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From the Top: Achim Puchert, da Mercedes-Benz Ano 31 | Setembro 2023 | Edição 403 ENERGIA DO HIDROGÊNIO Gás para elétricos ganha relevância no Brasil IMPACTOS DO NOVO PAC Estímulo às vendas de caminhões e máquinas INVESTIMENTO DA CAOA R$ 3 bilhões para a fábrica de Anápolis RESSACA PÓS-DESCONTOS Preços voltam a subir e vendas voltam a cair 2023

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» ÍNDICE Setembro 2023 | AutoData All Digital 12 FROM THE TOP Achim Puchert, presidente da Mercedes-Benz do Brasil, fala dos planos da empresa. GENTE & NEGÓCIOS Notícias da indústria automotiva e movimentações de executivos pela cobertura da Agência AutoData. 86 8 94 LENTES FIM DE PAPO Os bastidores do setor automotivo. E as cutucadas nos vespeiros que ninguém cutuca. Frases e números mais relevantes e irrelevantes do mês, escolhidos a dedo pela nossa redação. ANIVERSÁRIO 1 SCHAEFFLER FAZ 65 ANOS PRÊMIO CONTINENTAL RECONHECE FORNECEDORES INVESTIMENTO CAOA COLOCA R$ 3 BILHÕES MERCADO A RESSACA PÓS-DESCONTOS 74 84 44 30 Após o esgotamento dos recursos do governo para patrocinar descontos em automóveis os preços voltam a subir e as vendas voltam a cair. Ano tende a terminar sem crescimento sobre 2022. Grupo antecipou novo ciclo e dobrou os aportes em sua fábrica de Anápolis, GO, para em cinco anos modernizar linhas de montagem, lançar produtos e elevar a capacidade de produção. Fabricante alemã de rolamentos, embreagens e componentes de motor iniciou no Brasil sua jornada para se transformar em uma das maiores empresas de autopeças do mundo. Três divisões da empresa no Brasil - Automotiva, Contitech e Pneus - premiaram o desempenho de dezessete empresas que fornecem peças e serviços para suas fábricas. ENERGIA A FORÇA DO HIDROGÊNIO POTENCIAL O NOVO PAC OS MELHORES DO SETOR PRÊMIO AUTODATA 2023 LANÇAMENTO FORD TERRITORY ANIVERSÁRIO 2 TOYOTA EM INDAIATUBA 22 38 48 68 78 Brasil começa a explorar o potencial do hidrogênio verde, sem emissões, para alimentar veículos elétricos com células de combustível. Na USP foram iniciados testes com o gás extraído do etanol. Plano de investimentos bilionários anunciado pelo governo em obras de infraestrutura deverá favorecer novas vendas para fabricantes de caminhões e máquinas rodoviárias a partir de 2024. Este ano o corpo editorial de AutoData escolheu 65 cases com iniciativas de empresas, produtos e personalidades, divididos em 16 categorias, para que agora os leitores votem nos melhores. Fabricante muda tudo no SUV importado da China para tentar fisgar o consumidor brasileiro com novo design, motor mais potente e preço na casa dos R$ 200 mil para concorrer com Jeep Compass. Há 25 anos a fabricante japonesa inaugurou sua segunda fábrica no Brasil para produzir seu campeão global de vendas, o sedã Corolla, que deu início ao crescimento da empresa no País.

