São Paulo – Apesar do momento pouco alentador do setor automotivo nacional, algumas fabricantes de autopeças, de tamanhos e origens distintas, continuam a investir em inovação no País para não perder o bonde da transformação global vivenciado pela indústria fabricante de veículos.
Uma multinacional alemã, a Bosch, uma multinacional brasileira, a Randon, e uma média empresa nacional, a Selco, contaram suas diferentes experiências em busca da inovação de seus produtos e processos no 4º Encontro da Indústria de Autopeças, realizado na segunda-feira, 24, no São Paulo Expo, mesmo local que sedia, a partir da terça-feira, 25, a Automec, maior feira do setor de autopeças da América Latina.
Ficou bastante claro que a origem e que o tamanho das empresas contam bastante na hora de decidir investimentos em inovação. No caso da Bosch, por exemplo, o foco está em fazer no País o que a matriz não faz em outros países, como contou o presidente da empresa na América Latina, Gastón Diaz Perez:
“A Bosch investe globalmente quase 8% de seu faturamento anual em pesquisa e desenvolvimento. Também investimos aqui, mas é claro que escolhemos as melhores oportunidades. O Brasil, apesar de ter uma indústria de veículos grande, representa somente cerca de 2,5% do mercado global. Por isto não será aqui que desenvolveremos alguns sistemas mais avançados. Mas descobrimos outras oportunidades, como o desenvolvimento de sistemas para grandes equipamentos no setor de mineração e no agronegócio. Nestas duas áreas somos referência global da companhia”.
Multinacional brasileira
Já no caso da Empresas Randon, grupo brasileiro com diversas ramificações de autopeças e implementos rodoviários no Brasil e no Exterior, o caso é diametralmente oposto: a sede da empresa é em Caxias do Sul, RS, onde estão concentrados todos os investimentos e esforços de inovação.
Sérgio Carvalho, executivo chefe da Randon e da Frasle Mobility, contou que em 2018 a companhia criou um grupo dedicado à pesquisa e ao desenvolvimento “porque era necessário dar foco e prioridade a isto em uma empresa que ainda não tinha tradição nesta área”.
Os resultados começaram a aparecer rápido: na Fenatran de 2019 a Randon Implementos apresentou uma carreta com eixo auxiliar de tração elétrica, o e-Sys, que acrescenta 200 cv de potência ao conjunto e faz o caminhão reduzir o consumo de diesel de 15% a 20%. O sistema foi projetado pela Suspensys, uma das empresas do grupo, e atualmente já está em produção comercial:
“Foi tudo pensado aqui, a bateria, o eixo, o motor elétrico. Isto criou a cultura de inovação e hoje muitos dos nossos talentos querem trabalhar nesta área, na qual temos 33 projetos em andamento. Quando mostramos o que estamos fazendo muitos estrangeiros que nos visitam ficam impressionados”.
Segundo Carvalho a Randon incorpora em seus quadros, hoje, quarenta pesquisadores e mantém parcerias de desenvolvimento com dezessete startups e doze universidades, sete no Brasil e seis no Exterior.
Depois do eixo elétrico outros projetos já ganharam corpo na Randon. Carvalho cita o uso do nióbio em componentes de aço, que reduz o peso em 30% a 40%: “Conseguimos superar a barreira do custo com aplicação de nanotecnologia com o uso do nióbio. Com isto um cubo de roda de um caminhão feito em aço, por exemplo, ficou tão leve quanto um equivalente de alumínio, mas bem mais barato”.
O presidente também indica pesquisas na área de baterias com uso de nióbio, a carreta com placas solares para geração interna de energia e o sistema de telemetria, ambos lançados na última Fenatran, em novembro passado.
Parcerias fundamentais
André Silva, presidente da Selco, empresa de médio porte que tem como negócios principais a usinagem de componentes e produção de peças para compressores, indica que as parcerias foram fundamentais para tornar viáveis os investimentos em inovação:
“Com a ajuda do Sindipeças conseguimos acessar um financiamento da Finep de R$ 3 milhões, não reembonsáveis. Em parceria com o Senai estamos digitalizando todos os nossos processos industriais. Sem este apoio não teríamos condições de fazer isto”.
Em modelagem parecida, com recursos do Rota 2030 e com parceria com a Embrapii, Empresa Brasileira de Desenvolvimento Industrial, a Selco agora está promovendo outro projeto de inovação para participar da produção de hidrogênio, gás que pode gerar energia para a propulsão de carros elétricos:
“Tentamos explorar os diferentes parceiros de inovação, seja o Senai, Embrapii, Finep ou startups, que são fundamentais para tornar viáveis os projetos que estamos tocando. Nós nos beneficiamos da orientação do Sindipeças, muitas empresas não fazem o mesmo por falta de conhecimento de que estas ferramentas existem”.
Nisto as grandes empresas também estão de acordo: “Não é mais possível fazer tudo sozinho, as parcerias são fundamentais”, afirmou Perez, da Bosch. Ao que Carvalho, da Randon, acrescentou: “Precisamos das parcerias pois ninguém é capaz de conhecer tudo. No eixo elétrico e-Sys, por exemplo, tivemos vários parceiros de desenvolvimento: projetamos as baterias com um, o motor com outro, o eixo com um terceiro”.