São Paulo – A despeito de problemas recentes desencadeados pela pandemia, que trouxe desarranjo da cadeira de suprimentos e disparada dos preços de insumos, a indústria automotiva do Grande ABC e das demais regiões do Estado de São Paulo receberia injeção de competitividade caso houvesse a liberação de créditos de ICMS por parte do governo paulista, que também precisaria colocar em operação o programa Pró-Ferramentaria.
Foi o que afirmou Antonio Megale, vice-presidente da Anfavea, durante o evento Futuro da Indústria no ABC, organizado pela Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC e realizado na USCS, Universidade Municipal de São Caetano, na quarta-feira, 18.
“O Estado de São Paulo perdeu competitividade com relação a outros estados,e um dos problemas principais que temos hoje é a retenção do ICMS. Na geração e na produção de veículos e na compra de peças o imposto no Estado é um pouco mais elevado. Então, quando exportamos veículos, como o ICMS é zerado, geramos um crédito que está retido com o governo. Diz a legislação que o dinheiro é nosso, que tem que voltar para a indústria automotiva, mas ele não volta, ou volta muito pouco.”
Megale citou que em outros estados não há a geração de crédito e estima que haja de R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões em créditos das montadoras, sem contar a cadeia de autopeças que também possui créditos que estão parados no governo:
“Se conseguirmos trazer este dinheiro para o setor ele naturalmente financiará muitos novos investimentos. Antes, quando tínhamos uma dor de barriga, batíamos na porta da matriz e ela ajudava. Mas como essa crise é mundial agora dizem que todos têm problemas e nos lembram que há esse dinheiro parado e nos mandam recuperá-lo”.
Antonio Megale
O executivo citou três programas por meio dos quais é possível recuperar os recursos: Pró-Veículo, Pró-Ferramentaria e Pró-Ativo. Se estivessem rodando, essas iniciativas irrigariam todo o setor.
O Pró-Ferramentaria, lembrou, foi criado pela Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC a várias mãos em janeiro de 2019 e assinado pelo então secretário da Fazenda paulista, Henrique Meirelles, mas ainda não saiu do papel. O programa torna viável a compra de ferramentaria produzida no Estado com os créditos de ICMS, que seriam transformados em dinheiro, e com o novo recolhimento o imposto retornaria ao governo, estabelecendo assim um jogo de ganha-ganha.
“Hoje vivemos da dependência que o mundo criou dos produtores asiáticos. Toda a indústria está sofrendo com a logística e gostaríamos de investir mais localmente. Se esse programa começa a rodar podemos reativar a ferramentaria do ABC, que já foi tão importante e ainda tem relevância. Poderíamos tornar a região polo mundial, como já fomos no passado, quando produzíamos ferramenta que era exportada para a Alemanha.”
Antonio Megale
E os municípios poderiam contribuir ao oferecer qualificação de mão de obra em parceria com o Ciesp e os Senai a fim de melhor preparar os profissionais que operam nessas fábricas.
Aroaldo Oliveira da Silva, presidente da Agência e diretor executivo do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, propôs que seja organizado um encontro de ferramentarias como próximo passo para analisar vias de melhorar a competitividade e elevar a localização das empresas: “Estamos também organizando uma atividade para identificar alternativas de financiamento da própria indústria”.
Silva disse ainda que o encaminhamento resultante do evento será a constituição do Fórum da Indústria do ABC, que contará com representantes das sete prefeituras, dos sindicatos, das universidades, das empresas, do governo estadual e da Agência, a quem caberá a coordenação da iniciativa e o levantamento das potencialidades da região.
Percalços — Megale lembrou que o setor automotivo como um todo prevê para 2022 crescimento de 8,5% ante 2021, só que, até o momento, está 19% abaixo do ano passado: “Se tirássemos essas pedras do caminho conseguiríamos avançar em velocidade muito mais rápida, gerar mais emprego e voltar a produzir em três turnos”.
O custo Brasil é outra pedra a ser solucionada. Albino Fernando Colantuono, especialista do Decomtec, Departamento de Competitividade e Tecnologia, da Fiesp, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, citou algumas dificuldades decorrentes:
“Precisamos da reforma tributária para reduzir o custo de produção. Temos alíquotas mais elevadas para pessoa jurídica, o problema da cascata e do acúmulo de crédito, principalmente em ICMS, problemas de burocracia tributária e altas taxas de juros que dificultam o acesso ao capital de giro e aos financiamentos. Sem contar a disparada dos custos de eletricidade, gás natural, aço, petróleo, produtos químicos. E dos gastos com logística desde que a pandemia começou. Temos em torno de 25% de desvantagem, na média, com relação a concorrentes, por causa do custo Brasil. Não há uma bala de prata. É preciso unir esforços e articular alternativas com os governos estaduais e federal”.
Albino Colantuano
Norberto Perrela, diretor do Ciesp, Centro das Indústrias do Estado de São Paulo, de Santo André, apontou que as empresas de pequeno porte sofrem ainda mais com os custos elevados: por não conseguirem comprar direto da fonte, por exemplo, o aço das usinas, acabam pagando mais e neste caso o preço do insumo em questão mais do que dobrou, com aumentos mensais:
“A indústria está com os custos muito apertados. E o mercado está com comportamento extremamente instável. Você dorme com falta de capacidade produtiva e acorda com falta de serviços. Regionalmente há muito o que fazer. É preciso equacionar esses problemas, como a relação de trabalho e capital, e aproveitar o potencial do ABC para que ele volte a ser atrativo.”