» EDITORIAL AutoData | Setembro 2023 Diretor de Redação Leandro Alves Conselho Editorial Isidore Nahoum, Leandro Alves, Márcio Stéfani, Pedro Stéfani, Vicente Alessi, filho Redação Pedro Kutney, editor Colaboraram nesta edição Aline Feltrin, Lúcia Camargo Nunes, Soraia Abreu Pedrozo Projeto gráfico/arte Romeu Bassi Neto Fotografia DR e divulgação Capa Foto W. Phokin/Shutterstock Comercial e publicidade tel. PABX 11 3202 2727: André Martins, Luiz Giadas Assinaturas/atendimento ao cliente tel. PABX 11 3202 2727 Departamento administrativo e financeiro Isidore Nahoum, conselheiro, Thelma Melkunas, Hidelbrando C de Oliveira, Vanessa Vianna ISN 1415-7756 AutoData é publicação da AutoData Editora e Eventos Ltda., Av. Guido Caloi, 1000, bloco 5, 4º andar, sala 434, 05802-140, Jardim São Luís, São Paulo, SP, Brasil. É proibida a reprodução sem prévia autorização mas permitida a citação desde que identificada a fonte. Jornalista responsável Leandro Alves, MTb 30 411/SP autodata.com.br AutoDataEditora autodata-editora @autodataeditora Por Pedro Kutney, editor De lado e de ressaca, mas com lucro Terminada a festa dos descontos para compra de automóveis sobra a ressaca da queda das vendas, que tinha sido apenas adiada pelo patrocínio emergencial de R$ 800 milhões em créditos tributários do governo para bancar abatimentos de R$ 2 mil a R$ 8 mil nos preços de modelos até R$ 120 mil. Ao que indica o andar das carroças do mercado o programa só serviu para evitar cenário pior do que estava posto desde o início do ano, quando se projetava mais um ano andando de lado, com pouco ou nenhum crescimento sobre 2022, como acontece desde 2021. Reportagem especial de Lúcia Camargo Nunes, que ilustra a capa desta AutoData, demonstra que os efeitos do programa foram muito limitados, geraram vendas adicionais de 45 mil a 50 mil carros em junho, julho e agosto, mas segundo analistas projetam este será o mesmo número de veículos que deixarão de ser vendidos no último trimestre do ano. Ou seja: os descontos provocaram apenas antecipações de compra e devem arrefecer aquele que costuma ser o período mais aquecido de vendas do ano. Noves fora 2023 deve terminar assim como terminaram 2021 e 2022: sem crescimento. Nada ajuda a fazer o mercado brasileiro de veículos voltar a crescer sem auxílios emergenciais e artificiais. Passada euforia dos descontos patrocinados pelo governo, que receberam alguns abatimentos adicionais de fabricantes que precisavam desovar estoques, os preços voltaram a subir para níveis completamente deslocados do padrão brasileiro de renda. Segundo levantamento da Jato Dynamics o preço médio de compra em maio, antes dos descontos, era de R$ 148 mil, caiu sensivelmente para o ainda alto patamar de R$ 132 mil e, em agosto, já na ressaca do plano, voltou a subir a indecentes R$ 144 mil. Com estes valores médios para carros bem medianos – e sem crédito amplo e barato para suavizar o assalto – não há hipótese de se vender mais carros do que o já milagroso nível de 2 milhões/ano. Muito ao contrário a tendência é que este volume baixe ainda mais. Na prática há muito tempo os fabricantes trocaram volumes por lucros. Por isto os descontos sumiram após o patrocínio do governo. Vende-se menos e lucra-se mais com preços cada vez mais altos. Neste caso pode-se ponderar, inclusive, que os créditos tributários do programa financiaram bons lucros aos seus beneficiários. Mas enfim, melhor ficar de ressaca depois de uma festa do que ter dor de cabeça sem festa alguma.

