Modelo de negócio pode ganhar cada vez mais espaço no futuro do setor
São Paulo – Atenção mercado de locação de veículos: isto pode ser uma oportunidade imperdível. Com o cenário de inflação nas alturas, decorrente da desvalorização cambial e do aumento de preços de commodities, que causa impacto direto sobre a indústria e o setor automotivo, os preços ao consumidor dispararam.
Neste cenário, em que raramente um veículo zero-quilômetro chega ao mercado por menos de R$ 100 mil, o que também é atribuído às tecnologias embarcadas e às adequações de motores para que emitam menos poluentes, tendência é que o mercado de locação assuma a dianteira, que se consolidará cada vez mais como prestador de serviços e menos como vendedor de veículos.
Foi o que avaliou André Braz, coordenador do Índice de Preços da FGV, Fundação Getulio Vargas, durante o webinar Desafios e Oportunidades do Setor Automotivo no Brasil, promovido pela FGV.
O economista citou que o IPA, Índice de Preços ao Produtor Amplo, principal indicador do IGP-M, Índice de Preços Geral – Mercado, que mensura os custos de insumos da indústria, incluindo a automotiva, havia acumulado 47,5% de crescimento nos doze meses terminados em junho de 2021. No mesmo intervalo encerrado no mês passado, para se ter ideia, recuou fortemente para 10,7% – ainda assim se equiparando ao IPCA, Índice de Preços ao Consumidor Amplo, que reflete a pressão nos custos ao consumidor, e que acumulou 11,7% até maio.
Ele contou que “as matérias-primas brutas sofreram alta de 71% no período, e impulsionaram muito a inflação no ano passado. Só no segundo semestre teve início arrefecimento que levou esses insumos a outro patamar agora: -5,4% no acumulado de doze meses encerrados em junho. Mas o alívio que eles estão trazendo à atividade produtiva está sendo parcialmente ocupado pela escalada do diesel e da energia elétrica, muito importante para o setor automobilístico, intensivo nesse consumo, o que traz mais desafios”.
Tendência de baixa dos preços em xeque – É preciso ponderar contexto tomado por guerra na Ucrânia, recrudescimento dos casos de covid, principalmente na Ásia, importante polo produtor de semicondutores, ano eleitoral no Brasil e aumento de juros nos Estados Unidos. Tudo isso, de acordo com Braz, pode ameaçar a descontinuidade da redução dos preços.
Tanto que a inflação de mais de cinquenta componentes para veículos tem desacelerado, mas em ritmo mais lento. Há um ano acumulara 25,8% e, nos doze meses encerrados em junho, 15%. Na média o carro novo encareceu 10,9%, variação similar à do IPCA, e o usado subiu 13,1%.
Mais: dados de pesquisa da IHS/Delloite apontam que os itens eletrônicos representam 40% do preço final do carro, o que deverá chegar a 45% em 2030. No ano 2000, para efeito de comparação, equivalia a 18%. Ou seja, trata-se de caminho sem volta no incremento dos preços.
Consumo diferente da nova geração – O economista da FGV disse ainda que a mudança de hábitos por parte da geração mais jovem também deverá corroborar esse novo modelo de negócios, que tem como sua mais recente vertente o mercado de carros por assinatura.
Francis Martins, professor de MBA da FGV, lembrou que essa população tem outro desejo, não tanto mais de posse. O que configura mudança de paradigmas. “Muitas pessoas de 20 anos nem mais cogitam tirar carteira de habilitação, pelo gasto que isso representa e pela falta de interesse, pois hoje há a cultura do uber que atende a suas demandas”.
Mesmo pertencendo a outra geração Braz disse que em 2017 vendeu seu carro e, desde então, tem vivido no mercado de carros alugados:
“Agora posso dirigir o carro que eu quiser. Não preciso mais ficar refém de um modelo de automóvel. Posso escolher aquele que satisfaz minhas necessidades em cada momento. E tem sido uma boa experiência. Gasto menos e é uma forma de usufruir o que o setor automotivo tem de melhor em termos de segurança e tecnologia. O uso também tem sido revisto, ao priorizar o carro para viagens, férias e para percorrer distâncias mais longas e não mais para ir à padaria”.
André Braz
Martins disse que também tem pensado como o economista e pensado em adotar a assinatura de carro, pois na ponta do lápis avaliou valer mais a pena, ponderando depreciação, trocas, manutenção.
Com base nessas análises o setor terá de mudar sua estratégia, inclusive na concessionária. Martins assinalou que o vendedor terá de melhorar a experiência do cliente para cativá-lo e não somente direcioná-lo a um produto:
“O marketing terá o papel de engajar ainda mais. O financeiro também tem um desafio lançado: como ganhar dinheiro com a redução da posse? Para onde vou? Será que a eletrificação traz algo diferenciado? O automóvel será o celular sobre rodas. Como lidar com os fornecedores?”.
Francis Martins
Espaço para crescer – Gustavo Ogawa, diretor de vendas e rede da Renault, assinalou que as empresas que adotam novas tecnologias e geram novos produtos por meio de digitalização são as que mais conseguem capitalizar seus ativos.
Pensando nessa tendência, ele disse, a Renault lançou a Mobilize, marca focada em oferecer soluções inteligentes de mobilidade e energia limpa e que até 2030 deverá representar 20% da receita global do grupo. Um dos princípios é propor soluções inovadoras, como o compartilhamento de veículos e o financiamento e serviços de locação de longa duração.
Ao mesmo tempo ainda há espaço para o crescimento do mercado local, pois enquanto no Brasil há média de um veículo para cada cinco habitantes nos Estados Unidos a conta é de um carro por habitante. Outro dado é que enquanto na Europa o tempo para a troca de veículo gira em torno de oito anos no Brasil é de aproximadamente três anos.