São Paulo – “Estamos perdendo mercado para a China na América do Sul e mesmo no âmbito do Mercosul, uma vez que a Argentina, que era o principal parceiro do Brasil, deixou de ser”, constatou o embaixador Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior, na abertura de sua apresentação durante o segundo dia do Seminário Megatendências 2023 – O Novo Brasil, realizado de forma online até sexta-feira, 24, pela AutoData Editora.
“Perdemos para a China a liderança das exportações para a Argentina. Se o Brasil não passar as reformas, estabilizar a economia, simplificar e reforçar ambiente de negócios, nós não ampliaremos nossa competitividade. E nada no Exterior avança se não fizermos nossa lição de casa.”
Para ele o Brasil terá de tomar iniciativas proativas de liderança na América do Sul e no Mercosul, tanto porque a China vem assumindo protagonismo que pertencia ao Brasil nas relações comerciais com a Argentina, como porque, diante da tendência de oposição à globalização, surgiu forte movimento de regionalismo. Segundo Barbosa, esta grande mudança tanto na política econômica global como na geopolítica abre grandes oportunidades de negócios que podem ser exploradas pelo bloco formado também por Argentina, Uruguai e Paraguai.
O comércio do Brasil dentro do Mercosul despencou de 1998 a 2022. Há 25 anos o bloco representava 17% do comércio exterior brasileiro e no ano passado esta fatia foi de pouco mais de 6%. Em 2022 foram movimentados pelo Mercado Comum do Sul US$ 40,3 bilhões.
Nos últimos quatro anos o bloco comercial perdeu importância no País, incertezas para a integração sub-regional prevaleceram, em virtude da situação econômica da Argentina, do desinteresse brasileiro e de rusgas de chefes de Estado:
“Trata-se de situação inconcebível. O então presidente do Brasil não falou com o presidente da Argentina nos últimos quatro anos e o país vizinho, por causa das crises internas, dificultou também as negociações com alguns países. O resultado foi uma quase paralisia das negociações do Mercosul”.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em sua avaliação, não pode reincidir em erros como o do seu último mandato e o da gestão de Dilma Rousseff: “Eles fizeram do Mercosul um fórum político e social. E o que é preciso fazer é promover uma integração econômica e social”.
Novos acordos e discussões incluem setor automotivo
O embaixador citou que há esperança de mudanças, uma vez que Lula, em três meses de governo, já visitou Argentina e Uruguai. E, recentemente, foi renovado o interesse da Europa para concluir conversas com o bloco sul-americano.
Barbosa assinalou que a abertura do setor automotivo não será imediata. Frisou que apenas após quinze anos do acordo com a União Europeia haverá o exercício de tarifa zero pelos países:
“Temos esses anos todos para que o setor se fortaleça e se torne competitivo. A questão dos semicondutores tem paralisado a produção local, o custo Brasil é muito elevado, assim como o câmbio. Mas o problema dos setores mais vulneráveis, como o automotivo, não são os acordos, e sim a política econômica. Temos de fortalecer a abertura do mercado, as regras internas, o ambiente de negócios e reduzir impostos”.
Barbosa destacou que esta foi a primeira vez em que houve a inclusão do setor automotivo, assim como a do de açúcar, nas discussões do Mercosul, ao complementar que o que existem, hoje, são acordos de montadoras, mas fora do Tratado de Assunção. O Brasil, hoje, tem acordo de livre comércio com os outros três integrantes e 98% dos produtos negociados estão com tarifa zero.
Para o especialista, que coordenou o bloco por quatro anos quando ele foi formado três décadas atrás, é preciso ter visão de médio e longo prazo para fortalecê-lo. Temas que ainda não são examinados pelo bloco, por exemplo, fariam diferença a favor do Brasil, uma vez que ele poderia liderar o movimento de identificação de setores potenciais, a exemplo do segmento de energia renovável. Ampliar o número de produtos exportados é outro desafio e lição de casa para os próximos quatro anos.