O POTENCIAL DA DESCARBONIZAÇÃO NA GERAÇÃO DE NEGÓCIOS PARA A INDÚSTRIA BRASILEIRA 23 24out EVENTO ON LINE Informações/inscrições: (11) 93372 1801 seminarios@autodata.com.br www.autodata.com.br

TERÇA-FEIRA (24/10) 13H50/14H00 ABERTURA 14h00/14h40 PALESTRA EVANDRO GUSSI, PRESIDENTE E CEO DA ÚNICA, UNIÃO DA INDÚSTRIA DE CANA-DE-AÇUCAR E BIOENERGIA. TEMA: A INTERNACIONALIZAÇÃO DO ETANOL COMO ALTERNATIVA PARA A DESCARBONIZAÇÃO GLOBAL 14h40/15h20 PALESTRA ANTONIO FILOSA, PRESIDENTE DA STELLANTIS PARA A AMÉRICA DO SUL TEMA: O CAMINHO DA STELLANTIS PARA A ELETROMOBILIDADE NO BRASIL 15h20/15h40 Intervalo 15h40/16h20 (SALA 1) MESA REDONDA COM RICARDO BASTOS, PRESIDENTE DA ABVE, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO VEÍCULO ELÉTRICO, OSWALDO RAMOS, COO DA GWM E MARCELO SCHINEIDER, DIRETOR DE RELAÇÕES GOVERNAMENTAIS DA BYD TEMA: A EVOLUÇÃO DO MERCADO DE ELÉTRICOS E A CHEGADA DAS FABRICANTES CHINESAS AO BRASIL 15h40/16h20 (SALA 2) PALESTRA ADALBERTO MALUF, SECRETÁRIO NACIONAL DE MEIO AMBIENTE E QUALIDADE AMBIENTAL TEMA: PESQUISA DO GOVERNO SOBRE A GOVERNANÇA NO MEIO AMBIENTE 16H25/17H05 (SALA 1) MESA REDONDA COM WALTER BARBOSA, DIRETOR DE VENDAS DE ÔNIBUS DA MERCEDES-BENZ E MILENA ROMANO, PRESIDENTE DA ELETRA TEMA: A INEVITÁVEL CHEGADA DOS VEÍCULOS ELÉTRICOS NO TRANSPORTE URBANO DE PASSAGEIROS 16H25/17H05 (SALA 2) PALESTRA ANA CABRAL, PRESIDENTE DA SIGMA LITHIUM TEMA: AS PERSPECTIVAS E O QUE PODE SIGNIFICAR A EXTRAÇÃO DE LITIUM NO BRASIL 17h10/17h50 (SALA 1) PALESTRA DE CAÍQUE FERREIRA, DIRETOR DE COMUNICAÇÃO DA RENAULT E PRESIDENTE DO INSTITUTO RENAULT TEMA: A POLÍTICA DE ESG DA RENAULT E OS TRABALHOS DE DIVERSIDADE E INCLUSÃO SOCIAL 17h10/17h50 (SALA 2) PALESTRA LUIS ADAIME, CEO DA MOSS EARTH TEMA: A COMPENSAÇÃO AMBIENTAL COMO FERRAMENTA NA TRANSIÇÃO À DESCARBONIZAÇÃO SEGUNDA-FEIRA (23/10) 13H50/14H00 ABERTURA 14h00/14h40 PALESTRA MASAO UKON, LÍDER DO SETOR AUTOMOTIVO DA BOSTON CONSULTING GROUP TEMA: PESQUISA BOSTON/ANFAVEA/SINDIPEÇAS – AS MELHORES ESTRATÉGIAS EMPRESARIAIS PARA O BRASIL E PARA O SETOR AUTOMOTIVO BRASILEIRO EM TEMPOS DE DESCARBONIZAÇÃO 14h40/15h20 PALESTRA JULIO MENEGHINI, DIRETOR CIENTÍFICO DO CENTRO DE PESQUISA PARA INOVAÇÃO EM GASES DE EFEITO ESTUFA, RCGI, DA ESCOLA POLITÉCNICA DA USP TEMA: O BRASIL À FRENTE DA PRIMEIRA INICIATIVA MUNDIAL PARA PRODUÇÃO E UTILIZAÇÃO DE HIDROGÊNIO VERDE NA MOBILIDADE SOBRE RODAS 15h20/15h40 Intervalo 15h40/16h20 (SALA 1) MESA REDONDA COM EXECUTIVOS DA MOURA, BYD MANAUS, BORGWARNER E SUSPENSYS TEMA: OS INVESTIMENTOS NO BRASIL PARA A PRODUÇÃO DE BATERIAS AUTOMOTIVAS 15h40/16h20 (SALA 2) PALESTRA NELMARA ARBEX, SÓCIA ESPECIALISTA EM ESG DA KMPG TEMA: A IMPORTÂNCIA CADA VEZ MAIS PRESENTE DO ESG PARA O SUCESSO EMPRESARIAL NO BRASIL E NO MUNDO 16H25/17H05 (SALA 1) MESA REDONDA COM GONÇALO PEREIRA, PROFESSOR DA UNICAMP, ALEXANDRE BREDA, GERENTE DE TECNOLOGIA DE BAIXO CARBONO DA SHELL E ANDRÉ OLIVEIRA, DIRETOR DO SENAI/CIMATEC TEMA: IMPULSIONANDO O PROGESSO ATRAVÉS DO PROJETO BRAVE, DE PRODUÇÃO DE ETANOL A PARTIR DO AGAVE 16H25/17H05 (SALA 2) PALESTRA MARTA BANDEIRA DE FREITAS, GERENTE DE SUSTENTABILIDADE DO BNDES TEMA: AS OPORTUNIDADES DE INVESTIMENTOS EM DESCARBONIZAÇÃO E MEIO AMBIENTE 17h10/17h50 (SALA 1) PALESTRA PATRÍCIA ELLEN, CO-FUNDADORA DA AYA EARTH PARTNERS TEMA: OS BENEFÍCIOS DA DESCARBONIZAÇÃO PARA A ECONOMIA BRASILEIRA 17h10/17h50 (SALA 2) MESA REDONDA COM GASTÓN DIAZ PEREZ, PRESIDENTE DA ROBERT BOSCH AMÉRICA LATINA E CESAR ALARCON, PRESIDENTE DA PIRELLI TEMA: AS CONSEQUÊNCIAS DA ELETRIFICAÇÃO NO AMBIENTE DE NEGÓCIOS DAS AUTOPEÇAS BRASILEIRAS

