São Paulo — As notícias geradas pelo Brasil na segunda-feira, 11, não suscitaram comoção nem em Dearborn, sede da Ford, nem em Detroit, ali perto, a Capital do Automóvel. No fim da tarde as ações da companhia, listadas na bolsa de Nova York, ainda cresceram 3,3%. Isto significou que a gritaria, toda, ficou relegada aos limites daquele grande país bem ao Sul do rio Grande, ali do lado Leste do mapa.
Quem acompanha o segmento industrial dedicado à produção e venda de veículos, principalmente pelos olhos da cobertura dos fatos econômicos, sabe que deixamos de ser a bola da vez no ramo automotivo lá por 2013, 2014, um País que decidira levar o pessoal do ramo de veículos à galega há muito tempo para obter suas próprias vantagens. Olho gordo do capital especulativo financeiro, que deixou o industrial às próprias custas antes, mesmo, desses 2013, 2014. A indústria perdeu para a especulação e eis nossa decadência.
Alguém deve ter raciocinado que, se temos mercado, quem vem para cá que pague por ele, e não imaginou, ou ignorou, que nossas outras reentrâncias, nossas próprias formas de fazer, o jeitinho, obrigado, acabasse por juntar tal quantidade de empecilhos, conhecidos, hoje, genericamente como custo Brasil, que forçasse uma empresa como a Ford Motor Company a simplesmente encarar o custo de cair fora depois de 101 anos de casa. Juntou-se à Volkswagen nos anos 80 exatamente para não pagar uma fortuna à guisa de indenizações.
Custo Brasil é igual a legislações que encarecem, dificultosas, burocráticas, e de infraestrutura digna de quinto mundo, que arrancam da pessoa jurídica e da pessoa física a vigarice colonial para manter muito além da linha do razoável uma elite quase escravocrata no século 21. Isto é incrível.
Quem sabe nem tanto. O resultado de operar aqui tem estado abaixo daqueles 8% de lucro líquido ansiado pela companhia há um bocado de tempo, e não há nenhuma boa razão para acreditarmos que a gestão da Ford, ao longo desses anos, tenha sido menos cuidadosa do que o habitual. Pois Ford é companhia financeira, companhia de contadores e de administradores, e de advogados, com a sorte de dispor de alguns bons engenheiros e designers de vez em quando.
A companhia, digamos Dearborn, fez as contas e deve ter descoberto que ganharia mais sendo uma não produtora aqui, principalmente num instante em que veículos híbridos, veículos eletrificados e veículos autônomos estão no Top Three das paradas de sucesso.
Deixar de produzir faria parte, então, de uma Ford que nada tem a ver, do ponto de vista de produto, com aquela que conhecemos até outro dia. A decisão de deixar de produzir aqui, assim, não seria exatamente tática, regida por déficits acumulados, e sim estratégica.
Acredito, piamente, em duas alternativas: ou a América Latina e seus mercados não valem porra nenhuma para a Ford ao longo dos próximos 25 anos ou eles são, simplesmente, essenciais para a mesma Ford. O suficiente para que a companhia anunciasse, em 1º de dezembro, investimento de US$ 580 milhões na Argentina. Nas redes sociais o presidente Alberto agradeceu a companhia por ela acreditar na Argentina. E quarenta dias depois a companhia anunciou que não mais produziria aqui.
É claro que a região, em boas épocas de bons bofes, com governos progressistas e dedicados um pouco só ao bem estar social, venderia, fácil, 4, 5 milhões de unidades por ano.
Mas aqui, em época de Jair B, negócios podem não ter futuro. Mas este é só o cara que está no plantão: e a rapaziada que há anos ganha a vida para deixar isso acontecer?
Sobre o fim produtivo da Ford no Brasil, por exemplo, a Fiesp distribuiu nota protocolar chamando a atenção para o custo do País: “A Fiesp tem alertado sobre a necessidade de se implementar uma agenda que reduza o custo Brasil, melhore o ambiente de negócios e aumente a competitividade dos produtos brasileiros”.
Mas dizem isso há cinquenta anos!
Foto: Divulgação.