Vanessa Castanho, vice-presidente da Citroen para América do Sul, e Priscilla Cortezze, nova chefe global de comunicação corporativa do Grupo VW, compartilham suas experiências
São Paulo – Primeira mulher a dirigir a operação da Citroën na América do Sul, Vanessa Castanho tem praticado o pioneirismo em sua trajetória profissional iniciada há 25 anos, quando ingressou como estagiária de administração de empresas na Renault. Nesse tempo ela vem colecionando títulos de primeira ao quebrar barreiras em ambiente majoritariamente masculino, ao ter se tornado a primeira gerente regional do mercado automobilístico brasileiro, posteriormente primeira diretora de vendas do segmento no País e, agora, a primeira mulher a conduzir uma marca na região.
Assim que assumiu a vice-presidência da Citroën para a América do Sul, em junho, ela constituiu nova equipe composta 50% por mulheres: “Mais do que palavras temos de começar por exemplos. E foi uma excelente decisão, porque a diversidade não está só em gênero, mas em nacionalidades e gerações. Isso traz muita riqueza nas discussões e para as tomadas de decisões”.
E essa quebra de barreiras, avalia Castanho, se deve, principalmente, ao olhar sobre o profissional e não sobre o gênero. Ela relatou que possuía as competências necessárias para a posição e os líderes que tomaram essa decisão não se deixaram influenciar por qualquer viés inconsciente que pudesse existir e certamente o fizeram amparados em histórico de resultados anteriores e com números de eficiência de um ambiente mais diverso.
A executiva de 49 anos acredita que o preconceito ainda é muito presente, até porque se estivesse erradicado não se falaria mais tanto sobre o tema: “Eu sonho com o dia em que a gente vai parar de falar sobre isso”.
Por isto mulheres que estão traçando sua jornada, na avaliação de Castanho, devem se posicionar. Deixar sempre muito claro qual é a sua ambição e onde quer chegar: “O óbvio não é óbvio. É preciso se fazer perguntas poderosas como ‘o que falta para eu estar nessa posição e qual o caminho que tenho de traçar para atingi-la?’”.
Ela afirmou, também, que é preciso buscar apoio dos líderes, em sua maioria homens, além de demonstrar dedicação e conseguir resultados, como para qualquer outro profissional:
“A mulher ainda é vista como um investimento de risco. Muitas vezes em promoções, e em situações em que o anterior foi homem, perguntam: será que ela tem estrutura emocional? Por isso é essencial ter autoconhecimento e sempre se posicionar, mas de forma tranquila e serena. O que a agressividade, muitas vezes, é pressentida para o homem como força e poder para a mulher pode ser entendida como desequilíbrio emocional. Então é preciso encontrar o próprio caminho”.
Vanessa Castanho
É por isto que outro desafio se faz presente na vida corporativa das mulheres, o de equilibrar as vidas pessoal e profissional. Para ela é essencial entender que esse equilíbrio depende apenas da mulher: “Só eu posso definir como lidar com ele e quais concessões farei ou não”.
Vanessa Castanho, mãe de um adolescente de 17 anos, contou que busca recarregar baterias com meditação, caminhadas com seu cachorro e tentando preservar momentos, como fim de semana e as noites em família.
Ela lembrou que para contribuir com esse avanço feminino no meio corporativo, além de se inspirar com suas conquistas, ela pratica diariamente, em sinergia com o grupo de mulheres da Stellantis, o compromisso de criar e praticar políticas claras de equidade de gênero no curto, médio e longo prazos, ambiente mais favorável à presença das mulheres e respeito às mulheres também na equidade salarial e com mentorias.
Quanto a seu legado: ela adotou plano criado de forma colaborativa com stakeholders para quadruplicar o market share da companhia até 2024, o Citroën 4 all, que passa pelo lançamento de um produto a cada ano – sendo aguardado para este ano o C3 – e pelo reposicionamento da marca:
“Queremos uma Citroën mais próxima e acessível, com produtos que atendam à expectativa dos brasileiros e dos clientes dos mercados sul-americanos. Para trazer toda a inovação que vemos no mercado, mas de uma forma tangível”.