8 LENTES Setembro 2023 | AutoData PARA PENSAR E PARA AGIR São medíocres as perspectivas do Brasil no médio prazo à luz do resultado da edição de 2021 do Progress in International Reading Literacy Study, uma avaliação que mede, nos estudantes, sua habilidade de leitura, “analisando se são capazes de localizar informações, interpretar, articular ideias e analisar de forma crítica o conteúdo do texto”, conforme reportagem de página inteira de O Estado de S. Paulo de 8 de setembro, de Raísa Toledo. Aparentemente não haverá quem cuide do chão de fábrica. Pois, num grupo de 43 países que aplicaram os testes, os resultados referentes ao Brasil ocuparam o trigésimo-nono lugar, depois da Macedônia do Norte, Azerbaijão, Uzbesquistão, “estatisticamente empatado” com Irã, Kosovo e Omã e à frente de Jordânia, Egito e África do Sul. Em pontos obtivemos 419 em 1 mil, sendo que o país primeiro colocado, Cingapura, obteve 587. Isto significa que os estudantes de Cingapura “localizam e identificam pormenores, reconhecem o significado de linguagem figurativa, interpretam ilustrações, diagramas e mapas”. E também significa que estudantes brasileiros, de forma geral, não vão além de dominar “habilidades básicas de leitura, como reproduzir informações explícitas no texto e fazer inferências simples sobre o conteúdo”. PARA PENSAR E PARA AGIR 2 Este resultado é pequeno demais para um país, o nosso, que há pelo menos vinte anos vende a ideia de que, ano a ano, vence a batalha da competitividade, que avança sempre na sua capacidade de produzir cada vez mais e melhor com foco na qualidade – e, é claro, nos últimos dois anos, de acordo com os melhores padrões vigentes do ESG. Com uma equipe deste naipe certamente se vislumbra futuro curto por aqui para setores industriais mais complexos pois gente que mal entende o que lê, e o que ouve, será absolutamente incapaz de manejar meios de produção cada vez mais complicados e exigentes de interpretação e análises rápidas. E seria uma certa covardia inserir, aí, a mandatória necessidade de língua estrangeira para estar up to date mesmo no chão de fábrica. PARA PENSAR E PARA AGIR 3 Estou pensando, sim, no chão de fábrica do futuro à luz do resultado desta pesquisa que, aparentemente, não guarda familiaridade com a intuição dos pioneiros. Como sempre estamos muito atrasados na atitude de tomar providências em situações como esta. Mas alguém precisa tomar algumas: não se fala em reindustrialização com contingentes de pessoas mais próximos de algo menos do que analfabetas. Por Vicente Alessi, filho Sugestões, críticas, comentários, ofensas e assemelhados para esta coluna podem ser dirigidos para o e-mail vi@autodata.com.br Reprodução Internet

9 AutoData | Setembro 2023 Reprodução Internet NO SEGUNDO PELOTÃO Na esteira das dificuldades de compreensão, relatadas na página ao lado, que talvez fossem menos problemáticas se fossem as únicas, nos informa pesquisa desenvolvida pela consultoria Roland Berger e publicada pelo mesmo Estadão, em 9 de setembro, que o Brasil também está atrás na corrida por receber produção descentralizada e realocada para mais próximo de centros consumidores, movimento designado como nearshoring. Como resultado das pendengas comerciais dos Estados Unidos com a China, surgem como potenciais herdeiros deste rearranjo México, Índia, Vietnã