São Paulo – O mercado nacional de caminhões perdeu boa medida do vigor do ano passado, com 26,9 mil unidades negociadas e crescimento de apenas 3% no primeiro trimestre de 2022 em comparação com igual período de 2021. O ritmo está abaixo do projetado pela associação dos fabricantes, a Anfavea, que espera expansão nas vendas de 9% este ano, para 140 mil veículos de carga.
No Fórum AutoData de Veículos Comerciais, realizado de segunda-feira, 25, até a quarta-feira, 27, representantes da Mercedes-Benz, Scania, Volkswagen Caminhões e Ônibus e Volvo avaliam que existem condições para alcançar crescimento em torno de 10% este ano.
A avaliação de riscos e oportunidades do mercado este é igual para todos. Pelo lado das oportunidades, podem puxar as vendas de caminhões para cima a nova safra recorde do agronegócio, a alta dos preços das commodities que impulsionam a mineração e a construção civil, que têm perspectivas de crescimento descoladas do fraco desempenho esperado da economia em 2022.
Os vetores negativos também são bem conhecidos de todos: alta da inflação e dos juros, aumento acelerado dos custos dos fabricantes e dos clientes, com matérias-primas, veículos e combustíveis cada vez mais caros, além das instabilidades trazidas pelas eleições este ano e fatores externos, como a guerra na Ucrânia e repiques da pandemia de covid-19 na China, que vêm provocando dificuldades e impondo mais custos às já abaladas cadeias logísticas globais de abastecimento de insumos e componentes.
“Ainda vivemos muita instabilidade econômica, com inflação e juros em alta no mundo todo, o que prejudica o fluxo de capitais para o segmento de transportes, nossos clientes, também muito afetado pela alta nos preços dos combustíveis”, avalia Silvio Munhoz, diretor comercial da Scania Brasil.
Alcides Cavalcanti, diretor comercial da Volvo Caminhões, reconhece que “o mercado andou de lado no primeiro trimestre, mas alguns setores como agronegócio, construção civil e mineração seguem aquecidos”. Ele projeta que se a indústria conseguir superar as limitações de produção, causadas pela falta de componentes, “ainda poderemos aumentar o desempenho e alcançar nos próximos meses e alcançar as previsões”.
Sérgio Pugliese, diretor de vendas de caminhões da VWCO, ponderou que apesar das projeções de crescimento insignificante de 1% ou até mesmo de queda de 1% do PIB este ano, a previsão de expansão do agronegócio de grãos é de 6,3%, o que pode compensar o baixo desempenho da economia e sustentar em alta as vendas de caminhões pesados no País.
Outro fator que pode empurrar as vendas para cima, ainda que momentaneamente, é a nova etapa da legislação brasileira de emissões para veículos pesados, o Proconve P8, que entra em vigor a partir de janeiro de 2023 e vai obrigar a adoção de motores diesel Euro 6, mais caros. Com isso alguns frotistas já planejam antecipar até o fim de 2022 compras de modelos Euro 5, mais baratos.
Cavalcanti afirma que já tem consultas de clientes que gostariam de antecipar compras de caminhões para escapar dos inevitáveis aumentos de preços em 2023, mas ele descarta a repetição do boom vivido em 2011, quando a indústria atingiu o recorde de 172,8 mil caminhões vendidos na transição dos motores Euro 3 para Euro 5, em 2012. “Desta vez é diferente, temos limitações de produção e falta capacidade para atender todos os pedidos”.
Pugliese, da VWCO, destacou que após o freio da pandemia o mercado de veículos de carga no País experimentou crescimento exponencial de 50% em apenas dois anos, desde 2020 até o fim do trimestre passado, com demanda sempre acima da capacidade de produção. “Os serviços de transporte cresceram pelo quarto mês seguido, o que nos dá boas perspectivas de crescimento este ano, mas os problemas de falta de componentes seguem limitando a capacidade da indústria”.
Para Jefferson Ferrarez, diretor de vendas e marketing de caminhões da Mercedes-Benz, com a antecipação de compras o mercado poderia este ano ser até maior do que as 140 mil unidades projetadas pela Anfavea. “Este seria um ano para bater em 160 mil até 170 mil caminhões se as fábricas tivessem capacidade para isso. Mas ainda estou confiante que vamos crescer mais no segundo semestre”.
“Passamos no fim do ano passado por uma fase muito difícil, em que não sabíamos nem quantos semicondutores teríamos para produzir nem quando receberíamos. Agora temos essa previsão, mas já sabemos que ainda será insuficiente para atender todos os pedidos dos clientes”, lamentou Munhoz, da Scania.
Cavalcanti conta que a situação na fábrica da Volvo em Curitiba, PR, está melhor do que no ano passado, quando a linha de produção precisou ser paralisada por falta de componentes, mas ainda são necessárias algumas microparadas por atrasos no fornecimento. “A situação de semicondutores não é confortável, criamos até um setor para cuidar disso dia e noite. Mas também faltam outros insumos, como pneus, plásticos, aço e alumínio.”
O executivo disse que as filas de espera, que chegaram a se alongar por seis a oito meses, hoje estão menores, mas ainda fora da normalidade de trinta a sessenta dias. A carteira de pedidos da Volvo já preenche a capacidade de produção até julho e alguns produtos vocacionais encomendados agora, especialmente para o setor de mineração e construção civil, serão entregues somente a partir de setembro.
A mais longo prazo, o programa de renovação da frota de veículos comerciais criado oficialmente este mês, o Renovar, foi bem recebido pelos fabricantes de caminhões, que veem potencial de fomentar vendas nos próximos anos.
Ferrarez, da Mercedes, lembra que existem rodando no Brasil cerca de 450 mil caminhões com mais de dez anos que podem ser tirados de circulação e trocados por modelos mais novos. “Ainda esperamos pelas regulamentações, mas ao menos agora temos algo concreto.”
“A idade média da frota de caminhões no Brasil é de 17 anos, enquanto o ideal seria de seis a oito anos. Por isso o Renovar nos enche de esperança, pela primeira vez temos um programa estruturado de renovação”, afirma Pugliese.