São Paulo – As fabricantes de veículos empregavam no Brasil 104,7 mil pessoas ao fim de fevereiro. Estima-se, no setor, que cada emprego gerado em uma montadora crie mais dez na cadeia. Ou seja, a indústria automotiva nacional é responsável por mais de 1 milhão de empregos.
Somados os outros integrantes da família não seria exagero dizer que ao menos 3 milhões de brasileiros estão de alguma forma ligados a produção nacional de veículos. São 3 milhões de pessoas expostas ao novo coronavírus, pois as linhas de montagem das montadoras e fornecedores seguem produzindo, a despeito de outros setores de comércio e serviço, não essenciais, que tiveram que fechar as portas para ajudar a conter a disseminação do vírus.
A indústria automotiva mostrou comprometimento com a sociedade há um ano, quando a pandemia explodiu no País. Montadoras colaboraram com a produção de máscaras, consertos de respiradores, construção de hospitais, ajudaram com sua expertise a salvar empresas produtoras de equipamentos médicos que estavam à beira da falência e colaboraram com as comunidades às quais estão inseridas. Deram o exemplo e merecem todos os elogios que receberam, e ainda recebem, por essa atitude.
Ao mesmo tempo investiram bastante para tornar suas fábricas ambientes seguros para a produção durante o período [antes classificado como agudo] da pandemia. Trabalhadores ocupam linhas com mais distanciamento, mais ônibus foram comprados para reduzir a lotação nos transportes fretados, escalas menores nos refeitórios, mais álcool gel, protocolos rígidos. E cumpridos.
Mas o período atual é de exceção. É preciso pensar na saúde do coletivo para tentar frear essa nova e mais perigosa variação do covid-19 que deixou em colapso o sistema de saúde brasileiro. A pergunta também é inevitável. Não seria a hora das montadoras interromperem a produção? Mais uma vez não seria uma grande colaboração para a sociedade deixar seus funcionários em casa, ajudando a reduzir a circulação de pessoas e, por consequência, do vírus?
É de conhecimento de todos que paralisação gera aumento de custo e montadoras são empresas capitalistas, que visam ao lucro. O governo, claro, precisa colaborar com medidas de auxílio a essas empresas na tentativa de manter os empregos, como no ano passado – e o próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, já sinalizou haver um plano desenhado, que deverá ser anunciado nos próximos dias.
Mesmo assim, a indústria automotiva poderia se antecipar e dar o exemplo. Por enquanto o custo está sendo medido em vidas. Já foram quase 300 mil perdidas.
Sindicatos se mexem. O Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, região berço da indústria automotiva nacional, entregou à Anfavea e ao governo do Estado de São Paulo documento que pede, dentre outras coisas, a paralisação da produção para que os trabalhadores fiquem em casa, mais seguros.
Vacina. Pedem também, no documento, que o setor privado colabore com a compra de vacinas. Somente elas, na visão do sindicato, ajudarão a acabar com a covid-19 e, assim, retomar a economia.
Anfavea. As discussões da Anfavea com o sindicato seguem enquanto esta coluna está sendo redigida. A associação sinalizou positivamente com relação à questão das vacinas, mas manteve sua posição na questão da parada das fábricas.
Decisão difícil. AutoData acompanha a indústria há quase trinta anos e conhece, e compreende, todas as dificuldades envolvidas na decisão de parar as linhas. Não é uma decisão fácil, tampouco simples de ser tomada. Diante de todo esse contexto, mantém a sua pergunta: não é hora de dar o exemplo?
Este texto foi publicado originalmente na Coluna AutoData, que é veiculada todas as sextas-feiras no Portal UOL. Para acessar o original clique aqui.