e Indonésia, e o Brasil ocupa lugar no pelotão de trás. Os quatro países têm lá as suas vantagens: um divide largas fronteiras com os Estados Unidos, outro tem na enorme população a sua força de combate e Vietnã e Indonésia são vizinhos da China e aprovam, com entusiasmo, política batizada como China Plus One, de não concentração de investimento na China e, sim, de ampliar seus destinos na própria Ásia contemplando países da região. NO SEGUNDO PELOTÃO 2 Mas o Brasil também tem, lá, as suas virtudes. O estudo destaca seu mercado consumidor, uma infraestrutura industrial instalada, capacidade de exportação e uma certa energia limpa e barata. Como falha de caráter existem o custo Brasil e um ambiente de negócios no mínimo complexo. Diante disto o estudo, baseado em números e perspectivas de projeção do BID, Banco Interamericano do Desenvolvimento, credita ao País a possibilidade de gerar novos US$ 8 bilhões em exportações. É uma grana que sem dúvida ninguém rejeita, mas o fato é que o quinhão projetado para o México, por exemplo, nesta nova ordem econômica que está sendo forjada, é de US$ 35,2 bilhões, magnífica disparidade. Estão contemplados com promessas de crescimento, também na América Latina, Argentina, com algo como US$ 3,9 bilhões, Colômbia, com US$ 2,5 bilhões, e Chile, com US$ 1,8 bilhão.

12 FROM THE TOP » ACHIM PUCHERT, MERCEDES-BENZ Setembro 2023 | AutoData Em busca de novo brilho para a estrela O economista e administrador Achim Puchert, alemão de 44 anos, é o mais novo presidente que a Mercedes- -Benz já teve no Brasil em seus 67 anos de história. Mas não falta experiência ao jovem executivo que iniciou carreira no Grupo Daimler há vinte anos. Antes de assumir seu atual posto, em janeiro de 2022, era vice-presidente sênior da Daimler Truck & Buses para mercados internacionais. Com esta experiência e após muitas vindas ao País para visitar familiares que já moravam aqui Puchert diz que ficou “entusiasmado e lisonjeado” quando foi indicado para assumir a operação no Brasil, que hoje é o maior mercado de caminhões e ônibus Mercedes- -Benz no mundo. Ele reconhece que a missão a ele confiada não é nada fácil: transformar a companhia no Brasil em uma corporação mais resiliente aos muitos altos e baixos do mercado e restaurar a rentabilidade na região. Puchert afirma que está acostumado às flutuações drásticas de vendas e que “o importante é estar preparado para reagir”. E é o que ele está fazendo, iniciando, há um ano, um pesado plano de reestruturação que prevê o desligamento de 3,6 mil empregados e terceirização de várias atividades, com o objetivo de dar novo brilho e devolver rentabilidade à estrela que simboliza a mais antiga fabricante de veículos comerciais instalada no País. Segundo Puchert o plano está progredindo e deve colocar a corporação “no bom caminho até 2025”. Como foi o seu último ano e meio aqui? Uma montanha russa, começando no ano passado com a crise de fornecimento de chips de um lado e forte demanda dos clientes de outro, e nós tentando atender. Depois, este ano, vem o arrefecimento do mercado com a introdução dos modelos Euro 6, juros altos e demanda em queda... Combinado com tudo isso estamos em meio a uma grande transformação da empresa. Ao mesmo tempo ainda estou me familiarizando com o Brasil e com a América Latina, novo país, nova cultura, novas pessoas, nova maneira de fazer negócios, aprendendo o português, com muito espaço para melhorar. Qual foi sua reação com a indicação pela Daimler Truck para liderar as operações da Mercedes-Benz do Brasil? Fiquei muito entusiasmado e lisonjeado. Primeiro porque Brasil e América Latina são mercados muito importantes para a Mercedes-Benz Truck & Buses, representam um grande pedaço de nosso negócio. Sabia que a companhia não Entrevista a Pedro Kutney Clique aqui para assistir à versão em videocast desta entrevista

