se usual.
Outro fato relevante que empurra a indústria para a inovação tem relação com a internet das coisas, ou internet of things – jargão criado para associar a influência de aplicativos desenvolvidos em comunicação e a exploração de banco de dados que têm transformado dramaticamente a sociedade mundial. De fato as novas gerações são constituídas de consumidores diferentes e criados em ambientes digitais que ficam ao alcance das mãos, ou às vezes, até sem elas.
Um ponto importante a ser mencionado é ligado também à geração atual, que em grande parte defende ardorosamente temas ligados a meio ambiente e à responsabilidade social. Empresa que se preza não pode ignorar esse público e suas demandas.
A indústria automotiva tem, então, de dirigir recursos em novos produtos para não só atender às exigências legais como, também, para oferecer produtos inovadores que atendam às expectativas e exigências de um novo tipo de consumidor. É, ou será, uma questão de sobrevivência.
Quando avaliamos as iniciativas da indústria em P&D, até então divulgadas, podemos listar:
Algumas dessas iniciativas estão mais avançadas, outras nem tanto, mas elas virão. Só resta saber como e quando toda essa inovação será economicamente viável, pois o grande desafio é como prover a tecnologia sem encarecer o produto final. A escala, ou o tamanho dos negócios, é que, afinal de contas, tornará viável a oferta definitiva de muitas dessas ideias hoje em teste ou estudo.
O que essa onda inovadora provocará na cadeia de fornecimento às montadoras? Esse é um ponto relevante, sem dúvida. Muitos dos fabricantes de autopeças serão chamados a prover as soluções e a desenvolver processos de manufatura para entregar as encomendas de produtos mais nobres e com muito mais tecnologia sem modificar substancialmente o custo final da solução. Bom desafio e boa oportunidade para fazer negócios. De fato os grandes sistemistas globais terão de orientar esforços para materializar as inovações em escala comercial.
Quando toda essa inovação chegará ao Brasil? É difícil prever, mas com a atual engenharia integrada das montadoras e a padronização global do desenho e especificação dos veículos, o tempo para a transferência de soluções tecnológicas do país-sede para outras regiões está mais reduzido. O desafio aqui é saber como se dará o fornecimento por parte do sistemista: será com produção local?, há escala que faça as fábricas locais competitivas?, haverá abertura comercial para trazer de fora essas soluções?
Todas essas são boas questões, mas trazem certo grau de incerteza quanto ao futuro da indústria brasileira. Porém não podem e não devem ser negligenciadas jamais no planejamento estratégico das empresas.
José Rubens Vicari é administrador de empresas pela FGV com pós-graduação em finanças. Atuou por vinte anos como CEO de empresas metalúrgicas no setor de autopeças. Mentor voluntário para empresas startups pela Endeavour. Seu blog é www.senhorgestao.com.br.
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