Para Anip os preços são predatórios, o que traz concorrência desleal. Bridgestone negocia layoff por um ano na fábrica de Santo André.
São Paulo – Até julho o Brasil importou 25,6 milhões de pneus, volume 64,5% superior ao dos primeiros sete meses do ano passado. Segundo a Anip, que representa as fabricantes, foram 10 milhões de unidades a mais importadas no período, mesmo com a aplicação de alíquota de 16% para a importação de pneus de carga – por dois anos o produto ficou com imposto zerado, em decisão do ex-presidente da República Jair Bolsonaro, que justificava a medida como redução de custos para o transporte rodoviário do País.
Para piorar o preço do dólar ficou mais favorável, embora ainda na casa dos R$ 5, o custo do frete recuou e o de produção local, por outro lado, cresceu, com o aumento de tributo sobre a borracha, principal matéria-prima dos pneus e cuja metade da demanda é suprida por meio de importação.
Com todos estes fatores o preço de entrada dos pneus no mercado brasileiro é mais atrativo do que os fabricados localmente, de acordo com Klaus Curt Müller, presidente executivo da Anip: “Estamos vivendo um dos piores cenários da história do setor”.
Segundo ele a produção local dá conta do atual mercado e os estoques estão elevados, garantiu, sem citar números:“O problema é o aumento das importações, que pode ser verificado por meio de dados oficiais do governo, os quais demonstram importações a preços predatórios, impossibilitando qualquer concorrência leal”.
Ele contextualizou que o imposto de importação possui a sua função plena dentro de um comércio leal, no qual o seu princípio se encontra no alinhamento da competividade. Lembrou, no entanto, que “o tributo não possui efetividade plena quando se trata de importações desleais”.
José Alberto Panzan, presidente do Sindicamp, Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de Campinas e Região, reconheceu que mesmo com o dólar na casa dos R$ 5 e com o aumento de tributos sobre a compra de pneus importados no fim do primeiro trimestre deste ano o valor desse produto importado ainda é atrativo: “A diferença de preços gira em torno de 27%, tendo como base o pneu 295/80R 22,5, importado a R$ 1,7 mil e, o nacional, a R$ 2 mil 350”.
Ou seja: diferença de R$ 650 por unidade para este modelo.
Na avaliação de Márcio Ferreira, presidente do Sintrabor, Sindicato dos Borracheiros da Grande São Paulo e Região, apesar da “vitória” que as fabricantes tiveram com a volta da alíquota de 16% o governo anterior, além de zerar o imposto, “acabou com o preço de referência para a entrada do pneu importado no Brasil, prejudicando a produção nacional”.
Ferreira citou que o preço do frete internacional diminuiu no pós-pandemia, ajudado também pelo recuo do dólar, o que causou impacto no preço do produto: “Para complicar a situação em agosto houve a elevação do imposto de borracha natural de 3,2% para 10,8%, porcentual que poderá chegar a 22%. O problema é que a produção de borracha natural no Brasil supre apenas 52% do mercado, formado, principalmente, pela indústria pneumática”.
O sindicato está negociando com os funcionários da Bridgestone um layoff de um ano na fábrica de Santo André, SP, para 1,6 mil trabalhadores – quatro grupos de 402 operários, por três meses cada.
Preferência pelo nacional
Também diretor da Anacirema Transportes Panzan afirmou que em sua empresa há a preferência pelos pneus nacionais, por uma questão de padronização e de custo por quilômetro rodado. Mas ponderou que, no mercado, existe uma demanda a que a indústria nacional não atende, o que contribui, juntamente com o valor de revenda, para a maior oferta de pneus importados.
Ele acredita que para que a venda de produtos nacionais fosse superior a conta precisaria fechar e, além disto, haver predominância de venda de produtos nacionais: “Para tanto há que se buscar o equilíbrio de custo de produção, a incidência de tributos e a capacidade de operação”.
Déficit da balança comercial do setor escancara crise
De janeiro a julho o déficit da balança comercial do setor de pneumáticos, segundo dados do Comex Stat elaborados pela Anip, soma US$ 303,4 milhões – mais de cinquenta vezes o déficit registrado no mesmo período do ano passado, US$ 5,8 milhões.
Em termos de unidades o déficit do acumulado de 2023 foi de 18,4 milhões de pneus e no mesmo período, em 2022, chegou a 7 milhões.
A alta de 64,5% no total de pneus importados este ano, para 25,6 milhões de unidades, trouxe incremento naquele valor de 36,5%, para US$ 1 bilhão.
Ao mesmo tempo as exportações recuaram 16,6%, para 7,1 milhões de unidades: no mesmo período do ano passado foram 8,5 milhões. Os valores obtidos baixaram 4,1%, para US$ 698,8 milhões.
Mercado brasileiro de pneus encolheu 6,1% até julho de 2023
Dados da Anip apontam que o mercado de pneus acumula queda de 6,1% este ano até julho, totalizando 31,6 milhões de unidades, frente às 33,6 milhões do mesmo período em 2022. Em comparação com os primeiros sete meses de 2021 também há retração de 6,5% 33,7 milhões de unidades.
O maior volume de pneus importados tem sido consumido pelo mercado de reposição, pois OEM exige processos rigorosos de certificação, segundo o presidente executivo Müller. As vendas para o aftermarket retraíram 7,2% e totalizaram 23,7 milhões de unidades, e as para as montadoras recuaram 2,6%, somando 7,9 milhões.
O segmento que mais sentiu o baque na queda das vendas foi o de pneus de carga, que retraiu 16,2% este ano, com 3,8 milhões de unidades, sendo que para as montadoras o recuo foi de 20,4% e, para a reposição, de 14,8%.