São Paulo – Se no início da pandemia o risco da falta de liquidez na operação brasileira era item número um da lista de pesadelos da General Motors, quatro meses depois a situação parece estar mais controlada após intensa busca por acesso a linhas de crédito no BNDES e, em segundo momento, em bancos de varejo, abrindo espaço para a empresa olhar para outras prioridades.
“Não estaria aqui se não tivéssemos tido sucesso nesta operação”, disse Carlos Zarlenga, presidente da GM América do Sul na quarta-feira, 1º, no Seminário AutoData Megatendências do Setor Automotivo – a Revisão das Perspectivas 2020. Sua afirmação indica que, ao fim, houve desfecho feliz no que diz respeito ao empréstimo buscado pela empresa para manter caixa e compromissos em dia.
Se a fonte dos recursos foi o BNDES ou banco de varejo indicado pelo Ministério da Economia ainda é incerto. O que se sabe de fato, porém, é de que, desta vez, a operação local da GM não recorreu aos recursos da casa-matriz, que também estava articulando, nos Estados Unidos, formas de proteger seu caixa. Se houve montadora que optou pelo empréstimo de curto-prazo o da GM parece ter outras condições:
“O nosso cash crunch já passou. Conseguimos operar com os recursos que temos e com as expectativas de negócios que temos”, disse Zarlenga durante a transmissão online. “Não tomamos dinheiro da matriz. Não porque não queríamos, mas porque não havia como.”
Uma vez superado o assunto, seguiu Zarlenga, abre-se espaço para que a montadora direcione seus esforços para outras frentes. Ele apresentou cinco pontos que, agora, passam a ser alvos do planejamento da empresa e servirá, assim, para balizar suas atividades em uma região que viu o mercado interno cair 40% nos últimos meses. O primeiro deles é o ajuste da capacidade às demandas atuais, um movimento que ganha força, por exemplo – e por enquanto – na Scania e na Caoa Chery e que repercute nas discussões da General Motors acerca do futuro.
“É algo que ainda não aconteceu por causa das ferramentas de flexibilização, que devem vencer no terceiro trimestre. Manter ou não o emprego dependerá da retomada do mercado. E eu acho que não vai voltar tão cedo.”
Em março a montadora negociou lay-off com os funcionários de todas as suas fábricas no País, com as paradas remuneradas programadas até maio e possibilidade de prorrogação por mais dois meses. A empresa também promoveu cortes de salários de executivos na sua operação global.
Segundo Zarlenga a empresa não discute neste momento quando e como acontecerá a redução da capacidade: “Esperaremos o máximo possível antes de qualquer medida. Só vamos fazer isso quando ficar claro o momento certo para ajustar a capacidade”.
Ele sinalizou alguma movimentação em 2021, argumentando que, neste semestre, a empresa analisará o mercado para, depois, saber qual deverá ser seu tamanho ajustado à demanda.
Os demais assuntos da lista de prioridades da GM na região estão ligados ao mantra da busca pela rentabilidade que tem regido a operação local nos últimos anos. A valorização do dólar sobre o real, a princípio, levou a companhia a deixar de produzir modelos em que se verificou menor receita em tais condições de câmbio alto.
Os modelos que deixaram de sair das linhas da montadora estão ocultos sob o biombo corporativo. Zarlenga, no entanto, afirmou que eles voltarão a ser produzidos tão logo o mercado proporcione condições para isso – no caso quando o dólar estiver em patamar que desonere a importação de componentes eletrônicos. A moeda valorizada também levou a empresa a ajustar os preços da sua oferta.
“O que estamos vendo hoje é uma indústria 40% menor e uma desvalorização do real muito forte. Então não temos condições de reduzir o preço para tentar criar situações para puxar volume. Temos que buscar a rentabilidade”, disse Zarlenga. “O truque, aqui, é vender em todos os segmentos com bom nível de rentabilidade. Quando se lança um produto no Brasil, tem que ter pouca exposição cambial.”
Câmbio valorizado poderia representar oportunidades interessantes para a montadora nas exportações, fato que, segundo o executivo, compensaria perdas no mercado interno. Entretanto ele pontuou que os problemas de infraestrutura ligados ao escoamento da produção, e também a ausência de mecanismos de fomento como o Reintegra, são fatores que inibem os negócios no Exterior.
“É preciso ser menos polido e falar mais dos problemas porque, do contrário, eles não serão resolvidos. Existe o Reintegra, mas não é apenas isso. O País precisa ter um perfil exportador, um foco exportador, melhorar a competitividade das empresas, fazer a reforma tributária. Hoje se discute se os projetos serão feitos no México ou no Brasil. Antes não era assim.”
O executivo, por fim, evitou desenhar por meio de números o mercado no fim do ano. O que se pode esperar da companhia, disse, são pontos de vistas realistas: “Não temos que ser otimistas neste momento”.
Foto: Reprodução.