O market share da Citroën, hoje, no Brasil, é 1,8%.
Pioneirismo também na comunicação — Inovação também é palavra de ordem para a diretora de assuntos corporativos e relações com a imprensa da Volkswagen na América Latina, Priscilla Cortezze, a primeira profissional brasileira – sejam homens ou mulheres – a desempenhar papel de liderança global na área. Ela assumirá o novo posto a partir de maio.
Cortezze atribui ao trabalho de transformação da marca na região, realizado nos últimos anos quatro anos, o convite para assumir a chefia de comunicação do grupo em Wolfsburg, a sede na Alemanha. Segundo ela a companhia tornou-se mais digital, mas ao mesmo tempo mais humana e próxima dos stakeholders, com linguagem acessível e transparente.
Ela, que não falava o idioma local, está se preparando, ainda que seja para arriscar algumas palavras ao desembarcar, para ir ao supermercado e na hora de se apresentar ao novo desafio: “Toda a família está fazendo aulas de alemão”, disse, referindo-se a ela, ao marido e às filhas, de 19 e 12 anos.
Ela trabalhará diretamente com Herbert Diess, CEO do grupo, que representa dez marcas: “O grupo quer globalmente uma comunicação mais internacional e com mais tecnologia: adotamos muitas inovações por aqui. Além disso a ideia também será desenvolver uma comunicação que melhore seu valor de mercado”.
Segundo Cortezze a guerra da Ucrânia tem atrapalhado um pouco o planejamento, uma vez que a matriz está na Europa e seus mercados sofrem impactos. Mas, para ela, esse processo envolve reforçar o avanço à descarbonização e à inovação com o uso de energias renováveis. Um dos motivos que, inclusive, trouxe os holofotes para a América Latina, onde a empresa tem se envolvido cada vez mais com pesquisas e ações acerca de combustíveis alternativos como o etanol, bioetanol e biometano.
“Parte da planificação dessa nova posição será ampliar a visão global e dar mais espaço para soluções regionais e locais do grupo no mundo, até porque nem todas as regiões e países adotarão essas tecnologias ao mesmo tempo. A eletrificação é o caminho, mas será percorrido em velocidades diferentes dependendo do lugar. A busca por energias renováveis ficou ainda mais forte agora, pois são soluções viáveis que emitem menos carbono e que podem evoluir. E, inclusive, abastecer o carro elétrico.”
Engajada com os temas sustentabilidade e diversidade a jornalista, de 48 anos, que iniciou a carreira em publicação do setor automotivo e que ocupa há mais de duas décadas cargos executivos de comunicação corporativa, tendo passado por setores distintos como tecnologia e financeiro, ressaltou que na comunicação o ambiente não é majoritariamente masculino, diferentemente do que ocorre nas empresas.
Embora não considere ter enfrentado desafio excepcional por ser mulher no dia a dia, ela citou reuniões que são dominadas por homens que trazem dificuldade em se colocar, além de opiniões que são repetidas como algo inédito, sendo que elas já tinham sido proferidas:
“Mas também, com o tempo, fui sendo treinada e fui me desenvolvendo para vencer essas barreiras e assim foi na minha carreira. Sem perder minha essência, mas encontrando caminhos para ocupar meu espaço. Por exemplo: se não conseguir falar envio e-mail para registrar o que acredito que deva ser feito”.
Para a executiva um dos principais desafios para a carreira feminina ainda é conciliar família, trabalho, filhos e seu próprio desenvolvimento pessoal e profissional. Ela, que acorda bem cedo e se exercita diariamente, disse que o estar bem fisicamente apoia o estar bem mentalmente: “Cada um tem um papel na família e costumo dar muita autonomia a todos. É preciso delegar. Não tenho mais a síndrome de mulher maravilha”:
“Existem momentos da carreira em que tudo é mais complexo, com filhos menores ou quando há uma promoção. Mas é possível conciliar. Para isso, porém, é preciso contar com o suporte da família e dos filhos. E nunca é tarde para buscar seu objetivo. Tudo tem seu tempo”.