Após cinco anos de desenvolvimento a encarroçadora brasileira coloca dez veículos a bateria para rodar em capitais do País
São Paulo – De olho no esperado aumento de demanda por ônibus urbanos elétricos no País a Marcopolo começa a vender o seu Attivi, primeiro veículo completo com chassi e carroceria produzidos pela encarroçadora na fábrica de Ana Rech, em Caxias do Sul, RS. Após cinco anos de desenvolvimento do projeto a empresa já programou a produção de 130 veículos a bateria até o fim deste ano, para mercado doméstico e exportações, sendo que dez deles entrarão em testes de demonstração nas frotas de transporte urbano de algumas capitais do País, a serem anunciadas nas próximas semanas.
Segundo Ricardo Portolan, diretor de marketing e operações comerciais para o mercado interno, a Marcopolo está preparada para o aumento da demanda: “Como principal fabricante brasileira de ônibus estamos prontos para suprir as necessidades de transporte coletivo eletrificado de centros urbanos. Foi construída uma nova linha na fábrica exclusiva para fazer os chassis elétricos próprios, com capacidade para até 1 mil unidades/ano, quatro por dia, mas podemos expandir se houver necessidade”.
Os chassis elétricos montados seguem para a linha de montagem de carrocerias que, de acordo com o diretor, pode produzir 3 mil ônibus elétricos por ano – 1 mil Attivi e outros 2 mil sobre chassis de outros fabricantes, como a chinesa BYD, que desde 2015 monta modelos elétricos no País, e mais empresas que começam este ano a produzir urbanos elétricos, como é o caso da Mercedes-Benz com o eO500U e da Volkswagen Caminhões e Ônibus com o recém-apresentado protótipo e-Volksbus.
A Marcopolo produz no Brasil cerca de 12 mil carrocerias de ônibus por ano e já montou 370 unidades sobre chassis elétricos de parceiros, principalmente da BYD, que estão em circulação na Argentina, Austrália, Índia e também no Brasil, em cidades como Bauru, Campinas, São José dos Campos, Santo André e São Paulo, SP, Belém, PA, Brasília, DF, Vitória, ES, Fortaleza, CE, Maringá, PR, e Volta Redonda, RJ.
Mercado para todos com nacionalização
“Com o avanço da eletrificação adotamos os dois modelos de negócio: desenvolvemos aqui no Brasil, com nossa engenharia, o nosso primeiro veículo completo, mas continuamos a montar carrocerias de ônibus elétricos sobre chassis de parceiros”, esclareceu Portolan. “Neste processo escrevemos um novo capítulo da história, de mais de setenta anos, não só da Marcopolo mas da indústria nacional, que agora se materializa com o Attivi.”
Portolan avaliou que ao produzir o veículo completo a Marcopolo não deve enfrentar problemas de conflitos de interesses com os principais fabricantes de chassis do País, que também são seus fornecedores para encarroçamento: “Considerando que só São Paulo planeja incorporar 2,6 mil ônibus elétricos à frota municipal até o fim de 2024, e outras cidades, como São José dos Campos, Goiânia [GO] e Curitiba [PR], também já têm planos de comprar no ano que vem, em torno de 4 mil modelos elétricos devem ser vendidos e então há mercado suficiente para todos”.
E para fazer frente à concorrência com os produtos importados da China, que também já estão chegando ao País, Portolan entende que a Marcopolo leva vantagem por ter desenvolvido um veículo mais robusto, testado para durar dezesseis anos – embora a garantia das baterias seja de oito anos – e projetado de acordo com as necessidades específicas de grande parte das cidades brasileiras, nas quais existem ruas esburacadas e enchentes constantes.
“Enquanto ônibus a diesel têm vida útil de cerca de dez anos projetamos o nosso elétrico para dezesseis anos porque o preço de aquisição é de três a quatro vezes maior, na comparação com um modelo de porte equivalente com motor a combustão. O veículo, então, precisa durar mais para pagar o investimento”, disse Portolan. “Por isto tivemos uma postura mais conservadora antes de lançar o produto, para desenvolver o melhor veículo possível, de nível global e adaptado às condições do Brasil. É algo que os produtos importados não oferecem.”
