A Kia Motors está vivendo uma fase dicotômica no México. Ao mesmo tempo em que celebra a conclusão total das obras de sua nova fábrica naquele país, no município de Pesquería, no Estado de Nuevo León, investimento de US$ 1 bilhão concluído em pouco mais de um ano – a pedra fundamental foi assentada em outubro de 2014 –, a montadora se vê envolvida em um caso delicado com o governo estadual.
O novo governador do Estado, Jaime Rodriguez Calderón, conhecido pelo apelido de El Bronco, eleito como candidato independente em julho, tomou posse há cerca de um mê e já entrou em sério conflito com a montadora, afirmando que promoverá uma profunda auditoria nos contratos firmados pela administração anterior para a construção da fábrica.
Em uma atitude no mínimo surpreendente, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico estadual publicou em sua página do Facebook todos os documentos relativos ao acordo, ainda que estes estivessem protegidos por cláusulas de confidencialidade – veja em https://www.facebook.com/SedecNL/photos/a.1465876777061442.1073741828.1465493053766481/1521936058122180/?type=3&theater.
No post o órgão estimula o compartilhamento da publicação e afirma que “o governo de Nuevo León mostrará a todo o México que se pode acabar com a falta de transparência, que é o manto protetor da corrupção”. Até o fim da tarde da segunda-feira, 23, foram quase dois mil compartilhamentos registrados.
Segundo os documentos, assinados pelo VP da Kia, pelo então governador e pelo prefeito do município, o governo estadual seria responsável pela construção de um tanque para armazenamento de 1 milhão de litros d´água, de uma estação do corpo de bombeiros com especialização em manejo de materiais perigosos e tempo máximo de resposta de dois minutos e ainda de um centro de treinamento e capacitação, além de isentar a unidade de diversos impostos por 20 anos.
A construção da nova fábrica, de acordo com órgãos de imprensa locais, estaria ainda envolvida em um caso de obtenção indevida de lucro: segundo denúncias até o momento não comprovadas, dois colegas do ex-governador teriam aberto uma imobiliária para aquisição de um terreno de 1,2 milhão de m2 em Pesquería, comprado 15 meses depois pelo governo estadual como parte da área repassada à Kia Motors para a construção da fábrica – a venda saiu por mais que o triplo do valor de aquisição, o que motivou a apuração do caso.
Por sua parte a montadora cobra do governo o cumprimento dos acordos firmados, alegando que estes possibilitaram a realização do investimento não só por parte da própria Kia mas também de seus fornecedores. Somados, os aportes chegam a quase US$ 3 bilhões.
A nova unidade terá capacidade para 300 mil unidades/ano e responderá por cerca de 10% de toda produção global da Kia Motors. O início da produção em série ali está programado para o primeiro trimestre do ano que vem. A montadora afirma que a unidade deverá gerar ao todo 70 mil empregos diretos e indiretos “em longo prazo”.
O caso lembra um similar ocorrido no Brasil no fim dos anos 90, quando governo recém-empossado do Rio Grande do Sul questionou incentivos concedidos pela administração anterior à Ford para construção de uma fábrica em Guaíba. A diferença era que ali as obras ainda não haviam começado e a consequência foi a transferência da unidade para Camaçari, na Bahia, inaugurada em 2001.
Por coincidência o terreno na Bahia era originalmente destinado à Asia Motors, que chegou a realizar ali cerimônia de assentamento de pedra fundamental com a presença do então Presidente da República, mas nunca construiu a fábrica. O caso foi parar na Receita Federal, vez que a montadora obteve vantagens fiscais para importar veículos como Towner e Topic por ser investidora. A fabricante conseguiu provar na justiça que a responsabilidade do caso coube aos seus então sócios locais, mas a pendência fiscal impede a construção de uma fábrica da Kia no Brasil até hoje – o que também acabou por facilitar a escolha pelo México quando a matriz sul-coreana do Grupo Hyundai decidiu que precisava de uma unidade produtiva na América Latina.
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