13 AutoData | Setembro 2023 Fotos: Divulgação/Mercedes-Benz

14 FROM THE TOP » ACHIM PUCHERT, MERCEDES-BENZ Setembro 2023 | AutoData rentabilidade suficiente mesmo em momentos de desaceleração. Assim um dos tópicos é reestruturar o negócio, o que já estamos fazendo, para moldar a empresa para o futuro no horizonte até 2030, olhando para as transformações e tendências globais da indústria, com novos competidores e novas tecnologias. O senhor já teve tempo suficiente para se acostumar aos altos e baixos do País? Não necessariamente só no Brasil. Na minha carreira eu trabalhei com mercados internacionais, fora do eixo clássico europeu e japonês, como Oriente Médio, África e Leste Europeu, com muitos altos e baixos. Diria que isto não me preocupa nem me deixa nervoso: o mais importante é que você esteja pronto para reagir, é necessário estar alerta para gerenciar os diversos ciclos e adaptar o negócio. Já sob sua direção, há exatamente um ano, a Mercedes-Benz anunciou um impactante plano com a terceirização das áreas de logística, manutenção, produção de eixos e transmissões, ferramentaria e laboratórios, que implica na demissão de 3,6 mil empregados, incluindo 1,2 mil temporários que não tiveram seus contratos renovados. Como tudo isso está progredindo? O quadro de empregados é um dos itens do plano, mas estamos reestruturando toda a companhia, incluindo o portfólio de produtos, as pessoas, o faturamento no País, as fábricas. Uma das questões é se temos o espaço certo e a situação financeira correta para investir em nosso futuro. Ao fazer isso estamos indicando as operações e serviços que podemos terceirizar, pois não são parte da nossa “ A razão fundamental para ser rentável é que isto dá perspectivas aos nossos empregados aqui, traz desenvolvimento social e tecnológico para o Brasil e América Latina, e um fabricante sustentável e rentável garante aos nossos concessionários e clientes um futuro bem-sucedido com nossos produtos e serviços.” estava no mesmo estágio que se encontrava no passado, mas segue com muito potencial. Algo que me motivou a aceitar o novo posto é que já havia estado diversas vezes no Brasil, porque alguns tios e tias vivem aqui, então já conhecia o País e seu povo. Qual missão a Daimler Truck confiou ao senhor para a operação brasileira? Como disse a operação brasileira é muito importante para a companhia, temos uma longa história de 67 anos no País e uma trajetória bem-sucedida. Na última década não estivemos no nível que nós gostaríamos, mas seguimos investindo. A matriz acredita no potencial do Brasil e da América Latina, assim muitos investimentos foram feitos. Agora a missão é construir um modelo de negócio mais resiliente em face dos muitos altos e baixos na demanda, para assegurar

15 AutoData | Setembro 2023

