São Paulo – Gente do governo diz que não, que são apenas impressões, que tudo não passa de intriga da oposição, que os indicadores já mostram a mudança, para melhor, na situação econômica do País, taxa de desemprego e PIB incluídos. Mas executivo do setor de veículos diz: “O governo acabou. Só pensa na reeleição”.
Isso significa que esse governo jamais começou.
A realidade da parcela do setor industrial do País conhecido como de transporte, que é o da produção de veículos e a sua distribuição, obedece à ordem geral de ir em frente no combate à covid-19 no meio de fog interminável pois, em algum instante, acredita-se, se dispersará por aí à custa de vacina salvadora.
E é nesse instante, do encontro da encrenca pandêmica com a bronca sistêmica, que chegam os relatos de executivos que vivem à beira diária de videoconferências com o pessoal em Brasília, DF, gente de governo que tem competências para sugerir, trocar ideias, muitas vezes tomar decisões. A síntese desses executivos da indústria de veículos, que incluem peças e máquinas, é simples: se formos adiante será por nós, às nossas próprias custas. E de reforma tributária, que seria agente suavizador do processo em algum lugar do caminho, nem sombras.
Um ponto comum das impressões desses executivos é a, aparente, absoluta ignorância dos interlocutores sobre os assuntos do setor, suas quantidade e qualidade. Outro palpite é o de que os brasilienses destinam seu tempo útil a tornar viável a reeleição do presidente em 2022: não se pensa noutra coisa.
Acreditam, as fontes, que os próximos serão dois anos perdidos, de crescimento insuficiente, da manutenção de tantas indefinições. O que devem esperar os operadores da Abeifa com relação ao seu pedido de redução do Imposto de Importação? O que devem esperar os representantes da indústria de veículos com relação à readequação do Rota 2030? E a greve dos transportadores, cujos bochichos já chegam às mesas dos interlocutores da Capital e às redações de jornais, revistas e de emissoras de rádio e TV em todo País?: janeiro será, mesmo, quente? Como será a convivência do complexo de transportes com a atual estrutura tributária? Terão, todos os fabricantes, de ficar de joelhos diante das vendas diretas?
E aquele conjunto peso-pesado, que tem à frente o presidente Pablo Di Si, da Volkswagen, e 150 usinas sob a sombra da Unica que pretendem o terceiro revival do Proalcool com a ajuda do governo?
Editorial de O Estado de S. Paulo de sábado, 5 de dezembro, chama a atenção para a marcha reduzida na indústria. Diz que a produção industrial perdeu impulso e que a sua sustentação, em 2021, é uma questão aberta. Ou seja: todo planejamento empresarial disponível, hoje, à base de supercomputadores e de inteligência artificial e de cérebros privilegiados, não consegue abanar a fumaça de dentro de sua bola de cristal para traçar cenário para o ano que vem a 26 dias do início desse mesmo ano que vem. Isso engloba planificação de compras e de vendas e da logística disso tudo, inclusive turnos de trabalho e aquilo tudo que diz respeito a isso.
O editorial cita pesquisa de otimismo feita com o pessoal do setor industrial, que teria crescido 1,1 ponto, para 62,9 – o que seria quase ótimo. Sim: quase ótimo se, afinal, se sustentasse. Diz o editorial que falta saber de onde virá demanda suficiente para apoiar o consumo e a produção industrial. E lembra que o contingente de desempregados, em setembro, foi avaliado em 13,5 milhões pelo IBGE. E lembra, igualmente, do crescimento do endividamento familiar. E lembra, também, que a anunciada evolução do PIB ainda é uma… gripinha.
São questões sem resposta a quase quatro semanas do ano novo. Trata-se de sombrio início de ano: pés metidos no pântano e cabeças imersas na neblina.
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