Conversamos com José Carlos Sprícigo, presidente da Anfir, sobre a oportunidade de mostrar o Brasil no IAA
Hannover, Alemanha – Participar da maior feira de transportes do mundo não é para qualquer um. Para dezessete empresas nacionais do setor de implementos a edição de 2022 foi a primeira vez no IAA, experiência que, garantem, será repetida. O representante dessa turma que se aglutinou no pavilhão 25, onde foram exibidos todos os tipos de implementos para caminhões, é José Carlos Sprícigo, presidente da Anfir.
Enquanto recebia clientes brasileiros, e potenciais clientes de regiões como a África e o Oriente Médio, ele teve tempo de conversar com a reportagem por quase meia hora, sobre muitos temas, desde caminhões elétricos até a oportunidade de o País nacionalizar certos componentes que andam em falta no mercado global.
“A legislação brasileira obriga a utilização do EBS nas composições a partir de 1º de janeiro de 2023. Não há disponibilidade desse sistema eletrônico de frenagem para todos os fabricantes globais. Esse é um exemplo da necessidade que temos de desenvolver e produzir no Brasil.”
Em conjunto com a Apex Brasil, Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, a Anfir reuniu um grupo de empresas para, em conjunto, pela primeira vez exibir seus produtos e fazer negócios na IAA. Além de buscar novos clientes, conhecer as últimas tecnologias e tendências do segmento de transportes os brasileiros querem saber como vai se comportar o mercado global no ano que vem.
“O aumento dos custos na Europa é de 37% este ano. Tudo por causa da guerra no continente. Isso tem gerado muita expectativa. Aqui no IAA, além dos contatos presenciais, das prospecções e negócios realizados viemos para definir como será o próximo ano”.
Acompanhe os principais momentos dessa entrevista exclusiva:
Qual é o foco da presença das associadas da Anfir no IAA?
A visitação aqui no espaço Brasil da Apex e da Anfir tem atraído muitos brasileiros. Mas também temos foco nos clientes do Oriente Médio e da África, que podem utilizar nossos implementos e são mercados nos quais queremos ter uma maior participação em nossos negócios.
Quantas empresas da Anfir fazem parte do IAA este ano?
São dezessete empresas que se habilitaram a participar desse programa. É a primeira vez na história que estamos presentes com um número interessante de empresas e todas reunidas em um só espaço.
Além de receber os clientes quais outras oportunidades para a presença de executivos na feira?
Estamos no melhor lugar do mundo para conhecer novidades que podem ser aplicadas em nossos negócios. Cada vez que nossos engenheiros voltam ao estande comentam as oportunidades que temos de desenvolver novos fornecedores, novas soluções. Eles olham até fixação de carroceria, que pode ser uma coisa simples, mas que certamente faz diferença em nossas aplicações.
Existe oportunidade, por causa do conflito na Europa, de trazer para o Brasil a produção de alguns itens essenciais para o mercado de veículos comerciais?
No lançamento digital da Fenatran tivemos essa discussão sobre a necessidade de maior industrialização do Brasil e do setor automotivo. A partir de janeiro a legislação exigirá o sistema de frenagem eletrônico, EBS, para o quarto eixo de nossas carretas. Mas como houve um desabastecimento desse item por causa da pandemia e dos conflitos na Europa, eles aqui terão a prioridade para receber o EBS a partir de agora, o que deve normalizar a produção. A pergunta que se faz é: haverá um recuo na exigência desse item no Brasil a partir de 1o de janeiro ou não vamos produzir carretas pela falta do EBS? Esse é um exemplo da necessidade que temos de desenvolver e produzir no Brasil.
Quais as tecnologias apresentadas no IAA que o implemento feito no Brasil pode utilizar?
Nós já podemos ofertar toda a conectividade do implemento usado na Europa. Mas é preciso que o cliente reconheça valor na utilização de tecnologias. Os sensores, por exemplo: o TPMS, que mede a pressão e temperatura dos pneus, é algo que o nosso cliente gostaria de utilizar. Mas ele não sabe se vale investir porque não tem ideia de quanto essa tecnologia vai custar e como será o atendimento quando apresentar algum problema. Aqui na Europa há uma norma, uma legislação para a utilização de novas tecnologias que o próprio dono da carga exige que seja adotada. Não é a indústria, o fabricante, nem o transportador: é o cliente final que está preocupado com o monitoramento e a segurança da sua carga durante todo o trajeto. No Brasil também deveria acontecer dessa forma.
O que os transportadores que estão aqui no IAA querem ver?
Tivemos a oportunidade de viajar para cá com um grupo de noventa grandes transportadores que querem saber quais as alternativas para o motor a combustão. E nesses dias em Hannover deu para notar que o elétrico tem muitos desafios para dar certo no Brasil. Conversando com esses clientes percebemos que o elétrico ainda está longe da nossa realidade. O hidrogênio parece ser uma solução para o longo prazo no Brasil e o gás deve ser a realidade de curto prazo. Mesmo assim o caminhão a gás é bem mais caro e ainda falta uma infraestrutura de abastecimento que torne a operação mais rápida e segura. Ou seja: a impressão nessas conversas é que ainda há muito o que ser feito.
Para os implementos os eixos elétricos são um dos destaques aqui no IAA. Qual sua avaliação dessa tecnologia para a aplicação nacional?
A minha opinião é que o eixo elétrico não avançará no Brasil. Também não avança na Europa. E a razão é a mesma: o custo é muito alto e seu peso também. Mesmo com esses entraves o eixo regenerativo, capaz de armazenar energia, pode vir a ser utilizado em aplicações muito específicas, como um baú refrigerado em locais onde não serão mais permitidas emissões. Em Amsterdã, na Holanda, em 2025, nenhum baú refrigerado poderá operar com diesel. Assim como os automóveis não poderão utilizar esse combustível. Então o eixo elétrico ou os painéis solares nas composições podem fornecer a energia para essa operação específica.
Esses tanques com painéis solares. Você acredita que seria uma boa solução para o Brasil?
Essa resposta vocês terão lá na Fenatran. Vamos aguardar porque teremos muitas surpresas lá também.
Os eixos direcionais facilitam, mesmo, a operação e são tecnologia viável comercialmente?
É uma solução muito prática para manobras no percurso urbano. Nos semirreboques aqui na Europa eles utilizam bastante os eixos direcionais.
Qual a expectativa de negócios aqui no IAA?
Todo mundo que está aqui quer vender. Tomara que possamos realizar algumas vendas e, também, abrir novas fronteiras. Mais do que fechar negócios temos a oportunidade de fazer muitos contatos. É a primeira vez dessas dezessete empresas trazendo produtos do Brasil para toda a Europa, para todo o mundo. Temos expectativas, sim, mas queremos plantar uma semente para daqui a dois anos retornar. A exportação é um trabalho repetitivo. É uma venda demorada, que precisa de muitos contatos até a conclusão do negócio. Mas depois da primeira venda o cliente passa a comprar sempre.