São Paulo — O segundo semestre deverá trazer alento ao conturbado cenário vivido pelo setor automotivo nos últimos meses. Isso porque é aguardada melhora no fornecimento de cadeias de suprimento, principalmente pelo fato de a China começar a dar sinais de reação pós-lockdown, com reabertura econômica, e de o conflito entre Rússia e Ucrânia não apresentar grandes mudanças, apesar da continuidade, o que deverá se tornar mais nichado, sem maiores pressões nas commodities.
O aumento da importação de componentes, como circuitos e processadores eletrônicos, que já tem sido visto por parte de companhias no Brasil, entretanto, não se deve somente a um maior volume de produção, mas a uma desaceleração da economia global, que reduz a demanda por parte de outras localidades e, dessa forma, sobram mais peças e produtos para o País.
Foi o que analisou o superintendente de pesquisas econômicas do Banco Itaú, Fernando Machado Gonçalves, durante o último dia do Seminário Revisão das Perspectivas 2022, realizado pela AutoData Editora. “A redução na demanda global também puxa para baixo os preços, o que ajuda a indústria nacional. Mas isso tudo se deve à desaceleração da economia mundial.” Caso, por exemplo, do minério de ferro e do cobre, que já recuaram.
Como o nível de estoque do setor está bem abaixo do que se costumava trabalhar, no entanto, é possível, de acordo com o economista, que em um primeiro momento o aumento das importações não exerça impacto instantâneo:
“Deverá haver, primeiro, uma recomposição dessas peças para que, posteriormente, haja a recomposição do estoque de veículos. Assim, poderá haver defasagem e o feito dessa melhora nas cadeias de suprimento talvez não seja tão imediata. Mesmo assim, sinaliza melhora.”
Um dos motivos que explicam o cenário é o fato de os Estados Unidos, diante do aumento da inflação, elevarem os juros em 0,75 ponto porcentual, alta que não se via desde 1994. E essa inflação deriva do alto índice de confiança da população, que se viu encorajada a mudar de emprego após o ápice da pandemia, negociar melhores salários e consumir. Diante dessa elevação de juros, porém, a economia desacelerará.
Isso ocorrerá em um momento em que a economia brasileira, por outro lado, já remediada pela elevação dos juros, começará a baixar a inflação e consequentemente os preços praticados pelo mercado, ao mesmo tempo em que as taxas de financiamento deverão se estabilizar. O que refletirá inclusive na cotação do dólar.
Expectativa de dias melhores — As projeções do Itaú para o fim de 2022 são de IPCA em 7,5% ao ano, enquanto que hoje está em 11,7%. A Selic, atualmente em 13,25% ao ano, deverá chegar a 13,75%. E o câmbio, de R$ 5,45, recuará a R$ 5,25 – o que possivelmente inibirá a entrada de dólares no País e sua valorização.
Para o PIB a expectativa é de alta de 1,6%, impulsionado também pelas políticas públicas de diminuição de impostos, como PIS, Cofins, Cide e ICMS e pelo pagamento de benefícios previstos no PLP 18, antiga PEC 16, como o Auxílio Brasil, que passará de R$ 400 a R$ 600, auxílio emergencial, vale gás e auxílio caminhoneiro.
A redução das taxas e a implementação das políticas de incentivo deverão estimular o consumo por um lado, mas, por outro, enfrentarão o alto comprometimento da renda e o uso da injeção de auxílios para movimentar o setor de serviços e comércio de baixo tíquete.
“Embora isso represente ganho de renda das famílias e, na teoria, sobre mais dinheiro para gastar, na prática contrabalanceia com a indisponibilidade de recursos a serem financiados, devido ao alto comprometimento da renda.”
Ou seja, Gonçalves ponderou que os desafios estão lançados, apesar da expectativa de dias melhores. E o próximo presidente da República terá a responsabilidade de encabeçar a discussão das contas públicas a fim de que o que hoje representa alento não se transforme em bola de neve para 2023, quando, no segundo semestre, quase em 2024, a economia poderá, finalmente, sair da grave crise herdada pela pandemia.