Há pelo menos um ponto na atual crise da indústria automobilística instalada no Brasil que a torna bem diferente das anteriores já atravessadas pelo setor no País.
Trata-se da inédita diversidade da intensidade com que, desta vez, o desaquecimento do mercado vem afetando não apenas os diferentes elos que formam a cadeia automotiva mas, também, dentro de cada elo, a vida das varias empresas.
São três as razões básicas deste cenário tão particular:
De forma geral, todos estão sentindo os efeitos da inesperada queda de vendas e de produção do setor neste ano. Mas é certo que alguns estão sendo muito mais afetados do que os outros. E, convenhamos, há até quem não tenha muito do que reclamar.
Tais diferenças ficaram evidentes nas palestras e nos painéis que fizeram parte do seminário Revisão das Perspectivas 2015, realizado na semana passada, em São Paulo, por AutoData.
Logo na abertura do evento Luiz Moan, presidente da Anfavea, reafirmou a nova projeção da entidade, de queda, neste ano, de cerca de 20% nas vendas de automóveis e o dobro disso na área de caminhões. Quatro vezes mais que o inicialmente projetado. E foi além: postergou para o segundo trimestre de 2016 o início da retomada.
No entanto, no painel que reuniu os sistemistas e fabricantes de autopeças, o quadro que emergiu foi diferente: as quedas de faturamento ficaram bem mais próximas dos 5% inicialmente projetados para este ano – 8% na Bosch, 12% na Delphi e até relativo equilíbrio na Fras-le, empresa nacional mas com forte atuação fora do Brasil.
No outro bloco estão as empresas da base da pirâmide, que produzem componentes de reduzido conteúdo tecnológico e baixo valor agregado. Quase todas familiares e com pouco fôlego financeiro.
A diferença básica entre os dois blocos está no fato de que, no primeiro, estão as empresas que têm boa presença no mercado de reposição e acesso ao mercado internacional.
Puderam, assim, amortecer os efeitos da queda nas encomendas das montadoras com melhor aproveitamento da nova demanda de peças gerada pelo aumento da frota. E, também, com os frutos da melhor competividade no Exterior garantida pela mudança cambial.
Sem estrutura para se aproveitar destes pontos, as empresas do outro bloco, em contrapartida, tiveram de conviver simultaneamente com o corte das encomendas das montadoras e com mais dificuldades na área de crédito financeiro, agora mais caro e seletivo.
Muitas delas, em consequência, estão hoje numa espécie de UTI montada pelo Sindipeças ou, no limite, sendo mantidas vivas artificialmente por sistemistas que não podem ficar sem os produtos por elas fabricados.
No painel das montadoras, as diferenças dos reflexos da crise também ficaram evidentes. Das três participantes, duas – Toyota e Renault – apresentam queda de vendas inferior à media do mercado e, em decorrência, aumento da participação no todo comercializado.
A outra montadora presente ao evento, a General Motors, registra queda acima da média do mercado. Mas, mesmo assim, consideradas apenas as três primeiras montadoras do ranking, comemora redução inferior às outras duas e a conquista da vice-liderança no atacado e, inclusive, em vários meses, a liderança no varejo.
Na verdade, em se tratando deste universo especifico das montadoras, as diferenças são tão marcantes que nem parece que são todas do mesmo setor. Há um pouco de tudo. Até quem esteja passando ao largo da crise e, assim, registrando crescimento tanto das vendas quanto da participação.
Das três montadoras que participaram do painel a Toyota é o caso mais emblemático: o novo Corolla foi tão bem aceito pelos consumidores que conquistou lugar entre os dez mais vendidos do setor – caso inédito para um modelo nesta faixa de preço e características – e trouxe junto, para cima, o resultado da montadora.
No caso da General Motors sua linha foi completamente renovada há menos de dois anos, o que lhe permitiu colocar um de seus modelos, o Onix, nos cinco mais vendidos e, assim, avançar sobre as fileiras da Fiat e da Volkswagen, duas empresas cuja renovação da oferta está apenas se iniciando e cujos frutos ainda estão por serem colhidos.
São inúmeros os exemplos. É o ciclo típico do setor automotivo, potencializado, desta vez, pelo fato de que inúmeros novos players acabam de chegar e outros ainda colhem os frutos de lançamentos recentes bem sucedidos.
Na verdade, em uma crise tão inesperada quanto a atual, tudo depende do momento em que a fotografia foi batida. Ou, em economês, tudo depende do ciclo no qual a empresa estava no exato momento em que o desaquecimento do mercado começou a mostrar sua face.
Sorte de quem estava sorrindo e olhando para a câmera.
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