Ele foi presidente da General Motors do Brasil por cinco anos e o criador do Projeto Blue Macaw, a fábrica de Gravataí
Só o traía o sotaque. De resto foi o mais brasileiro dos presidentes da General Motors aqui, fazendo lembrar JJ Sánchez, que torcia para o Corinthians mas que não tocava tamborim em desfile da Portela. Mark não tinha a vergonha de parecer um sujeito comum, não tinha a vergonha de conversar ou de perder tempo com pessoas comuns. O chão de fábrica gostava dele. Os concessionários Chevrolet no Brasil também. Morreu de infarto em sua Chicago natal na manhã do domingo, 16.
Ficamos todos nós admirados com o rapaz – tinha 41 anos na época – que chegava para suceder a Rick Wagoner, seu colega de universidade no curso de administração e depois, em Harvard: de cabelos já embranquecendo e um teimoso bigode negro como a asa da graúna. Mas fomos percebendo que a alcunha Gringo não cabia para ele. Misturava espanhol ao português, falava o inglês mais elementar mas não perdia os ouvintes. E geralmente tinha respostas para todas as perguntas.
Ele chegou ao Brasil em 1992, ano da fundação de AutoData, da qual foi amigo próximo. Deixava a posição de diretor executivo de planejamento de operações na América do Norte. Desde 1973 na GM Mark já havia feito, anos antes, o mais importante contato profissional de sua vida como interface da Toyota em negócio comum que estabeleceram em Fremont, CA, a NUMMI.
No mundo dos negócios, e mesmo internamente, na companhia, as pessoas se surpreendiam com seu rápido domínio da língua portuguesa, pela clareza com que analisava a indústria de veículos, aqui e fora, por meio de visão abrangente e histórica de tantos fatos econômicos que nos cercavam. E se surpreendiam, também, com a rapidez de suas tomadas de decisão.
Como presidente ele reforçou a liderança nativa de André Beer sem perder sua própria autoridade. Como líder da companhia levou o staff da área de relações públicas a percorrer longo período de grandes realizações que provavelmente jamais terá um revival. Visitou os concessionários desde o seu primeiro dia e arquitetou amizade com o presidente da Abrac, o mítico Mauri Missaglia, que perdurou até o fim dos dias. E tratou de se relacionar com a infraestrutura de fornecimento reconhecendo os profissionais.
Um amigo que fez aqui, o jornalista Paulo Brandão, de Salvador, BA, relatou que, “calmo, sorridente, Mark adorava uma boa esculhambação”, que traduzo pelo sentimento de gostar da vida – e tantas vezes vivemos, com ele, juntos, celebrações à vida e à amizade.
Junto com estes públicos Mark Hogan lançou Omega, Vectra, Corsa, S10, Astra, Blazer e Silverado. E construiu as bases para a fábrica gaúcha com a ajuda próxima de Luiz Moan, afinal estabelecida em Gravataí depois de disputa braba com Guaíba. Nascia ali mais um conceito até hoje avançadíssimo, batizado como condomínio industrial, que atenderia a premissas como baixo custo de processamento na manufatura para veículos em tese baratos e de fácil e, também, barata manutenção. Veículos para consumidores felizes em países, digamos, pouco ricos. Deste projeto Blue Macaw o astro seria o Celta.
Mark já não estava aqui à época da inauguração da fábrica. Cuidava da divisão de carros pequenos da América do Norte a bordo da experiência adquirida. Não foi um sucesso esta empreitada, pois aquele público não conhecia mais carros pequenos e a liderança sindical não se dispôs a aderir ao projeto de participação que propôs. Também enfrentou o problema de ser amigo do cara que fazia chover e que fazia parar a chuva, Rick.
Jantamos com Sally, a companheira de toda a vida, em Troy em alguma noite de março de 1999. Mark estava agitado e só sossegou depois de perguntar como eu consideraria sua transferência para a Toyota como seu presidente no Brasil. Sally discretamente apoiava. O patriarca Akio Toyoda também. Ponderamos que seria, sim, quase que a construção de um processo inteiro, de resultados a serem acumulados ao longo do tempo. Numa comparação razoavelmente lícita lembramos que não seria, ao menos no começo, período coroado de louros. Poderia ser o início de uma nova carreira.
Mas ainda não seria a sua hora com Toyota. Em 2004 ele deixou a então ainda poderosa General Motors Corporation em direção à canadense Magna, que já mantinha divisão especial, na Áustria, para a produção de carros premium sob encomenda. Teve Herbert Demel e Volker Barth como companheiros de jornada.
Houve um período em que sua Dewey Investments deteve a patente daqueles carros típicos, quadradões, utilizados como táxis padrão em Londres, Inglaterra, visando à sua transformação em veículos aptos para o público PCD.
No início da década de 2010 aproximou-se novamente da Toyota. Integrou durante anos seu conselho consultivo e foi consultor especial para o Brasil como hóspede especial de Luiz Carlos Andrade.