Campinas, SP – Durante o lançamento dos primeiros modelos híbridos da Fiat, no início do mês, Emanuele Cappellano, presidente da Stellantis na América do Sul, conversou com alguns jornalistas durante uma hora. Foi no almoço em que, além de degustar as saladas que tanto aprecia, ele contou quase tudo o que está planejado para o próximo ano. Incluindo mais de uma dezena de lançamentos e a chegada de uma nova marca do grupo no mercado brasileiro: a Leapmotor.
Confira os principais assuntos desta agradável conversa, em que Cappellano mais falou do que comeu.
No lançamento do Fastback e do Pulse híbridos se falou em democratização do veículo com essa tecnologia. Mas a faixa de preço de R$ 125 mil a R$ 161 mil sugere um produto de difícil acesso para a maioria do consumidor brasileiro. Usar o termo democratização seria muito além dessa expectativa?
Hoje no segmento SUV o preço está competitivo. Ainda não estamos lançando [modelos híbridos] nas faixas mais de entrada do mercado, mas a tecnologia está disponível. Trata-se de um posicionamento de mercado. Não há nenhum impeditivo técnico em lançar o híbrido flex em produtos de entrada. Se tiver demanda estamos prontos. Ainda não é o Mobi, não é o Argo, mas esta é mais uma decisão considerando as características de mercado do que uma escolha de poder ou não utilizar [a tecnologia] nesses veículos.
Na mesma categoria e faixa de preço são ofertados no mercado nacional modelos 100% elétricos com preços até inferiores. Como enfrentar essa competição?
Quando o imposto de importação não estava sendo aplicado, desembarcou no País uma grande quantidade de veículos elétricos. Hoje a faixa de preço não é mais aquela. A nossa indústria levantou a questão da importância de que a competição no mercado deveria ser igual para todos. Igual significa sem dumping e carregando a carga tributária local. Quem chega no mercado brasileiro é bem-vindo: com os carros elétricos, híbridos ou só a combustão. Mas sendo ofertados com as mesmas condições dos carros nacionais. É claro que se chega um carro que custa 30% ou menos, isso vai criar uma confusão no mercado. Mas eu acho que o governo já se movimentou para amenizar esse desbalanço e não teremos mais aquelas faixas de preços.
O senhor acredita mesmo que o consumidor considera escolher um carro nacional com uma tecnologia híbrida em vez de comprar um carro importado com uma tecnologia elétrica pura?
Eu acredito que sim, neste momento. O elétrico está crescendo, vai crescer ao longo do tempo. Mas o mercado ainda não está pronto para isto. As infraestruturas ainda não estão prontas. Hoje, o carro elétrico funciona muito bem na cidade, como segundo carro da família, que não é a realidade do Brasil. Quantas famílias têm um segundo carro? E as infraestruturas fora das grandes cidades? Hoje, o sistema completo de baterias de carro elétrico deve custar mais ou menos 10 mil dólares. E quando eu falo 10 mil dólares isso vale para europeus, franceses, brasileiros: são 10 mil dólares a mais! Penso que esse valor vai reduzir nos próximos anos. Mas ainda é muito, principalmente para o mercado brasileiro.
O senhor falou em renovação completa do portfólio. O ano que vem podemos esperar mais ou menos quantos produtos, não necessariamente novos, mas de renovação do portfólio?
Em média fazemos de doze a quinze lançamentos por ano. Pode ser um pouco mais, ou um pouco menos em 2025, mas a tendência é essa.
Quando vem o próximo híbrido?
Este é apenas o início, vamos continuar. Já a partir de 2025 teremos outros lançamentos com outros produtos, em outras marcas do nosso portfólio.
