São Paulo – No curto prazo a indústria automotiva brasileira deverá se recuperar, até de forma acelerada, do tombo provocado pela pandemia da covid-19 em 2020. O que preocupa Rogelio Golfarb, vice-presidente da Ford para a América do Sul, é o que poderá acontecer depois. Ele expôs sua visão para 2021, e um pouco mais à frente, durante o Congresso AutoData Perspectivas 2021 na terça-feira, 27 – o evento, organizado em ambiente virtual pela AutoData Editora, segue até a sexta-feira, 30.
Segundo as projeções da Ford a produção de veículos chegará, em 2020, a 1,9 milhão a 2 milhões de unidades, e em 2021 a algo em torno de 2,4 milhões a 2,5 milhões, com volumes semelhantes no mercado interno.
“A volta acelerada em 2021 será sobre uma base baixa. Difícil imaginar uma recuperação em V, apesar desse crescimento esperado para o ano que vem”, disse, lembrando que, em 2019, as vendas projetadas para 2020 miravam a casa dos 3 milhões de veículos. “Se fosse só a pandemia a gente se recuperaria mais rápido. O problema é que o custo fiscal gerado por ela, e que foi justo e necessário, não será resolvido em 2021 dentro do contexto de teto de gastos.”
Golfarb mostrou dados que apontam crescimento forte da dívida do governo brasileiro este ano, decorrente dos investimentos necessários para dar apoio à população durante a pandemia, na forma de auxílio emergencial, programas de manutenção de emprego, etc. Ela vem acompanhada de aumento no endividamento das famílias e um alto índice de desemprego, 13% atualmente.
“Temos uma equação complicada de resolver: o governo está endividado e, por causa do teto dos gastos, perdeu poder de investimento. E as famílias endividadas, mais o desemprego, têm poder de consumo reduzido.”
Se no macro está difícil dentro do setor a situação também não é das melhores. O retorno do volume projetado para o ano que vem não significa a volta de lucratividade: de 42% a 45% das vendas de veículos no Brasil são vendas diretas, com margens reduzidas. E o varejo sofre com outro fenômeno raro, que Golfarb chama o descompasso “da inflação do preço com a inflação dos custos”: a do preço é a medida pelo IPCA, que sobe de 2% a 3%, e a dos custos é a do IGPM, que sobe acima dos 17%.
“Os nossos custos sobem na razão do IGPM mas, culturalmente, o brasileiro só aceita reajuste na faixa do IPCA.”
Pressiona também as contas das fabricantes a alta ociosidade das linhas produtivas, que este ano chegará aos 60%. Segundo o vice-presidente da Ford na hipótese mais otimista, com crescimento médio de 11% até 2024, essa ociosidade ainda ficará acima dos 40%: “O impacto nos custos é brutal”.
Apesar do cenário desafiador traçado Rogelio Golfarb finalizou sua apresentação em tom esperançoso. Ele disse acreditar na força do setor: “Nós temos condições de sair dessa crise como um setor pujante e vencedor. Temos que olhar para a frente”.
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