São Paulo – A produção de motores funciona como um termômetro para o setor automotivo. E em meio a adversidades como a falta de capacidade de produção frente à demanda crescente, devido à pandemia de covid, e o impacto da valorização do câmbio e das commodities – o que ajuda quem exporta, e, ao mesmo tempo, pressiona a inflação com o encarecimento de componentes importados –, o segmento está otimista e aposta alto no desenvolvimento de tecnologias dedicadas a combustíveis alternativos e à eletrificação.
As análises do segmento foram apresentadas pelos presidentes das principais fabricantes de motores a diesel no País, Adriano Rishi, da Cummins, Marco Rangel, da FTP, e José Eduardo Luzzi, da MWM, durante o terceiro e último dia de palestras do Seminário Revisão das Perspectivas 2021, realizado de forma online pela AutoData Editora.
As companhias, que possuem em torno de 60% dos seus negócios no setor automotivo e o restante relacionado à geração de energia e aos setores agrícola, fora de estrada, marítimo e de construção, são uníssonas ao reconhecer que 2021, embora muito desafiador, tem sido extraordinário devido ao alto volume de pedidos. Luzzi avaliou que “o cenário está exigindo uma criatividade enorme, muito relacionamento com a cadeia de fornecedores, uma proximidade muito grande com todos os fornecedores críticos, uma visão global de aceitar repasse inflacionário ao entender a inflação galopante e ter bom senso nas negociações de forma a conseguir as matérias-primas para produzir”.
Quanto à transição para a eletrificação e a aposta em tecnologias sustentáveis Rishi lembrou que a Cummins inaugurou unidade de negócios dedicada às novas fontes de energia com enfoque no desenvolvimento de baterias, células de combustível e hidrogênio: “Um dos elementos para conseguirmos fazer com que essas tecnologias avancem é a questão da infraestrutura. Por isso estamos investindo também na produção de hidrogênio, um dos fatores-chave para chegarmos na questão do custo, para que essas tecnologias comecem a fazer sentido econômico. Começamos por aplicações em trens e estamos olhando a mineração. É diferente de caminhões, que precisam ter infraestrutura por onde passam”.
Luzzi lembrou que desde 1º de julho a MWM integra o Grupo Traton e ponderou que os elétricos são uma realidade, mas que é preciso diferenciar suas aplicações nos hemisférios Norte e Sul, o que causa delay no Brasil com relação a Estados Unidos, Europa e Japão. Disse também que há muito espaço a ser percorrido pelos motores aaaaaas combustão interna em iniciativas alinhadas com a realidade brasileira, por exemplo, com biogás, biometano, hidrogênio e biodiesel: “No País abunda a produção de biocombustíveis, renováveis, favoráveis à parte de emissões e com relação à descarbonização. Acreditamos na eletrificação como uma das alternativas à mobilidade, mas não a única”.
“A matriz multicombustível é a nossa aposta”, complementou Rangel, ao citar que a FPT possui tratores movidos a biometano na América do Sul em desenvolvimento com usinas que geram biomassa, como as de etanol. Em paralelo citou que há projetos de hibridização de motores movidos a gás e eletricidade: “Recentemente lançamos, na Europa, projeto com a Vinícola Barolo de trator totalmente carbono zero, pois produz seu biometano a partir da biomassa gerada na colheita. O conceito de eletrificação está inserido porque o motor é híbrido e acreditamos que a solução é muito variada. Aqui no Brasil, do ponto de vista de ecossistema, ainda não estamos prontos, temos jornada longa pela frente”.
Com relação ao motor Euro 6, que será implementado em duas fases no País, em 2022 e 2023, os executivos citaram que estão se preparando mas destacaram maior complexidade devido à maior integração com o caminhão, em comparação ao antecessor Euro 5. Luzzi disse que “a tecnologia que está disponível e que, inclusive, será exportada, é uma parte do todo. Digo isso porque, infelizmente, houve certa resistência a se reconhecer o impacto do coronavírus na aplicação da tecnologia de motor existente nos diversos modelos de caminhões e ônibus no Brasil”.
Durante a pandemia os engenheiros não puderam viajar e os laboratórios ficaram fechados, e a importação de peças e componentes vitais para o sistema foi prejudicada, o que causou atraso no desenvolvimento das aplicações do Euro 6. Isso faz com que o cronograma de implementação seja muito mais agressivo e que traga sobrecarga de trabalho, observou o presidente da MWM:
“Em paralelo ao lançamento de programas de emissões deveria ser trabalhada seriamente a renovação da frota. A grande massa de caminhões circulantes no Brasil é Euro 3, Euro 2, Euro 1, Euro nada, e isso é o que gera o principal componente poluidor do País. Quando você entra com o Euro 6, principalmente com volume reduzido de mercado por causa do custo de aquisição do veículo, ele traz ganho ambiental, mas que é muito menor do que se tirássemos de circulação caminhões e os substituíssemos por Euro 5”.
Foto: Reprodução.