E o objetivo é ter todos os veículos do portfólio da Stellantis eletrificados até 2030
O nosso target é até 2030, esse é um objetivo interno um pouco audacioso. Até 2030, teremos uma redução de até 50% nas emissões de CO2 em todas as nossas atividades e produtos. Medimos nossas emissões em 2021, que é o ponto de partida. E estamos trabalhando para chegar em 2030, com 50% a menos: isso significa hibridização da frota, a introdução do elétrico no futuro e também atuação nas plantas para reduzir o consumo de energia, usar a energia limpa, induzir os fornecedores. O maior impacto está na cadeia produtiva, em todas as empresas: 55% das nossas emissões estão na manufatura. E 45% é a emissão de CO2 na utilização dos nossos veículos.
Sobre o veículo movido exclusivamente a etanol: ele está homologado, pronto para chegar ao mercado? Vocês vão trabalhar primeiramente com frotas de empresas e frotas governamentais?
É verdade, trabalhamos para deixar esse produto pronto. Mas é necessário agora criar a demanda para um veículo com motor a etanol. Há possibilidades com o ESG, mas ainda é um trabalho mais de marketing e de contato com as empresas, tentando entender se existe mesmo esse interesse.
Vocês não estão fornecendo para ninguém?
Por enquanto, não. O que estamos tentando fazer é dizer, ok, o que interessa, vamos construir uma frota, isso pode ser feito, mas ainda não estamos lá.
Será que isso acontece ainda este ano? O ano que vem tem mercado para isso?
Eu acho que o ano que vem ainda não terá mercado, mas para mim o que pode acontecer é que essa sensibilidade maior para o ESG vai criar a necessidade e várias empresas de vários setores vão precisar adotar. O etanol puro é muito prático, é efetivo para frotas.
Falando ainda sobre etanol: há uma discussão sobre a qualidade do combustível, que pode melhorar eliminando um pouco de água e tornando uma motorização 100% etanol ainda mais eficiente. Como que vocês atuam? Vocês conversam com produtores ou com o pessoal da área de energia para dizer que, se o combustível melhorar, teremos produtos ainda melhores?
O governo está impulsionando muito isso dentro de pesquisas, desenvolvimento. Eles têm um objetivo de melhoria da eficiência, primeiro da produção e depois da combustão, isso é muito interessante.
O senhor fala muito em nacionalização da eletrificação. Como é que está a cadeia de fornecedores? Há interesse e investimentos?
Sim, sim. Algumas tecnologias ainda não estão no Brasil. Em geral os fornecedores têm interesse porque o mercado tem potencial. Estamos falando mais ou menos 4 milhões de carros do América do Sul. São quatro habitantes por carro, em média. A Europa hoje tem 1,3, 1,4 habitante por carro. Os Estados Unidos têm um habitante por carro. Em termos de potencial de crescimento é muito interessante, legal.
Vocês pensam em montar bateria aqui? A Toyota já anunciou que montará baterias aqui.
Estamos trabalhando com fornecedores, temos projetos. Mas montar bateria não é nada. Montar bateria não é fazer bateria. Tem muita diferença.
E a Leapmotor? O que pode dizer sobre a chegada dessa marca no Brasil?
Estou super empolgado com o início da Leapmotor no Brasil. É fundamental termos o produto certo para a América do Sul. Ele deve estar preparado para atender as necessidades e características desses mercados e estamos trabalhando para isto. Prefiro ter o produto certo a tentar acelerar esses processos, colocar no mercado e o carro não funciona para esses consumidores.
Mas já tem data para chegar ou não?
Vamos lançar no momento certo. Nosso objetivo é lançar em 2025.
Vai ter rede própria? Onde vai vender em rede das marcas da Stellantis?
Será uma marca com rede própria de distribuição. Em geral, queremos trabalhar com os empreendedores que conhecemos e que nos dão uma garantia de qualidade, de acesso ao cliente.
Todos esses contratos de concessionário, de loja, já está tudo em ordem?
Sim, é superimportante porque essas são coisas precisam ser preparadas com antecedência. A rede vai investir, os contratos estão em dia e os produtos, também. Está indo.