São Paulo – Muitos jovens que até pouco tempo atrás não consideravam a possibilidade de comprar um carro por optarem por outras formas de mobilidade, a exemplo de veículos por aplicativo e transporte público, ao que tudo indica começaram a rever suas prioridades com a pandemia. Sete em cada dez pessoas de 18 a 24 anos desejam ter um carro, sendo que para seis deles o foco está em um usado.
É o que aponta levantamento realizado este mês pela Webmotors, cedido com exclusividade para a Agência AutoData. O estudo considerou a opinião de 1,2 mil jovens nessa faixa etária, de todo o Brasil, que possuem a intenção de comprar ou trocar de veículo.
Chama atenção o fato de que, para 90%, modelo 0 KM não é uma opção. A escolha pelo seminovo ou usado se deve à disparada de preços, motivada pela adequação dos veículos novos às normas de segurança, atualização de motorização para reduzir a emissão de CO2 e tecnologias de conectividade – além de, é claro, a inflação nas alturas. No acumulado dos doze meses encerrados em março o IPCA avançou 11,3%, o maior índice para esse intervalo de tempo desde outubro de 2003.
Diante das dificuldades econômicas e do menor poder aquisitivo inerente a essa faixa etária o seu carro dos sonhos é o veículo acessível, disse Cris Rother, diretora de marketing da Webmotors. Sustentabilidade e alta tecnologia não são atributos que fazem brilhar os olhos dos jovens. Nem o valor do seguro. Para 60% o fator primordial é o preço, o que não significa abrir mão de conforto, requisito a ser levado em conta na decisão de compra para metade dos entrevistados.
“Normalmente, os jovens buscam alternativas mais econômicas na compra do seu primeiro veículo e modelos de entrada, ou seja, mais acessíveis e com menos itens de conectividade, por exemplo. Vejo que essa procura maior por veículos usados é algo natural do cenário atual, em que os veículos novos estão muito valorizados, e também devido ao poder de compra do jovem, que costuma ser menor, e que por isso procura por alternativas mais baratas.”
Cris Rother
Baixo consumo de combustível aliado a um bom desempenho é outro ponto importante, citado por 47%. Vale lembrar que o preço da gasolina, de acordo com o IPCA, avançou 6,95% em março e cresceu 27,4% nos doze meses encerrados no mês passado.
Durante o cenário pandêmico, mesmo com a valorização dos veículos e do custo de manutenção, a executiva disse ter observado procura maior seja por comodidade e segurança, para se proteger do vírus, seja para utilizar o veículo para trabalhar, para aplicativos de mobilidade urbana ou entregas, por exemplo.
Desmotorizados — A maioria dos entrevistados, 60%, não possui carro. Desses, 82% se deslocam por aplicativo, 39%, ônibus, 31%, e metrô, 12%. Neste grupo de jovens sete em dez planejam adquirir o bem ainda este ano, 15% em 2023 e os outros 14% em dois ou três anos.
A alternativa comum encontrada para pagar pelo veículo, entretanto, deverá ser o empréstimo bancário, seja para pagamento com entrada e parcelamento do valor restante, 66%, financiamento integral do valor, 27%, leasing, empréstimo pessoal ou consórcio, 7%.
Dentre aqueles que possuem veículo e desejam trocá-lo, parcela equivalente a 40% dos entrevistados, o financiamento também é alternativa escolhida, ainda que 39% afirmem que utilizarão seu modelo atual como entrada e outros 33% deverão pagar uma parte do valor à vista. Mesmo assim 18% recorrerão a empréstimo para quitar o valor total. E 12% farão leasing, empréstimo pessoal ou consórcio.
Os jovens declararam que juros mais baixos, visando o valor da parcela menor do que o oferecido atualmente, contribuiria para bater o martelo na decisão pela compra.
Contexto não ajuda – Diante da inflação elevada, no entanto, os juros estão em escalada. E embora a Selic esteja em 11,7% ao ano a taxa média para o financiamento de veículos estava em 27% ao ano em janeiro, lembrou o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, ao classificá-la como “altíssima” e mencionar que ainda não há dados mais atualizados devido à greve dos servidores do Banco Central:
“Temos grande preocupação com inflação e taxa de juros. A pandemia trouxe impacto relevante na economia, com valorização das commodities e desorganização da cadeia, e essas sequelas acabaram impulsionando os preços em diversos países, a exemplo do Brasil, México, África do Sul, Estados Unidos e Alemanha, em que houve disparada da inflação”.
Moraes assinalou que a grande diferença está na calibragem, na forma como cada Banco Central está resolvendo o problema:
“Aqui a dosagem foi maior nos juros, tanto que nossa taxa de juros real também é alta, de 7,1%. Mas, para efeito de comparação, guardadas as particularidades de cada economia, e considerando que no Brasil temos 12 milhões de desempregados enquanto que nos Estados Unidos há pleno emprego, a taxa de juros real naquele país é de -4,3% e a taxa de juros ao consumidor é de 5,5% ao ano”.
Luiz Carlos Moraes
Em outras palavras: a taxa de juros ao consumidor é quase seis vezes maior no Brasil. Para Cris Roth “é evidente que a taxa de juros tem impacto na decisão de compra, porém quem precisa do veículo buscará alternativas para adquiri-lo, seja comprando um veículo usado de menor valor ou mesmo buscando um financiamento com taxas mais atrativas”.