JAC já tem dez modelos elétricos à venda no Brasil e deve lançar mais três
São Paulo – Com sua empresa em recuperação judicial, e com dívida bilionária, há três anos Sérgio Habib fez uma aposta arriscada: converter para modelos elétricos quase toda a linha da JAC à venda no Brasil, da qual ele é o importador oficial desde 2010. Na época, em 2019, o mercado brasileiro de BEVs, battery electric vehicles, era ainda mais insignificante do que hoje, nem alcançava 0,1% das vendas totais, contra o recorde deste ano, ainda inexpressivo, de 0,4%. Habib enxerga à frente nada muito melhor do que isso, no máximo 0,5%, mas conseguiu tornar viável seu negócio dentro de nichos, diz que o seu Grupo SHC está recuperado e que aumentará ainda mais o portfólio de elétricos.
Desde 2019 a JAC vendeu 2,5 mil veículos elétricos no Brasil e este ano deverá ser o melhor, com 2,5 mil unidades, cerca de 1 mil caminhões. A marca chinesa tem a maior linha de veículos elétricos à venda aqui. Após o lançamento, esta semana, do furgão E-JV 5.5 o portfólio soma dez BEVs, sendo quatro automóveis, cinco comerciais leves e um caminhão leve com duas configurações, de 7,5 ou 8,5 toneladas de PBT, peso bruto total.
Cerca de 90% do faturamento do Grupo SHC vem das vendas do portfólio de BEVs, 50% dos modelos comerciais, exatamente no qual Habib avalia que os elétricos têm chances de crescer no Brasil. Tanto que ele já planeja mais três lançamentos de utilitários elétricos que serão apresentados na próxima Fenatran, de 7 a 11 de novembro no São Paulo Expo.
Apesar de confiar no crescimento das vendas de seus comerciais elétricos este ano Habib pondera que existem ventos contrários, como as taxas de juros muito altas que têm feito os frotistas adiarem as compras, à espera de melhores condições de financiamento. Outra ameaça no horizonte é uma possível retomada do imposto de importação, hoje zerado para BEVs. Se isso acontecer os preços aumentarão e o mercado diminuirá.
Sem dinheiro para elétricos – “O Brasil é um país de renda média baixa, e não há como aumentar a venda de veículos caros como são os elétricos, nem se deve conceder incentivos porque existem prioridades como apoiar a população pobre. Este mercado não deve passar de 0,5% das vendas.”
O empresário aponta que em 100% dos países onde elétricos têm mais de 1% do mercado o governo concede generosos incentivos. Ele também mostra que a venda de BEVs está emparelhada à combinação de incentivos, políticas públicas e renda.
Nos Estados Unidos de renda per capita de US$ 66 mil por ano a penetração dos elétricos é de 4,7%, mas existem grandes variações de acordo com a política de cada Estado. Na Califórnia com incentivos de US$ 6 mil os BEVs dominam 12% das vendas, enquanto no petrolífero Texas o índice cai a 0,1%. Na China políticas obrigatórias de eletrificação catapultaram os BEVs para 20% dos emplacamentos.
Nos três países mais ricos da Europa, Alemanha, França e Reino Unido, com renda per capita de US$ 45 mil por ano e generosos incentivos, os elétricos já representam 13% destes mercados. Na Itália, onde a renda média é de US$ 31 mil, o porcentual dos BEVs cai para 4%. Na Polônia o valor desce para US$ 15 mil e os elétricos têm 1% das vendas. No Brasil a renda atual é de US$ 9 mil, compatível portanto com o mercado de 0,4%.
“Nesse cenário de baixa renda o único segmento que tem viabilidade para crescer no Brasil é o de veículos comerciais elétricos para entregas urbanas, porque a operação permite, têm trajetos curtos dentro da capacidade das baterias, não rodam muito mais do que 100 quilômetros por dia e podem ser recarregados à noite.”
Sérgio Habib
Ainda assim Habib calcula que um veículo comercial leve elétrico precisa rodar, no mínimo, 180 quilômetros por dia para que a economia com combustível comece a compensar o preço mais alto de aquisição, pelo menos o dobro de um similar a diesel: “A maioria dos clientes [transportadores] não têm viabilidade econômica com os elétricos, mas estão comprando principalmente para atender metas de redução de emissões de empresas [embarcadoras]”.
Mais do que qualquer motivador econômico é a agenda ESG, sigla em inglês que significa governança socioambiental e corporativa, que está sustentando as vendas de elétricos na maior parte do mundo. As compras são feitas mesmo sem viabilidade econômica, somente para atingir metas. Habib cita o exemplo do BlackRock, maior fundo de participação em empresas do mundo, com US$ 6 trilhões em ativos, que exige políticas ESG ativas de todas as corporações sob seu guarda-chuva sob risco de retirar seus recursos e cortar cabeças de CEOs.
Cabeça de formiga – Guardadas as devidas proporções é nesta onda ESG que Habib e seus JAC elétricos estão surfando no Brasil, apesar de o empresário reconhecer ser um mercado limitado à insignificância: “O Brasil não precisa de elétricos nem deve incentivá-los pois tem aqui o etanol, uma matriz energética limpa e é exportador de petróleo. Esse mercado não decolará aqui, mas prefiro ser cabeça de formiga do que rabo de elefante”.
Com a figuração de linguagem Habib justifica sua aposta nos elétricos: quer ser um jogador vencedor de um segmento pequeno em vez de perdedor em um grande mercado.