São Paulo – O crescente movimento de fabricantes chinesas no mercado brasileiro deverá ser beneficiado com uma nova rota marítima que ligará a China ao Brasil, e que reduz o tempo médio de transporte pela metade, de sessenta para trinta dias. Batizada de Serviço Santana, operada pela MSC em parceria com a APM Terminals apelidada de Dourada, configura conexão inédita do Nordeste, por meio do Porto de Pecém, no Ceará, Suape, em Pernambuco, e Salvador, BA, e a Ásia, por Xangai, Ningbo e Qingdao.
O navio sai da China com destino à Coreia do Sul, Panamá, República Dominicana, Pecém, Suape, Salvador, Santos, Índia e Singapura, retornando para a China.
O setor automotivo deverá ser um dos mais beneficiados por causa do intenso comércio exterior dos dois países. Dados do Sindipeças mostram que de janeiro a março a China manteve-se como a principal origem das importações brasileiras, com participação de 20% no total. As aquisições somaram US$ 1,1 bilhão, refletindo aumento expressivo de 30,4% com relação ao mesmo período de 2024, o que contribuiu para a ampliação do déficit comercial.
Na outra mão a China ocupa a sétima posição dos países que mais compram autopeças brasileiras. Foram US$ 46,6 milhões, e ainda assim o volume quase dobrou em comparação ao primeiro trimestre do ano passado, com avanço de 87%.
A Anfavea divulgou em seu último balanço que de janeiro a abril ingressaram no País 105,1 mil veículos importados, 25 mil unidades a mais do que no primeiro quadrimestre de 2024. Embora a maior parte seja da Argentina, com 68,7 mil veículos, volume 21,5% maior que no ano passado, a segunda maior origem é a China, com 44,1 mil unidades, alta de 28%.
E foi este crescimento que impulsionou o mercado brasileiro de veículos nos quatro meses iniciais de 2025, que apresentou avanço de 3,4%, com 760 mil unidades. Enquanto os emplacamentos de unidades produzidas localmente avançaram 0,2% os dos que vieram de outros países expandiram 18,7%.
Conforme Augusto Fernandes, CEO da JM Negócios Internacionais, despachante aduaneio, a nova linha marítima tende a gerar maior agilidade logística, previsibilidade nos prazos e uma série de ganhos operacionais, o que deverá baratear custos operacionais, reduzir estoques e tornar o just-in-time mais eficiente para montadoras e empresas de autopeças.
“O setor automotivo depende de previsibilidade logística e de uma cadeia de suprimentos ágil. Esta nova rota abre novo horizonte para fábricas instaladas no Brasil, sobretudo aquelas que hoje enfrentam gargalos logísticos nos portos do Sudeste.”
Fernandes prefere não arriscar um porcentual de crescimento das importações por entender que, como a operação está em estágio inicial, qualquer número divulgado agora seria especulativo, embora acredite que a expectativa é “bastante positiva”. E é fato que marcas chinesas como BYD, GWM, Omoda Jaecoo, Neta, Zeekr, Jac, GAC e Leapmotor, dentre outras que ainda estudam entrar no País, poderão se beneficiar.
Com a crescente demanda por veículos elétricos, híbridos e componentes tecnológicos, grande parte deles fabricados na Ásia, o especialista entende que a novidade também impulsionará a transição energética do setor automotivo no Brasil: “A perspectiva é que, nos próximos anos, o volume de peças, componentes eletrônicos e até veículos semi-desmontados importados pela nova rota aumente consideravelmente, estimulando novos investimentos, parcerias comerciais e geração de empregos”.
Ceará vem atraindo recursos
No cenário regional o Ceará ganha relevância como hub logístico e investimentos deverão ser dedicados pela indústria automotiva ao Nordeste, aproximando fabricantes de canal mais rápido e direto com fornecedores asiáticos, avaliou o CEO, ao citar que o Estado já possui infraestrutura industrial que pode ser beneficiada, como o próprio Complexo Industrial e Portuário do Pecém, que abriga zonas industriais e recebe incentivos para atração de novos empreendimentos.
Os custos logísticos atraíram a Comexport, que anunciou a injeção de R$ 400 milhões para a produção de veículos no Ceará. O objetivo é tornar o Pace, Polo Automotivo do Ceará, no primeiro hub automotivo multimarcas do Brasil. O vice-presidente da empresa afirmou, sem pormenores, que no segundo semestre mais uma marca chinesa deverá iniciar produção na antiga fábrica da Troller, em Horizonte e que, no segundo semestre de 2026, outra montadora também passará a fabricar no Estado.
“A indústria automotiva movimenta cargas complexas, que exigem expertise técnica e cumprimento rigoroso das normas. Estar próximo a um porto com rota direta para a China, maior exportador mundial de autopeças, é um ativo logístico importantíssimo para qualquer polo automotivo.”
Na análise de Jackson Campos, especialista em comércio exterior e diretor de relações institucionais da AGL Cargo, que realiza logística internacional, apesar de ser uma rota nova e beneficiar as regiões de Pecém e Suape, PE ela não deve ser tão influente em outros portos. “A meta desta rota é reduzir o trânsito de sessenta para trinta dias, mas já existem outras que fazem neste tempo. Por exemplo, a rota entre Santos e Shenzhen demora 29 dias, então não haverá um impacto muito grande neste quesito.”