AutoData - Separando os vencedores dos vencidos
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15/05/2015

Separando os vencedores dos vencidos

Há um ponto na pronunciada queda das vendas domésticas de veículos neste início de ano que merece atenção especial e um bom punhado de reflexões.

Todos no setor automotivo projetavam um ano difícil, eventualmente até com alguma redução nas vendas e na produção ao longo do primeiro trimestre. Com reflexos diretos e previsíveis no resultado do semestre, que provavelmente fecharia com números negativos. As dificuldades e a queda já eram, portanto, esperadas. E estavam devidamente projetadas nas estratégias e nos resultados a serem alcançados pelas empresas neste ano.

O que ninguém esperava, e que a todos colheu de surpresa, é a dimensão que a redução alcançou: queda de dois dígitos! E na faixa dos trinta pontos porcentuais nos caminhões!

Desta vez todos erraram a projeção: montadoras, fabricantes de autopeças, distribuidores, analistas e empresas de consultoria. E é exatamente este caráter coletivo do erro que merece reflexão mais profunda: teriam perdido, do dia para a noite, todos os altos executivos do setor automotivo, a capacidade de enxergar a realidade e projetar minimamente o futuro? Certamente que não.

Acontece que quando se examina com mais profundidade as mudanças no quadro macroeconômico nacional do final do ano passado ao primeiro trimestre deste ano não se encontra nada, absolutamente nada, que pudesse justificar tão pronunciada retração nas vendas de veículos. Tudo bem que o real se desvalorizou em relação ao dólar, que a energia elétrica teve forte reajuste nos preços, que tudo isto fez com que a inflação ultrapassasse o teto da meta, o que forçou a elevação das taxas de juros. E é igualmente certo que o inicio do processo de ajuste fiscal provocou desaquecimento da demanda de forma geral, em particular a automotiva.

Mas não era exatamente este o quadro com o qual todos dentro do setor já estavam trabalhando? Pode ter ocorrido até algum erro de calibragem, um ou dois pontos percentuais aqui ou ali. Mas, por certo, ao menos em termos de macroeconomia, nada se mostrou tão diferente e negativo em relação ao que estava projetado a ponto de justificar tamanha baixa.

Os chamados fundamentos econômicos permanecem relativamente dentro daquilo que se projetava – o que no mínimo representa bom indicador de que, desta vez, a questão a ser enfrentada não é, felizmente, estrutural mas, sim, conjuntural. Ou seja: o mercado potencial, a rigor, permanece inalterado. Mas o rápido e marcante crescimento da insegurança dos consumidores em relação ao futuro de curto prazo derrubou as vendas com a mesma rapidez e intensidade.

Sem a certeza de que teriam carga para transportar ou emprego garantido até o final do prazo do financiamento os consumidores, sejam de caminhões ou automóveis, trataram de adiar a compra. O mercado parou, os estoques subiram e vieram as demissões, que aumentaram ainda mais a insegurança.

No caso dos caminhões a queda bem mais acentuada provavelmente decorreu da soma deste atual processo de adiamento com as antecipações de compras realizadas no ano passado, em função da grande possibilidade de que qualquer processo de ajuste fiscal desembocasse em mudanças na política de crédito e de juros negativos do Finame PSI – o que, de fato, aconteceu.

Primeira reflexão: se a questão não é estrutural mas basicamente conjuntural, retirado ou ao menos suavizado o fator conjuntural que mais atazana as vendas – no caso a insegurança dos consumidores em relação ao futuro –, o mercado deverá buscar um novo patamar. E isto poderá começar a acontecer a qualquer momento, à luz do eventual feliz encadeamento de duas ou três boas notícias – Luiz Moan, presidente da Anfavea, projeta melhora no quadro geral já na segunda metade deste ano.

Outra reflexão tão ou mais importante: parece provável que o mercado brasileiro de veículos, leves e pesados, talvez não seja tão grande quanto as vendas registradas nos últimos anos pareciam indicar. Mas também é absolutamente certo que ele não é tão pequeno quando o verificado no primeiro trimestre deste ano.

Reflexão final: este é uma daqueles momentos na vida do setor automotivo que separa os fortes dos fracos, os vencedores dos vencidos.

Em algum momento o novo patamar, que certamente é mais elevado do que atual, dará o ar graça. E quando isto acontecer quem tiver o cuidado, neste momento, de manter sua estrutura operacional, estará preparado para atender a demanda e irá aproveitá-la. Mas quem não estiver…


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