São Paulo – “Quando nós colocarmos os pedidos eles telefonarão para a matriz e aprovarão o investimento. Eles já têm a tecnologia.” Simples assim. Alexander Seitz acredita que surgirá no País, no curto prazo de mais dois ou três anos à frente, uma cadeia de suprimentos preparada para fornecer componentes para veículos eletrificados, principalmente híbridos, que a Volkswagen e outras empresas planejam produzir aqui.
Como chairman executivo da Volkswagen América do Sul e, até 2012, vice-presidente de compras da empresa, Seitz avaliou que os fornecedores estão melhor preparados e capacitados para dispor, no País, de manufatura própria para boa parte dos componentes para a produção dos novos híbridos que a companhia pretende oferecer ao mercado, provavelmente já a partir do ano que vem: “Não direi quando será exatamente mas posso afirmar que não será em 2028 [quando termina o atual ciclo de investimentos de R$ 16 bilhões no Brasil]. Temos que fazer antes disso até para cumprir a legislação de emissões e de segurança”.
Seitz revelou que uma parte dos investimentos dos fornecedores será feita pela própria Volkswagen: “Quando pensamos nos investimentos temos de dividir em três partes, quase iguais: uma para o desenvolvimento dos produtos, outra para produzir esses veículos nas nossas fábricas e a terceira parte é investida em ferramentais que serão usados pelos fornecedores”.
Os recursos para financiar a evolução virão de fontes diversas, como a recente linha de R$ 500 milhões tomada pela Volkswagen no BNDES, mas Seitz apontou que a maior parte dos R$ 16 bilhões prometidos “terá de vir de nosso fluxo de caixa: portanto, se não vendermos, não haverá dinheiro”.
Os novos veículos que serão lançados dentro do ciclo de investimentos da Volkswagen, segundo Seitz, “certamente trarão aumento do orçamento de compras, pois carros híbridos e híbridos plug-in têm mais componentes, são praticamente dois powetrains, um a combustão e outro elétrico”. Ele também lembra que novos sistemas de assistência à condução, os ADAS, também serão incorporados em volumes crescentes nos próximos anos.
Mais flexibilidade com fornecedores
O executivo avaliou que atualmente a cadeia de suprimentos no Brasil tem situação mais estável do que em sua época na liderança das compras, no início da década passada. Segundo Seitz, naquela época, “produzindo de 850 mil a 950 mil carros por ano em três turnos na Volkswagen havia uma luta por peças muito grande, mesmo que os carros não tivessem tantas tecnologias como hoje”.
Hoje, disse ele, existe maior flexibilidade com os fornecedores, que aceitam contratos com variações de volumes de 15% a 20%: “Foi isto que nos permitiu crescer a produção muito acima da média da indústria”. O executivo acrescenta ainda que os trabalhadores também aceitaram contratos mais flexíveis, trabalham em dois turnos e, eventualmente, fazem horas extras e são convocados para jornadas aos sábados quando é necessário.
Globalização e localização
“O mercado era mais aquecido e havia mais globalização. Hoje vejo mais desglobalização, com América do Norte e Europa se protegendo da concorrência da Ásia, principalmente China”, observa Seitz. “A vida ficou um pouco mais difícil.”
O executivo observou que o Brasil sempre foi mais fechado em comparação a outros mercados, as fabricantes têm certa independência mas o País também precisa de maior relacionamento comercial internacional porque depende de importações de itens que não consegue produzir, especialmente eletrônicos para os ADAS e baterias para elétricos e híbridos.
“Ainda dependemos da Alemanha para desenvolver os modelos a combustão e da China para os elétricos e híbridos”, ponderou Seitz. “Precisamos deixar as portas abertas, um mercado livre, para não ficarmos como uma ilha isolada, mas também precisamos localizar tecnologias. Não quero importar 80% do carro porque amanhã ou depois temos uma nova crise em algum lugar do mundo e ficamos sem peças para produzir. Localizar é meu seguro, mas também não posso fazer 100% de tudo aqui.”
Sobre os carros elétricos chineses que começam a ganhar mercados – e a provocar medidas para proteger a indústria local, como a taxação de 100% nos Estados Unidos e a retomada do imposto de importação no Brasil – Seitz afirmou que não vê problemas em concorrer com os fabricantes chineses, mas desafia: “Queremos que eles venham produzir aqui, que enfrentem as mesmas dificuldades que temos fazendo carros no Brasil: aí, sim, veremos se a festa continua”.