Disparada do combustível e desvalorização de frete exige esforço extra para fechar as contas
São Paulo – Apesar da demanda pujante para o transporte de mercadorias no atual cenário brasileiro as empresas que atuam no segmento colecionam desafios, como a disparada dos preços dos caminhões e do diesel, o frete desvalorizado, a falta de pneus e de motoristas e o aumento generalizado de custos.
Sem contar que, diante da crise trazida pela pandemia, alguns players, especialmente pequenas transportadoras, acabaram abandonando o negócio, afirmam entidades relacionadas aos transportadores de cargas. Adicionalmente, frente às dificuldades, a compra de caminhão acaba sendo postergada.
Assessor técnico da NTC&Logística, Lauro Valdívia elegeu, dentre todos os percalços, o incremento do combustível como o principal deles:
“A vida do transportador nunca foi fácil, mas agora está bem desafiadora. Vínhamos com aumentos acumulados de mais de 50% no diesel e depois tivemos outra alta de 20%. O aumento por si só já é um problema, mas a frequência com que são feitos os aumentos dificulta ainda mais a gestão financeira. O caminhão encareceu também, de 30% a 40%, na média. Mas, neste caso, é possível postergar a compra. Ou reduzir o volume adquirido. Em vez de comprar dez compro cinco”.
Lauro Valdívia
E o transportador deve preparar mais uma vez o bolso, pois a Petrobras anunciou que depois de quase dois meses sem reajustes elevará o preço do diesel em 25% o que, de acordo com estimativas da Abicom, poderá representar incremento de R$ 1 no litro.
Adriano Depentor, presidente do conselho superior e de administração do Setcesp, Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região, partilha da preocupação que vem tirando o sono dos empresários do segmento:
“A escalada do diesel compromete toda a planilha de custos do transportador, uma vez que corresponde de 35% a 45% das despesas totais. Não existe, portanto, outra matemática que não seja o repasse desses aumentos”.
Adriano Depentor
Como consequência o frete sobe de 12% a 15% só com o impacto do combustível. Sem contar a defasagem já acumulada ao longo do tempo. Valdívia observou que a inflação do frete está em torno de 20% na carga fracionada e de 30% na lotação: “Não é fácil repassar tudo. Para efeito de comparação nos Estados Unidos o frete rodoviário é historicamente de quatro a cinco vezes maior do que o ferroviário. Aqui concorre com ferrovia porque o frete é muito barato. E essa é uma grande dificuldade”.
Nesse contexto, nem o aumento de pedidos é capaz de ajudar na conta. Depentor disse que neste ramo o maior volume de cargas não é diretamente proporcional aos seus ganhos. Ao contrário: pode trazer perdas. Medidas importantes para tentar coibir a desvalorização do frete, citou, seriam a otimização das operações, a melhora na qualidade da entrega, uma infraestrutura mais adequada, melhores condições de trabalho nas rodovias, com pontos de parada, a diminuição da carga tributária e a melhoria da reforma trabalhista.
No ano passado o setor brigou para ampliar a desoneração da folha de pagamento por mais dos anos, o que ajuda bastante, uma vez que emprega muita mão de obra. Agora o objetivo é que o Refis seja votado, porque com a crise muitas empresas se endividaram e precisam acertar suas contas.
Outro ponto que preocupa são os pneus: além de escassos estão mais caros. E há a necessidade de trocar de uma a duas vezes por ano, citou Valdívia: “No caso dos rodoviários, se rodarem 12 mil quilômetros por mês, a cada seis ou oito meses têm de trocar. E cada pneu custa R$ 2,5 mil. Como é preciso trocar os quatro pneus de um eixo de uma vez, lá se vão R$ 10 mil. Se tiver frota de dez caminhões, R$ 100 mil”.
Perspectivas – O PIB do ramo de transportes de carga geralmente cresce ou decresce de duas a três vezes com relação ao PIB geral. Se for 0,5% o setor crescerá 1,5%, estimou o assessor técnico da NTC&Logística: “Em 2021 o primeiro semestre foi bom, o pessoal ficou animado, mas no segundo semestre o que frustrou a expectativa foi o volume de cargas, até do e-commerce. Este ano está complicado, pois começou devagar e, para completar, as incertezas, inerentes às eleições e à Copa do Mundo, aumentaram com a guerra na Ucrânia”.
A questão do emprego também preocupa, pois embora o setor tenha abrigado motoristas dispensados de companhias de ônibus ao mesmo tempo perdeu motoristas para aplicativos, pelo fato de sequer precisar comprar o carro, podendo alugar.
Valdívia esclareceu que a falta de motoristas é problema antigo, que vem desde 2014, mas que está se acentuando e acumula déficit de 5% a 10%: “Apesar da migração de alguns profissionais de ônibus, de dez candidatos dois passam nas seleções e não raro é preciso demitir depois de um mês pelo desempenho aquém do esperado. Isto porque a economia está devagar: se voltar a crescer de forma mais robusta será ainda mais agravado”.
Apesar das dificuldades mencionadas, Depentor lembra que este foi o setor que menos demitiu na pandemia e que mais contribuiu para o emprego no pós-pandemia: “O mundo parou mas o transporte não”.
Existem, hoje, de 40 a 50 mil transportadores no Brasil, de acordo com estimativas da CNT, sendo 21 mil na base dos cinquenta municípios paulistas atendidos pelo Setcesp. Com relação aos profissionais autônomos há cerca de 800 mil no País.