O mundo todo passa por um período conturbado e apreensivo com desaceleração da economia global e risco de recessão em diversos importantes mercados como o chinês e o estadunidense. Recentemente a prestigiada revista “The Economist” saiu com reportagem especial dando conta que o aumento dos juros nos EUA tem esfriado o mercado imobiliário, enfraquecido a demanda por cobre, ferro e madeira e reduzido o consumo de bens – de eletrodomésticos a automóveis –, o que também afeta o mercado de zinco e alumínio.
Na Ásia, a desaceleração brusca do PIB chinês, cujo aumento foi de apenas 0,4% em relação ao ano passado, com o mercado imobiliário também em baixa, deflagrou queda generalizada nos metais da ordem de 10% a 40% desde maio deste ano. Com inflação global elevada desde o início da pandemia, ritmo lento de crescimento e juros subindo, os investidores deixam de apostar em commodities metálicas transferindo capital para negócios mais rentáveis como títulos públicos de países como os Estados Unidos.
Desde o início do período de pandemia, com base no aumento das commodities minerais, algumas commodities metálicas acumularam alta de cerca de 155% como é o caso do aço, seguindo de 77% no alumínio e 72% do cobre, provocando um aumento nos preços dos produtos manufaturados principalmente para a indústria automobilística em toda a sua cadeia.
Contudo, ainda não foi possível verificar a readequação dos preços diante desse novo cenário, e isto se deve basicamente a fatores como:
(a) desvalorização do real frente ao dólar;
(b) ajustes nos custos e margens sob a redução da demanda;
(c) aumento nos juros ao custo do capital de financiamento da produção;
(d) aumento da inflação sobre os gastos gerais de fabricação;
Esse sintoma já é percebido nas demandas domésticas de países como a China, chegando também no Brasil. Algumas usinas estão paralisando ou reduzindo drasticamente a operação dos seus altos-fornos à medida que os estoques acumulam, estrangulando a cotação do minério de ferro no mercado global para valores anteriores aos da pandemia.
Com isso, no Brasil, a cotação da sucata metálica, também acompanhou a retração das commodities minerais, surpreendendo o mercado nas últimas semanas. Na segunda quinzena de julho alguns tipos de sucatas metálicas foram negociadas a preços equivalente a 25% do que que valiam no início do mês passado, ou seja, 75% de queda em menos de 60 dias.
Considerando que a sucata metálica é uma importante fonte de receita aos fabricantes de componentes metálicos automotivos, esse cenário ácido poderia, em última análise, até inviabilizar a retirada de sucata uma vez que a operação sequer cobre os custos logísticos. Esse é, sem dúvida, sinal de alerta para indústria automotiva uma vez que o setor gera, corriqueiramente, resíduos em seus processos de produção.
Toda cadeia automotiva, especialmente as montadoras, possui contratos estruturados e negocia periodicamente estes volumes com empresas especializadas em beneficiar esses resíduos metálicos e retorná-los como matéria prima. Para esse processo ser viável e sustentável, há, naturalmente, a necessidade de constante reavaliação dos preços dos contratos, equalizando os custos de mercado. Ocorre, contudo, que esse processo pode demorar algumas semanas e impactar a operação como um todo.
Esse panorama só é possível com empresas altamente estruturadas que chegam a retirar sucata até de hora em hora. São empresas de grande porte, rigorosamente fiscalizadas e legalizadas que investem maciça e continuamente em máquinas e equipamentos, tecnologias de processo, gestão e frota de caminhões próprias.
Atrelando isso ao atual cenário econômico, no qual a sucata metálica chegou a despencar quase 75% sua cotação em menos de 60 dias, uma empresa desestruturada, com caixa curto, crédito estressado, margens pequenas e que pode se tornar insolvente do dia pra noite, coloca em alto risco além da empresa que a contratou, toda a cadeia de produção.
A indústria automobilística não pode ficar à mercê de riscos financeiros, logísticos e operacionais por se relacionar com companhias sem estrutura, sob pena de arcar com prejuízos até por sua responsabilidade subsidiaria. Por essa razão, sob o manto da responsabilidade social – um dos pilares do ESG – é importante olhar para a economia circular que contempla os catadores de resíduos ou carreteiros como também são chamados. São os elos mais fracos e vulneráveis desse processo pois sobrevivem da obsolescência e separação de resíduos domésticos.
A redução na cotação das commodities faz o preço das aparas também diminuir, exigindo muito mais esforço dos catadores para conseguirem compensar no peso a queda dos valores. Neste momento crítico é fundamental a conscientização de toda sociedade, incluindo empresas e governos, sobre a importância social e ambiental de se preservar toda a cadeia de reciclagem, colaborando e apoiando o trabalho desses autônomos.
Segundo o diretor comercial da Trufer, Luiz Gustavo Olicheski, esse tipo de sazonalidade brusca que reflete em grandes oscilações de preços, pode ser atenuada por meio de ações colaborativas conjuntas com os parceiros comerciais, apresentando soluções de curto, médio e longo prazos. “Em 60 anos de atividade no Brasil já passamos por outras crises e enfrentamos, no passado, baixas como essa atual nas commodities metálicas porém, mesmo assim, como temos responsabilidade social e ambiental, sempre entendemos a importância de se manter saudável e operacional todo processo que envolve a reciclagem. É fundamental que toda cadeia automotiva nacional tenha essa sensibilidade para não comprometermos os avanços ambientais que conquistamos nos últimos anos”.