São Paulo – A proporção das vendas de veículos eletrificados, que totalizaram 27,8 mil emplacamentos de janeiro a agosto, sendo quase 80%, ou 22,1 mil, híbridos e os 20% restantes, ou 4,8 mil, puramente elétricos, de acordo com dados da Anfavea, deverá continuar por alguns pares de anos, com os híbridos ganhando mais destaque do que os movidos 100% a bateria.
Para o diretor de estratégia da Bright Consulting, Cássio Pagliarini, no médio prazo as soluções passam por hibridização, principalmente híbridos flex. Até 2030 em torno de 30% das vendas de veículos novos serão de eletrificados e, deste porcentual, apenas um sexto será puramente elétrico, ou 5% do total, estimou. Para efeito de comparação no acumulado de 2022 os eletrificados correspondem a 2,3% dos licenciamentos.
Um dos principais fatores que deverão levar a este caminho é o alto custo do veículo elétrico e da bateria que o move, assim como sua durabilidade. Para Pagliarini pagar duas vezes e meia o preço de um modelo similar a combustão compensa, atualmente, para quem roda bastante, caso de furgões e caminhões que realizam entregas no perímetro urbano, e para veículos que transportam pessoas, como ônibus e carros usados por motoristas de aplicativos.
“Não é que não seja uma solução correta, mas ela é cara. Se rodar bastante é possível compensar o investimento. Agora, um automóvel que percorra de 10 mil a 15 mil quilômetros por ano não consegue fazer valer o aporte.”
Isto mesmo com o valor da energia elétrica estando quatro vezes mais barata do que o combustível fóssil, apontou, diferença que deverá diminuir quando a guerra na Ucrânia chegar ao fim e o barril de petróleo, que há quatro meses estava no patamar de US$ 120 e que hoje está em US$ 90, retomar o padrão normal de US$ 60.
O maior problema, para o consultor da Bright, está nas questões que circundam o veículo de passageiro. Ele comparou o Renault Kwid a combustão, que custa a partir de R$ 65,7 mil, com o e-Kwid, elétrico, de R$ 146,9 mil, valor 2,3 vezes superior: “É mais do que o dobro. Se você não rodar muito não amortiza”.
Sem falar que a autonomia da bateria dos elétricos cai pela metade em torno de dez anos, ponderou: “Ou seja: a então autonomia de 280 quilômetros recua para 140 quilômetros em uma década. Não dá para ir de São Paulo a Campinas com certo nível de conforto, não se pode usar ar-condicionado e há a preocupação de encontrar local para recarga. E há o agravante de que em dez anos não se conseguirá substituir a bateria, pois só ela valerá três vezes o valor do carro usado”.
Daqui a vinte anos, para o especialista, haverá tecnologia que permitirá baixar o preço da bateria, o que não será motivado pelo lítio “até porque ele está subindo vertiginosamente tanto por causa de demanda como por especulação devido à guerra. Se essa tendência se mantiver será um inibidor enorme, pois o preço triplicará”.
Faltam estímulos para tornar o elétrico acessível? – Pagliarini rechaça a afirmação de que não existe incentivo fiscal para a aquisição de elétricos no País, o que seguraria o consumo do produto: “Como não tem? Há isenção fiscal de imposto de importação de 100%. Se você trouxer um BMW a combustão pagará 35% de imposto de importação. Se for um eletrificado desembolsará no máximo 4%. Se for só a bateria zero. Só aí há uma renúncia fiscal gigantesca”.
Quanto ao fato de o governo incentivar a compra de modelos a propulsão elétrica com ajuda em dinheiro, como ocorre na Europa, ele é enfático: “Discordo totalmente em dar dinheiro para o rico comprar um carro desses, dar US$ 7,5 mil para as pessoas adquirirem um veículo assim”.
O consultor propõe que, para que modelos movidos à bateria tenham maior adesão no Brasil, o primeiro passo está na harmonização de impostos: “Hoje temos veículo a combustão sendo cobrado por cilindrada e elétrico por eficiência energética. Precisamos colocar todos na mesma régua e dar algumas vantagens competitivas aos veículos mais limpos. É preciso haver reforma fiscal para simplificar e uniformizar”.
O segundo ponto é que o governo comece a medir emissão de CO2 ou cobrar dos fabricantes por essa emissão. Incluir na próxima etapa do Rota 2030, aguardada para 2027, a medição do poço à roda: “Hoje se mede do tanque à roda. Ou seja: o combustível já está no tanque, venha ele de insumos fósseis ou da cana-de-açúcar. E para transportá-lo ao posto geralmente se usa diesel. Só que um veículo abastecido 100% com etanol no Brasil gera menos CO2 que um elétrico rodando na Polônia, que tem 73% de sua matriz energética suja e dependente de combustível fóssil.”
O terceiro pilar está no fomento ao desenvolvimento intelectual e em investimento em P&D para encontrar soluções em vinte anos, a exemplo de células de combustível, ou reformadores, que são mecanismos que a partir do etanol produzem hidrogênio, usado na célula de combustível de alta eficiência.
O equilíbrio dos híbridos – Até que isso tudo seja colocado à mesa Pagliarini acredita que a melhor solução está nos híbridos, com melhor custo benefício e na pauta das principais montadoras do Brasil, a exemplo de Stellantis e Volkswagen, citou, e como a Toyota já vem fazendo há alguns anos.
“Haverá grande avanço de mild hybrids, que são híbridos moderados. O motor não movimenta o veículo 100% mas ele tem um super alternador que consegue absorver energia na hora em que o carro freia ou está em uma descida. Ao aproveitar essa energia que o veículo jogaria fora eleva sua eficiência energética. E se for um híbrido puro é ainda melhor.”
Para países como França e Noruega, apontou o especialista, veículos movidos a bateria compõem a melhor solução já disponível. Para Brasil, Índia e África do Sul, no entanto, existem outras opções, e o híbrido flex é uma delas.