Puerto Iguazú, Argentina — Um volume de 2,2 milhões de automóveis e comerciais leves emplacados em 2022, no Brasil, é o número que o presidente da Nissan para o Mercosul, Airton Cousseau, considerou mais real após sua análise de mercado no primeiro trimestre. Durante entrevista exclusiva para a Agência AutoData o executivo revelou que a empresa ajustará sua projeção interna para as vendas no País, pois no começo do ano a expectativa era de 2,4 milhões de unidades.
O executivo também falou sobre o avanço do segmento elétrico aqui, com produção nacional ainda distante, mas com perspectivas de preços mais baratos, pois o kW da bateria está cada vez mais em conta: em torno de US$ 250, com previsão é chegar a US$ 100 até 2025, quando o custo de produção do elétrico será quase igual ao de um veículo similar a combustão.
Confira abaixo a entrevista com com Airton Cousseau:
A Nissan pretende sair de 60% para 80% de índice de nacionalização em Resende. Qual o prazo em que isso deve acontecer?
Ainda não temos um prazo porque é um processo muito demorado. Primeiro você tem que encontrar um fornecedor que esteja disposto a fazer, depois você tem o processo de homologação da peça que passa pela engenharia e por uma série de testes e, dependendo do componente, os testes podem levar até dois anos. É um processo demorado, mas o importante é que já começamos: se a gente ficar pensando que é demorado e não começa nunca termina, não é? Temos condições de avançar porque outras empresas trabalham com nível de localização mais alto, existem fornecedores com capacidade para nos atender, e agora precisamos fazer com que as homologações aconteçam.
A Nissan apresentou esse projeto para 35 fornecedores nacionais. Quais peças a empresa quer localizar?
São vários tipos de componentes, muito mais atrelados à estrutura, como, por exemplo, peças pequenas de estamparia que estamos tentando localizar, bombas de combustível e filtros. São itens que são produzidos no Brasil, que tem fornecedor para isso: a única coisa que precisamos é realizar os testes para nacionalização.
O avanço da localização de componentes tornará a Nissan mais competitiva na região?
Sim, daqui a dois anos esperamos ter mais componentes nacionais e ser mais competitivos, sendo menos afetados por dólar e transporte — pois a logística, hoje, é cara e ineficiente — e impostos.
A busca pelo Top 3 na América do Sul tem um prazo?
Não, é um processo longo. Temos que ter um norte, saber onde queremos chegar, mas precisa ser muito sólido, não pode ser aquele crescimento que sobe e logo depois desce, sem estabilidade. Talvez esse tenha sido um dos nossos problemas, pois era tudo importado antes da construção da fábrica. Alguns dos nossos produtos entraram e saíram do mercado, caso do Altima, do Sentra, que está há alguns meses fora do mercado. O que queremos agora é estabilizar nosso negócio, ter mais consistência e com o tempo chegaremos lá. Olhando para o nosso portfólio global temos tudo: só precisamos trazer estabilidade, e isso vem com Resende exportando, assim como a unidade da Argentina.
Para atingir esse plano a Nissan precisará de grande relevância no mercado brasileiro, que é o maior da região. No Brasil qual é a sua meta?
Você não precisa de um market share tão grande no Brasil para buscar o Top 3, porque o volume é muito alto na comparação com outros mercados. Vamos focar sermos Top 3 em todos os segmentos em que atuamos e, quando entrarmos em um novo, chegaremos com essa meta. Hoje já estamos em segmentos importantes, caso dos SUVs compactos com o Kicks. Também estamos no B dos sedãs, que não é tão grande mas queremos ser relevantes, e no de picapes, que representa 5% do total vendido no Brasil. Se alcançarmos o Top 3 nesses segmentos poderemos chegar lá. Os hatches podem voltar a ter relevância conforme a produção aumentar nos próximos anos, chegando a 2,5 milhões, na medida em que, hoje, o foco da indústria é em produtos de maior valor agregado por causa da falta de semicondutores.
