São Paulo – O Brasil está na primeira posição dos planos de expansão para mercados emergentes da divisão de propulsão eletrificada da BAE Systems, empresa que produz trem-de-força híbrido e elétrico para caminhões e ônibus pesados. Steve Trichka, vice-presidente responsável pela direção geral da unidade, sediada nos Estados Unidos, esteve esta semana no País para fechar a primeira negociação de fornecimento com cliente baseado em Caxias do Sul, RS.
“A pedido do cliente nós ainda não podemos revelar seu nome. Neste primeiro momento forneceremos nosso sistema de propulsão para um protótipo de caminhão elétrico pesado, que deve entrar em testes de demonstração até o fim deste primeiro trimestre”, revelou Trichka. “Só estão faltando chegar os cabos de alta tensão para completar o projeto.”
Na região visitada pelo executivo sabe-se que está em curso o projeto da startup FNM de produzir caminhões elétricos nas instalações da Agrale, que por sua vez também produz chassis de ônibus, que até o momento são os maiores clientes dos sistemas eletrificados híbridos e elétricos da BAE Systems no mundo: a empresa já fornece seus módulos para cinco fabricantes de ônibus urbanos na América do Norte e outros três na Europa.
Trichka esclareceu que, embora neste momento o sistema fornecido seja para um protótipo de caminhão elétrico pesado, “nosso sistema é modular e o mesmo conjunto pode ser usado em qualquer veículo pesado, seja caminhões ou ônibus”.
É justamente no potencial de crescimento do mercado de ônibus elétricos no País que a BAE Systems está de olho, especialmente na cidade de São Paulo, que no ano passado estipulou a proibição da compra de veículos a diesel para a renovação da frota de transporte público urbano. Empresas da Capital paulista devem encomendar 1,1 mil ônibus elétricos nos próximos dois anos, 657 só em 2023, e a meta é eletrificar 20% da frota de 14 mil ônibus até 2024.
Diante de movimentos como este Trichka afirma que o interesse da BAE Systems em entrar no mercado brasileiro cresceu e superou Chile e Colômbia, que até o ano passado estavam à frente do Brasil nos planos de expansão das vendas na América Latina.
Custo alto
“Fiquei surpreso que aqui o interesse das empresas é ir direto para os elétricos, sem passar pelos híbridos, que seria uma solução mais barata. Nosso sistema híbrido que fornecemos aos ônibus de Nova York funciona a maior parte do tempo só com propulsão elétrica.”
Segundo Trichka o maior desafio a superar é o custo, pois os sistemas da BAE Systems são mais sofisticados e caros: “Este mercado é bastante difícil por causa dos custos. Um ônibus elétrico de US$ 500 mil dos Estados Unidos é uma vez e meia mais caro do que seu similar a diesel, enquanto no Brasil custa três vezes mais”.
Para superar essa proporção desfavorável Trichka pontuou que a BAE Systems está “constantemente trabalhando nas novas gerações de sistemas com novos materiais que no futuro reduzirão os custos”.
Localização depende de volumes
Ao menos por enquanto a intenção é importar dos Estados Unidos para o Brasil todo o sistema de propulsão elétrica, que inclui o pacote de baterias, motor, inversor e os módulos eletrônicos de gerenciamento – principal especialidade da BAE Systems.
As negociações com parceiros no País para nacionalizar parte da produção de componentes e montagem dos conjuntos, reveladas no ano passado a AutoData pelo diretor de desenvolvimento Ian Wilson, segundo Trichka “neste momento foram colocadas em suspenso, porque a localização dependerá dos volumes de produção”.
Devido aos problemas de falta de componentes eletrônicos vivenciados por toda a indústria, em 2021 e 2022, os planos da BAE Systems foram atrasados e só agora estão sendo retomados. Trichka observou que, por causa deste problema, no ano passado a empresa deixou de entregar cerca de um terço de seu volume regular de sistemas de propulsão, que antes da pandemia girava em torno de 2 mil unidades/ano e deve alcançar 1,8 mil em 2023.
“Chegamos a parar a produção e atrasar as entregas por falta de chips e capacitores que custam apenas US$ 2. Como nossos volumes são menores os fornecedores direcionaram os componentes para fabricantes maiores. Para tentar reduzir o impacto dobramos o número de pessoas no departamento de compras”, Trichka contou. “Mas o fluxo está melhorando: no ano passado tínhamos um problema de fornecimento por semana e agora temos um a cada três semanas.”
O executivo afirmou que no momento tem capacidade suficiente na fábrica de Endicott, no Estado de Nova York, para atender a todos os clientes atuais e novos no mundo – além do Brasil a BAE Systems também tem projetos com clientes na Índia, Colômbia e Chile.
“Nosso objetivo não são grandes volumes de 20 mil ou 30 mil unidades por ano. Queremos continuar especializados no mercado de ônibus e caminhões pesados, de maior porte, classes 7 e 8 [equivalentes no Brasil a veículos comerciais acima de 20 toneladas de PBT, peso bruto total].”
Trichka disse que devido a esta especialização em veículos pesados de grande porte não vê concorrência direta no Brasil de outros possíveis fornecedores, como é o caso, por exemplo, das empresas que participam do e-consórcio da Volkswagen Caminhões e Ônibus para produzir o e-Delivery: “São modelos mais leves do que os equipados com nossos sistemas.”
Da defesa ao transporte
A BAE Systems é sediada na Inglaterra, fruto da aquisição da British Aerospace pela Marconi Electronic Systems, em 1999, e seu principal negócio é o fornecimento de módulos eletrônicos para a indústria de equipamentos militares, como aeronaves de transporte e combate, veículos blindados e navios de patrulha. No Brasil a empresa mantém um escritório em Brasília, DF, para atender as Forças Armadas.
Há cerca de 25 anos a BAE Systems começou a aproveitar sua expertise em módulos eletrônicos de gerenciamento de energia para projetar e fabricar sistemas de propulsão elétrica para veículos pesados. Desde então a divisão já forneceu quase 16 mil conjuntos de acionamento elétrico para diversos países, principalmente na América do Norte e Europa. Somente na frota de transporte urbano da cidade de Nova York já rodam 1,7 mil ônibus equipados com o powertrain híbrido da BAE Systems.
A BAE Systems produz sistema híbridos, 100% elétricos alimentados por baterias e também oferece propulsão elétrica gerada por células de combustível a hidrogênio, consideradas mais eficientes para eletrificar veículos pesados para transporte de longo curso. Para acelerar a evolução desta tecnologia recentemente foi firmada uma parceria com a Plug, empresa que produz os módulos de células de combustível e também fornece o próprio hidrogênio, produzido a partir de eletrólise com fontes de energia renovável.