Nas últimas semanas muito se especulou sobre as medidas que o governo federal anunciou nesta quinta-feira, 25, de redução de impostos para tentar baixar os preços dos carros no País, dentre outras formas de incentivar o setor industrial. Mas a tão falada volta do carro popular não aconteceu, como muitos apostaram todas suas fichas.
É preciso compreender que especulação muitas vezes não contempla uma análise mais profunda e especializada do que se está especulando. Por exemplo: o projeto de produção de um novo veículo, ou mesmo a sua adaptação ou reestilização, é algo que demora um tempo. Alguns anos. E muita negociação. Não é igual a pastel de feira, que sai quentinho em alguns minutos.
Como nós em AutoData fomos os primeiros a ouvir de líderes do setor automotivo, em março, que o governo federal trabalharia em algumas medidas para fomentar as vendas, sabíamos que toda essa especulação que tomou conta do noticiário nos últimos dias não daria em nada. Quase nada.
Segundo promete o governo a desoneração proposta do PIS, Cofins e IPI aplicados sobre carros de até R$ 120 mil trará descontos nos preços de 1,5% a 10,96%, sendo que o porcentual máximo será aplicado somente aos modelos mais baratos, mais eficientes e com maior conteúdo de componentes nacionais. A medida vai ajudar momentaneamente alguns fabricantes que estão preocupados com a ociosidade das suas linhas de montagem. Essa preocupação foi levada ao governo e poderia, após paralisações, layoffs e quetais, resultar em demissões. Tudo que o governo não deseja.
Mesmo assim o remendo não deverá suturar completamente a ferida da indústria automotiva nacional. O impacto das medidas anunciadas será de, no máximo, 135 mil unidades a mais no mercado de novos este ano. Considerando que ainda serão quinze dias até o Ministério da Fazenda avaliar o impacto da redução dos tributos e o mercado ficará paralisado nesse período, talvez o resultado em 2023 seja inferior ao projetado por especialista no setor automotivo consultado por AutoData.
Vale lembrar que essas medidas são de curto prazo. Podem avançar para 2024, com um impacto também calculado pelo especialista, que preferiu não revelar sua consultoria, em 200 mil, 250 mil unidades ou 10% do mercado de novos.
Enquanto isso o consumidor brasileiro continuará frequentando o mercado de usados, que apresenta bons resultados de vendas. Para a indústria de autopeças e componentes o segmento de reposição será o melhor negócio em 2023, justamente por causa da impossibilidade do consumidor ir à concessionária e adquirir um zero quilômetro. A manutenção preventiva cabe no bolso. O carro novo, não.
Desta forma a indústria brasileira deverá continuar produzindo veículos para um público com maior poder aquisitivo, que manterá sua intenção de compra. Essa parcela da população justifica o atual tamanho do mercado de novos, em torno de 2 milhões de unidades ano.
Para fazer alguma diferença outras medidas de impacto mais profundo deverão ser estudadas e apresentadas em um futuro não tão distante. Talvez um programa de renovação da frota, que contribua para retirar os veículos mais velhos de circulação, impulsionando o mercado de novos e também o de seminovos.
A reforma tributária, que poderá diminuir o impacto do custo Brasil nas exportações. Porém também será necessário um trabalho mais árduo das próprias montadoras para poder vender com mais entusiasmo o carro nacional nos mercados da região. Ampliar a lista de clientes no Exterior, como a Índia e países do continente africano, pode ser plano para ocupar melhor a capacidade instalada no Brasil.
Não será um carro popular, feito como o pastelzinho quente da feira, que resolverá questões tão complexas como o poder de compra de um País com mais de 200 milhões de habitantes