São Paulo – Mesmo em um contexto econômico pouco favorável à obtenção de crédito, ferramenta que sempre foi essencial para realizar a troca de um veículo por outro mais novo, ainda que não 0 KM, o brasileiro acredita na manutenção do sonho de ter um carro para chamar de seu e do desejo de que ele seja cada vez melhor e mais novo.
É o que aponta a pesquisa inédita A Relação do Brasileiro com o Automóvel 2023, realizada pela Serasa em parceria com o Instituto Opinion Box, que entrevistou de forma online 2 mil 67 pessoas em todo o País, no fim do ano passado, a fim de avaliar os impactos dos veículos em seu bolso, decifrar tendências de mercado e as relações comportamentais que envolvem seu uso.
Para o diretor de marketing da Serasa, Matheus Moura, o crédito no Brasil tem importância até maior do que em outros países, pois é por meio dele que o consumidor consegue conquistar bens, a exemplo do carro:
“A relação do brasileiro com o crédito é muito forte, e vem desde os anos 1990. A convicção de que amanhã será melhor do que hoje sustenta esse desejo. Eu quero comprar um bem, hoje não tenho dinheiro, mas acredito que amanhã terei. E vou atrás disso para honrar com o pagamento”.
Segundo o levantamento 59% dos entrevistados acreditam que o automóvel é um patrimônio da família e 58% entendem que vale a pena ter carro hoje em dia, mesmo depois do ápice da pandemia, em que algumas pessoas repensaram essa necessidade diante do confinamento e do home office. Mas, vencido o período mais crítico, e depois de avaliarem como mais seguro e cômodo ter um veículo para se deslocar ao trabalho ou escola, realizar compras e tarefas do dia a dia e passeios de fim de semana, voltou a contar a favor, ainda que custos de manutenção pesem contra.
Tendência dos proprietários para este ano – Metade dos entrevistados que já possuem carro afirmou que pretende vendê-lo ao longo de 2023, sendo que oito a cada dez querem fazê-lo para tornar viável a troca do veículo. Destes 65% têm como objetivo conquistar um automóvel melhor e/ou mais novo.
O COO e co-fundador do Opinion Box, Felipe Schepers, analisou que esses dados mostram cenário de otimismo, seja com a economia ou com a própria vida do consumidor: “Há a expectativa de que se conseguirá crédito, que as contas fecharão, de que será feito um bom negócio e de que tudo fará sentido”.
O restante, na outra ponta, busca sanar questões financeiras com a venda. Para 11% ela se dará para reduzir custos, 10% usarão os recursos para investir – e poderão, por exemplo, optar por modalidades de locação, como o carro por assinatura –, 9% precisam do dinheiro para cumprir com outro objetivo e, para outros 9%, os custos de abastecimento estão muito altos.
Mesmo em cenário de dificuldades maneiras alternativas de mobilidade não são muito consideradas pela população, uma vez que 38% já cogitaram usar apenas aplicativos de transporte para se locomover, mas 20% avaliaram que é difícil comparar os custos com a posse do veículo. Pelo mesmo motivo para 23% o aluguel de carro foi cogitado, mas igualmente declinado. O mesmo que para 22% que pensaram optar por uma motocicleta.
Chama a atenção o fato de que 63% dos lares brasileiros têm nos desembolsos com automóvel a segunda maior despesa anual do orçamento doméstico. Em primeiro lugar vêm os gastos com alimentação e, em terceiro, gastos com as contas básicas.
Na avaliação de Schepers, no entanto, essa opção é mais consciente do que se fosse analisada a compra do primeiro carro, em que não se tem conhecimento dos gastos com manutenção: “As pessoas têm carro e querem continuar detendo sua posse”.
Com relação aos motivos que levam à aquisição para 64% do total é a necessidade de ter mais conforto no deslocamento, para 55% é a necessidade de deslocamento eficiente, e para 42% é economizar tempo nos deslocamentos.
Perfil da frota brasileira – Hoje, segundo a pesquisa, seis em cada dez automóveis comprados no Brasil são seminovos. Para Callebe Mendes, CEO da Zapay, aplicativo parceiro da Serasa que parcela débitos veiculares, trata-se de mercado em forte ascensão.
Isso porque o Brasil, hoje, é considerado o quinto país mais caro do mundo para se manter um veículo: “Neste contexto o consumidor não possui capital para conseguir comprar carro 0 KM, ainda mais que os preços estão subindo bastante e os salários não acompanham este avanço. O que era popular antes hoje não é mais”.
Mendes disse que a frota brasileira nunca esteve tão velha e, diante disto, fica mais viável reduzir a idade dos veículos gradativamente.
O COO do Opinion Box assinalou que a pesquisa mostrou que por se tratar de um bem caro o maior olhar para os seminovos se justifica, ainda mais pensando no tipo de financiamento ao qual recorrerá: “O crédito é importante e isso se mostra na prática”.
Sua relevância é tamanha que o tema integra agenda prioritária do setor de veículos, representado pela Anfavea, em reunião com o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Para o presidente da entidade, Márcio de Lima Leite, “sem crédito não há mercado”.
Além disso o projeto de lei 2 679/22, do deputado federal Pedro Lucas Fernandes, prevê o uso do FGTS, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, na compra de veículos novos e usados. A proposta, que visa a estimular o setor, tramita na Câmara dos Deputados.
Segundo a pesquisa na compra do carro 58% utilizaram algum tipo de crédito que permite que o pagamento seja parcelado, sendo 38% por meio de financiamento, 11% consórcio e 10% por empréstimo com instituições financeiras.
Destes 14% pagam ou já pagaram parcela com atraso e 22% buscaram alternativas para conseguir efetuar os pagamentos, como renegociação de dívida ou obtenção de outro empréstimo. Disse Schepers que “o carro é um patrimônio e as pessoas precisam dele para trabalhar. Então preferem atrasar alguma outra dívida em detrimento desta”.