A recente decisão do Copom, Comitê de Política Monetária, de elevar a taxa Selic em 1 ponto porcentual, alcançando 12,25% ao ano, gerou uma grande discussão. O comunicado do Banco Central sugere que, nos próximos meses, a taxa poderá chegar a 14,25% em função de um “cenário desafiador” e de uma “assimetria altista no balanço de riscos para a inflação”.
Contudo, enquanto o mercado financeiro alerta para os riscos de superaquecimento da economia, os dados da Anfavea indicam uma história bem diferente: o setor automotivo prevê fechar o ano com crescimento de 15%, alcançando 2 milhões 650 mil unidades vendidas, com o maior índice de crescimento porcentual dos dez maiores mercados mundiais de veículos.
Essa contradição não é trivial. De um lado temos a visão predominante da Avenida Faria Lima, que afirma que o Brasil está crescendo acima da capacidade, alimentando pressões inflacionárias em meio a um gasto público que se recusa a encolher. De outro a perspectiva da indústria, que aponta para um mercado represado, uma produção em crescimento, empregos em alta e redução da pobreza.
Outros indicadores econômicos também ajudam a compor esse quebra-cabeça. A taxa de desemprego no Brasil recuou para abaixo de 6%, patamar que não era visto desde 2014, e a pobreza caiu para menos de 4% da população. Ainda assim pesquisa recente da Quaest revelou que apenas 10% dos economistas do setor financeiro aprovam o governo, evidenciando um desalinhamento dos resultados sociais com a percepção do mercado.
Olhando para 2025 a Anfavea projeta um crescimento adicional de 5,6% no mercado automotivo, o que levaria as vendas a 2,8 milhões de unidades. Segundo o presidente Márcio de Lima Leite se a taxa de juros fosse de 9,5% este volume poderia chegar a 3 milhões. A diferença de 200 mil unidades em vendas e produção é significativa, representando um impacto direto na geração de empregos e na competitividade da cadeia produtiva.
Essa análise leva a uma reflexão maior sobre as metas de inflação no Brasil. É realmente necessário perseguir os tais 3% a qualquer custo? Ou seria mais sensato adotar um patamar mais flexível, como 5%, por exemplo, permitindo maior equilíbrio do crescimento econômico com a estabilidade de preços?
Os Estados Unidos têm historicamente conseguido conciliar crescimento com controle inflacionário. Por que não podemos seguir um caminho semelhante?
A busca por uma inflação baixa é importante, mas não deve, na minha opinião, ser feita às custas do consumo, da produção, dos empregos e da redução da pobreza. Uma inflação ligeiramente mais alta, mas controlada, pode ser um preço razoável a pagar por um crescimento mais sustentável e inclusivo. Esse debate precisa ser ampliado com urgência, considerando não apenas os números do mercado financeiro mas, também, o impacto real sobre a indústria e a sociedade brasileiras.