Cajamar, SP – Um ano e três meses após anunciar que não manteria mais nenhuma linha de produção aqui, a Ford busca se manter em evidência e, se possível, na liderança, dos segmentos nos quais decidiu continuar atuando. Rogelio Golfarb, vice-presidente para assuntos governamentais para a América do Sul, afirmou que o foco não é mais volume de vendas, o que acontecia com Ka e EcoSport, nem market share, que nos últimos anos girava em torno de 8% e, hoje, não chega a 2%.
Hoje a Ford opera com enxuto, mas robusto portfólio de produtos – inclusive nos preços, por serem dedicados a um público de maior poder aquisitivo – no mercado brasileiro. São eles Ranger, Maverick, Bronco, Territory, Mustang e Transit.
Sobre a intenção de engordar essa lista Golfarb disse que a ideia é trazer mais modelos, mas ainda sem previsão de quantos ou se ainda este ano: “Nosso objetivo é ser relevantes nos segmentos dos quais decidirmos participar. Exemplo extremo é a liderança de mercado que temos em carros esportivos com o Mustang. Tem volume pequeno, mas dentro do segmento é líder”.
Um desses segmentos é o de veículos comerciais, que ganhou força conforme a covid-19 se alastrava: “A pandemia acelerou cem vezes o processo de digitalização da sociedade. A operação de uma compra começa com um aplicativo no seu celular e termina com uma van que deixará o produto na sua casa”.
E, segundo ele, trata-se de caminho sem volta, pois as inovações tecnológicas estão avançando cada vez mais e toda a infraestrutura de last mile, a última milha, na tradução do inglês, de entrega, também cresceu globalmente. Tanto que em outubro a Ford trouxe, após hiato de sete anos, a Transit Minibus e na segunda-feira, 18, lançou a versão Furgão, que apostam na conectividade embarcada de fábrica como diferencial.
Dados da Fenabrave mostram que de janeiro a março a fabricante estadunidense acumulou a venda de 3 mil 101 veículos comerciais, com 4,19% desse mercado, na sexta posição do ranking. Destaque para a Ranger, na sexta colocação, com 3 mil 10 unidades. A recém-lançada Maverick ocupa a vigésima-sexta posição com 70 emplacamentos em um mês e meio de vendas. E a Transit a trigésima-quinta, com 11.
Vantagem da aposta — Ao centrar fogo na área de utilitários e na de modelos mais exclusivos o plano da Ford se descola um pouco da realidade da economia brasileira. Golfarb reconhece que a persistente crise dos semicondutores e particularidades locais, como inflação em alta, taxa média de juros para financiamento de veículos aos 27% ao ano e maior seletividade na oferta de crédito devido ao aumento do endividamento, atrapalham as vendas do setor automotivo, mas lembra que o cenário afeta mais modelos de valor mais baixo.
“Temos de entender que quando apostamos em produtos que estão mais ligados ao agronegócio, segmento que tem mais poder aquisitivo porque está trabalhando acima da média do PIB, e desempenho melhor do que outros setores, o impacto não é tão grande e, consequentemente, o segmento de picapes não é tão afetado.”
Isso inclui a Ranger, atualmente carro-chefe Ford no Brasil, e a Maverick, que esgotou primeiro lote de vendas de trezentas unidades em 24 horas. Com relação ao fato de os produtos serem importados e, portanto, afetados pela cotação do dólar, o executivo afirmou que para o cliente nada muda porque não falta peça:
“Quem comprou veículo produzido aqui ou importado nosso tem peças disponíveis. Não tem problema de pós-venda, esse é o nosso trabalho. A rede diminuiu, mas ela está bem localizada, bem estruturada, nas regiões onde esses produtos têm mercado, faz parte do plano de de reestruturação da rede. A ideia é colocar onde há volume para que esses distribuidores também tenham os retornos para que se tenha atendimento adequado.”
Em janeiro de 2021, quando anunciou que encerraria a produção no Brasil, a Ford possuía rede com 280 revendedores, volume que diminuiu mais do que à metade e recuou a pouco mais de cem, número que a montadora não crava.
Quanto à Troller, última planta do grupo a parar de produzir, no fim do ano passado, Golfarb afirmou que há interessados na compra das instalações, “mas nada que possamos anunciar por ora, como relevante: há muitas conversas. Horizonte, Camaçari, Taubaté. Esse patrimônio gera o interesse de muita gente, mas nada que tenha amadurecido a ponto de provocar algum tipo de comunicado”.
Quanto às projeções da companhia para este ano disse preferir esperar um pouco mais para entender como será a distribuição e a disponibilidade de componentes eletrônicos no mundo, o que foi agravado pela guerra na Ucrânia.