Que outros segmentos a Nissan considera relevantes para comercializar veículos no Brasil?
O dos C Suvs, que hoje tem de 10% a 11% do mercado. Temos produtos para isso, ainda lá fora, é algo para o que olhamos, e esse segmento também é importante.
E o segmento de SUVs abaixo do Kicks, como o senhor avalia?
Eu acho meio difícil participar desse segmento e vou dar alguns exemplos. O aço custava US$ 800 dólares a tonelada e agora custa US$ 2 mil. E quando você vai comprar o aço ele custa o mesmo preço para produzir um SUV pequeno ou um SUV maior. Então, se você vai usar 1 tonelada de aço para produzir veículos do segmento B ou do segmento C e D, o cenário muda, a rentabilidade é outra. Em segmentos menores você não tem margens menores, a sensibilidade aos aumentos de preços é maior, e quando sua nacionalização não é alta você sofre com o dólar também. No meu ponto de vista para trabalhar nesse segmento o volume de produção precisa ser muito alto, para ajudar nas negociações, e não é o que buscamos nesse momento.
A expectativa era a de que a crise dos semicondutores começasse a desaparecer a partir do segundo semestre, permitindo volumes maiores de produção. Porém novos fatores, como a guerra na Ucrânia, podem atrapalhar essa retomada. Como o senhor avalia esse cenário?
A minha expectativa é a de que isso ainda se resolva no segundo semestre. Abrimos um segundo turno em Resende baseado nas informações que temos sobre a melhora na disponibilidade de peças. Só que é muito instável. Então adotamos um controle muito forte da cadeia de fornecimento no tier 1, faz um ano que avançamos para tier 2 e tier 3, mas a cadeia é muito extensa, não conseguimos controlar tudo. Mas pelas pesquisas que fizemos não sofreremos influência do que está acontecendo hoje na Ucrânia porque nenhum fornecedor nosso traz componentes de lá. Mas esse cenário pode mudar. Sobre o fornecimento global de semicondutores: ainda não sabemos se se estabilizará no segundo semestre, mas o segundo turno foi aberto com informações de que teremos o volume necessário, de acordo com a matriz. Um ponto relevante é que acabou o just in time com estoque de apenas três dias: agora temos um volume grande de componentes estocados em Resende.
A Nissan oferece o Leaf para o segmento elétrico nacional, que ainda é muito caro. Como o senhor analisa uma possível nacionalização dos modelos elétricos e a queda nos preços?
Nacionalização ainda está longe. Preços cairão: quando começamos a vender o Leaf em 2010 o kW da bateria custava US$ 1,2 mil, agora custa em torno de US$ 250 dólares e, em dois anos, custará US$ 100. Quando chegar a este patamar o preço do carro elétrico será igual ao do a combustão. Em 2025 a projeção é de custar US$ 65 cada kW, enquanto os carros a combustão ficarão mais caros para produzir, como o que aconteceu aqui no Brasil com a chegada da nova fase de emissões. Vemos os carros a combustão com altas nos custos produtivos nos próximos anos, enquanto o elétrico vai ficando cada vez mais barato. Essa curva vai se encontrar em breve, em torno de 2025 ou 2026.
Qual é a sua projeção sobre as vendas de automóveis e comerciais leves no Brasil em 2022?
Nosso planejamento inicial era de 2,4 milhões de automóveis e comerciais leves, talvez um pouco otimista demais pelo que aconteceu até março, mas acho que essa retração no começo do ano está relacionada à falta de produto, pandemia e semicondutores. As locadoras estão pedindo carros e nós não conseguimos entregar, a renovação está atrasada, existe demanda para atender. Mesmo com a demanda existente revisaremos o número atual que foi projetado no começo do ano, usando como base informações de mercado e de grandes frotistas e também levando em conta o avanço dos semicondutores e outras questões. Acredito que passaremos dos 2 milhões de unidades, com 2,2 milhões sendo um número bastante realista.