São Paulo – O surgimento da variante delta do novo coronavírus e o ritmo lento da vacinação em países emergentes, como o Brasil, podem representar um soluço na retomada da economia global, mas não alteram trajetória positiva de expressiva recuperação. Comércio e indústria já se ajustaram ao cenário ao longo da segunda onda da covid-19 e, conforme as restrições ao isolamento vão diminuindo, o setor de serviços se prepara para recuperar o tempo perdido. A análise é de Pedro Renault, economista do Itaú Unibanco, e foi feita durante o terceiro e último dia de palestras do Seminário Revisão das Perspectivas 2021, realizado de forma online pela AutoData Editora.
“O pior da pandemia e o pior da economia já ficaram para trás”, assinalou Renault, ao divulgar projeção do banco de alta de 5,8% do PIB brasileiro em 2021 – acima dos 3% esperados pelo mercado no início do ano e da queda projetada no ano passado, de 6,5%, que chegaria a 9% na visão do FMI. “Na segunda onda a economia caiu muito menos do que na primeira, e a economia caiu menos do que o isolamento social indicaria. O índice de mobilidade caiu mais porque as pessoas aprenderam a trabalhar remotamente, a vender e a comprar online, e a indústria não parou tanto na segunda onda como na primeira. Então a sensibilidade da economia ficou menor. E isso seria válido para uma eventual terceira onda, pois o risco econômico do impacto da covid fica menos preocupante.”
A partir do terceiro trimestre Renault indicou que é aguardada aceleração da economia, uma vez que, até outubro, há a expectativa de que toda a população adulta do País seja vacinada – hoje são 80 milhões de brasileiros, 40% do total – e, como consequência, se tenha uma reabertura mais completa. Será quando o setor de serviços, a exemplo de restaurantes, bares, salões de beleza, turismo e alguma parte de bens, como vestuário, que está relacionado à mobilidade, devem reagir e convergir aos demais segmentos da economia.
“A não ser que haja gargalo de oferta como na indústria automotiva, que gostaria de estar produzindo mais mas não consegue.”
O economista disse que o mercado esperava um primeiro trimestre de 2021 negativo por causa do fim do auxílio emergencial e o consequente vácuo deixado sobre o consumo, mas isso não aconteceu, segundo ele, em grande medida porque as famílias pouparam durante a crise, principalmente as de média e alta renda, que consumiram menos serviços e ficaram com folga de renda – direcionada, por exemplo, à compra de veículos: “No segundo trimestre, quando se esperava colapso devido à segunda onda, houve queda rápida e substituída em pouco tempo pela volta da economia. E, com o avanço da vacinação, o governo não precisa repetir o estado de calamidade”.
Conforme destacou Renault os preços das commodities em alta ajudam a exportação, geram mais investimento e empregos, apesar da expectativa de a taxa de desemprego encerrar o ano em 12%, mas, ao mesmo tempo, trazem mais desafios, porque há pressão de custo e problemas de escassez que afetam boa parte das indústrias automotivas, como o problema dos semicondutores:
“É uma retomada que, depois de um choque como o que tivemos, tem pontos de desorganização que geram gargalos, mas é algo natural. O foco das atenções vai saindo do coronavírus para uma pressão inflacionária, com pico no meio do ano”.
As projeções do Itaú indicam que o ápice do IPCA será atingido agora, aos 9%, mas em 2021 o índice deve arrefecer e encerrar em 6,1%. Com o IGP-M o movimento é o mesmo: em maio chegou a 37% e, em dezembro, deve desacelerar para 18,5%. A Selic, hoje em 4,25%, pode finalizar o ano em 6,5%. E o câmbio em R$ 4,75. Para 2022 é esperado crescimento menor do PIB, de 2%:
“Saímos da crise em formato V, com expressiva queda em 2020. No ano que vem saímos do V e a economia voltará a crescer a taxas mais normais. E a taxa normal no Brasil, com a velocidade de cruzeiro que conseguimos manter sem que o motor esquente demais, significa ter uma inflação acelerando por demanda. Para crescer acima disso precisamos aprovar reformas, como a tributária, que simplifique o imposto sobre o consumo, ou ter estímulo, como juros baixos”.
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