Exatamente por causa destas condições específicas a Marcopolo optou por adotar uma configuração de chassi que, em vez dos motores elétricos acoplados às rodas, usa um propulsor central ligado às rodas por eixo cardan, sem caixa de câmbio, “e assim conseguimos instalar o motor em posição mais elevada, o que evita danos por choques em buracos ou vias alagadas”, contou o executivo.
Outra vantagem é que o Attivi tem grau de localização de componentes, em peso e valor, suficientes para aprovar financiamento pelo BNDES/Finame, com juros mais baixos e carência alongada para o primeiro pagamento, tanto na modalidade tradicional da linha de crédito – também aplicada a caminhões e ônibus a diesel – como também no Finame Baixo Carbono, para veículos com baixas emissões de CO2, que o BNDES criou no ano passado. Segundo a Marcopolo seu ônibus elétrico tem índices de nacionalização de 58% para o chassi e de 96% para a carroceria.
Para construir o powertrain elétrico do Attivi a Marcopolo utiliza a mesma cadeia de fornecedores, com componentes similares, criada pela VWCO para produzir o caminhão elétrico e-Delivery, em produção comercial desde 2021. Assim como acontece com o e-Delivery as células para as baterias de lítio são importadas da chinesa CATL e montadas em sistemas completos, incluindo o gerenciamento eletrônico, pela brasileira Moura em Belo Jardim, PE, e o motor elétrico central de 395 kW, ou cerca de 530 cv, é fornecido pela também brasileira WEG, de Jaraguá do Sul, SC.
Além do Brasil Portolan indicou que os principais mercados de exportação para o Attivi devem ser Chile, Colômbia, Argentina e México – a Marcopolo têm fábricas de carrocerias nos três últimos países. Atualmente exporta cerca de 20% de sua produção nacional de ônibus encarroçados.
Projeto brasileiro
“Quando começamos a falar em fazer veículos elétricos completos, ainda em 2018, precisamos nos reinventar, porque temos experiência de mais de setenta anos produzindo carrocerias de ônibus, mas nunca tínhamos projetado ou fabricados os chassis”, lembra Maurício Gazzi, chefe de desenvolvimento de carrocerias e validações da Marcopolo.
O desenvolvimento começou há cinco anos com modelagens virtuais, dentro de computadores, até a montagem dos primeiros protótipos que foram encaminhados para testes em área locada do CTR, o campo de provas da Randoncorp na vizinha Farroupilha, RS. A Marcopolo contabiliza que foram dedicadas 7 mil horas de engenharia ao projeto do Attivi.
Gazzi contou que, para garantir a confiabilidade do produto seis protótipos – três para validações e três para ensaios destrutivos – foram submetidos a 2 mil horas de testes de desempenho e 8 mil horas de durabilidade acelerada, rodando nas pistas do CTR 24 horas por dia, sete dias por semana, somando horas 42 mil quilômetros rodados: “Estressamos os veículos ao máximo, até mesmo quando estavam parados por seis horas para recarregamento das baterias nós aproveitávamos para realizar testes estáticos, como ciclos de fechamento e abertura de portas”.
O resultado, garantiu o engenheiro, foi um veículo desenvolvido para durar dezesseis anos e rodar 1,3 milhão de quilômetros: “Agora colocaremos os trinta primeiros Attivi produzidos para rodar por uma semana no campo de provas antes de entregar aos clientes e queremos monitorar mais 100 mil quilômetros de operações na prática, nas ruas”.
Segundo a Marcopolo o Attivi foi projetado com pacote de baterias de 396 kWh que confere autonomia de 250 quilômetros antes de precisar de recarregamento, que é feito em três a quatro horas em recarregadores de 130 kwh, instalados na garagem do frotista. A fabricante já homologou seis fornecedores de recarregadores, todos com operação no Brasil.
Com motor de 395 Kw, perto de 530 cv, e torque máximo de 2,8 mil Nm, o Attivi é um ônibus urbano do tipo padron, com 13 metros de comprimento e 2,5 metros de largura, e capacidade para oitenta a noventa passageiros. O veículo é equipado com ar-condicionado e tomadas USB para carregamento de celulares.
Ao contrário das carrocerias que monta sob encomenda a Marcopolo oferecerá seu ônibus elétrico em configuração para pronta-entrega.
“Com o Attivi e nossas carrocerias ajudamos a indústria nacional a ter plena capacidade de atender a demanda por ônibus elétricos que surge agora no País”, resumiu Portolan.