São Paulo – Anfavea e Sinfavea, entidades que representam o setor produtor de veículos no Brasil, iniciam nesses dias mais um período antigamente descrito como “de caça à raposa”, que se inicia com os editais e que tem seu grand finale provavelmente em alguma quarta-feira de abril, ou quinta, antes do dia 19, com a posse de suas novas diretorias. Os estatutos não proíbem reeleição mas por enquanto o que existe são dois candidatos que já expuseram a sua condição.
Tudo é extra-oficial, é claro. Os candidatos assumidos são Márcio Lima, da Stellantis, e, novamente, Ricardo Martins, da Hyundai. Como já aconteceu na eleição passada poderá haver espaço para um tertius se houver, igualmente como aconteceu então, um chamado à responsabilidade.
(Tertius foi termo muito utilizado pelos repórteres políticos em atividade em 1978, quando o general Euler Bentes Monteiro surgiu como alternativa à sucessão do general Ernesto Geisel à Presidência da República diante das candidaturas dos generais Sílvio Frota – que, afinal, por boas razões, nem disputou – e João Baptista Figueiredo, eleito de maneira indireta. Euler era o tertius, latinismo que significa terceiro, expressão agora retomada para designar a busca pela terceira via.)
Hipótese que não pode ser ignorada é a da recondução de Luiz Carlos Moraes para mais um período. Diz-se, porém, que ele já estaria atrasado na entrega de seu pedido de aposentadoria à Mercedes-Benz e seria um ás de costas para o baralho. Mas se sua gestão não foi arrojada reconhece-se que manteve os cordões do jogo e da política interna da entidade claramente em suas mãos, assim como o rumo dos interesses predominantes das empresas associadas.
A história da Anfavea não registra chapas em litigância até porque sua tradição foi formada, desde a fundação, por acordos que contemplavam os interesses em jogo. Era uma época de poucas empresas associadas e na qual quase tudo que estivesse escrito nos papeis sobre a mesa interessava a todos. Trabalhavam juntos os pioneiros, tinham objetivos e queriam ver seus nomes unidos à da indústria nascente.
Mais recentemente, com a terceira onda da industrialização brasileira, nos meados dos anos 90, é que as posições das pioneiras na condução da entidade, no caso Fiat, Ford, General Motors, Volkswagen e Mercedes-Benz, passaram a ser questionadas pelos recém-chegados. A Fiat nem faz parte do bloco pioneiro e só chegou à presidência da entidade em 1995, com Silvano Valentino, depois de muita negociação – foi, provavelmente, até 2019, a sucessão mais complicada.
O grande instante da revolta aconteceu exatamente há três anos, quando a grandeza de um dos candidatos – do candidato oficial, Rogelio Golfarb, da Ford – atuou como o chamado à responsabilidade: nem ele nem o mesmo Martins de hoje, o revoltoso, seriam candidatos, o que abriu lugar para Moraes, vice de Golfarb. Na época assim foi superada a encrenca.
Como disse um antigo diretor o que se espera, agora, é que mais uma vez o bom senso prevaleça e que a tradição seja mantida: de acordo com ele duas chapas no palco seriam o maior sintoma da desimportância da Anfavea e do teatro vazio na hora da posse. Ele também aponta uma certa falta de desapego, da parte de muitos diretores, com relação à ideia da dedicação à vida associativa. E costuma dizer que as empresas têm reservado suas cadeiras na Anfavea para executivos de nível júnior. Antes que se possa espantar diante do júnior ele justifica: “O setor é de veículos, como se sabe, mas muitos dos novos executivos, selecionados no mercado, não nutrem paixão por carros, por caminhões e ônibus. Não têm afinidades com veículos. Trabalhar na indústria, então, não passa disso: de mais um emprego. E isto reflete na entidade”.
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