16 FROM THE TOP » ACHIM PUCHERT, MERCEDES-BENZ Setembro 2023 | AutoData “ Vemos bons sinais como a queda dos juros, a reforma tributária, o PAC que beneficia obras de infraestrutura e deve demandar muitos caminhões. Há no horizonte fatores que nos dão confiança de uma situação melhor de demanda no Brasil em 2024.” atividade-fim, tiveram papel importante no passado mas não será possível levar tudo adiante sem comprometer investimentos que precisamos fazer. Nossa intenção é terceirizar tudo localmente, na mesma região, com fornecedores locais de componentes que terão desempenho melhor, sem comprometer as necessidades de nossos clientes. Concordo que 3,6 mil [trabalhadores a serem desligados] é um grande número: os [1,2 mil] temporários saíram por causa de flutuações de mercado e da produção, os demais sairão gradualmente, em estágios, até 2025. Tivemos uma forte alta na demanda em 2022, precisamos chamar algumas pessoas de volta e este ano houve novo arrefecimento. O ambiente é desafiador e tentamos trabalhar de maneira mais eficiente possível. Mas estamos progredindo [com o plano de reestruturação]. O volume que temos hoje não é rentável, mas estamos lentamente melhorando a situação. Estou bastante confiante que em 2025 estaremos em um bom caminho. Nas discussões com os sindicatos sobre o programa de demissões voluntárias é um diálogo duro mas construtivo, porque no fim todos querem o mesmo: o sucesso da empresa para que possamos investir em seu futuro. Como a Mercedes-Benz lida com a forte queda, ao redor de 30%, do mercado de caminhões este ano? O mercado caiu mais fortemente do que esperávamos. Tivemos um bom começo de ano no primeiro trimestre mas, depois, enfrentamos o recuo da demanda, que está abaixo do nível do ano passado. Em maio, junho e julho os volumes caíram e junto com o sindicato negociamos a adoção de layoffs [suspensão de contratos de trabalho] temporários, para reduzir o ritmo de produção diante da redução dos pedidos. A ferramenta foi eficiente para gerenciar este momento. Agora observamos um leve aumento de encomendas e em setembro aumentamos o ritmo da fábrica, mas ainda estamos monitorando o mercado para adotar medidas se necessário.

17 AutoData | Setembro 2023 Seus antecessores diziam que o principal problema da Mercedes-Benz do Brasil é que a empresa não rendia lucros. O senhor espera que o atual plano de reestruturação restaurará a rentabilidade? Algumas pessoas dizem que há fortes expectativas dos acionistas em termos de dividendos. Alguns têm razão porque, depois da separação no Grupo Daimler da divisão de carros Mercedes-Benz e da Daimler Trucks, a operação ganhou mais transparência pelo lado do mercado de capitais. Os acionistas esperam por robusta rentabilidade da Daimler Truck globalmente mas também em regiões específicas, então há mais atenção e alertas sobre essas operações. Mas não creio que isto seja algo que devemos temer, é importante gerar receitas e lucros para investir em nosso futuro. A razão fundamental para ser rentável é que isto dá perspectivas aos nossos empregados aqui, traz desenvolvimento social e tecnológico para o Brasil e América Latina, e um fabricante sustentável e rentável garante aos nossos concessionários e clientes um futuro bem-sucedido com nossos produtos e serviços. Qual é sua percepção sobre o desempenho mercado brasileiro e latino-americano de caminhões e ônibus? O aumento de volumes e faturamento na América Latina depende do Brasil, é o maior mercado para a Mercedes- -Benz Truck & Buses no mundo e por isto monitoramos mais de perto. Vemos bons sinais como a queda dos juros, a reforma tributária, o PAC [nova versão do Programa de Aceleração do Crescimento anunciado pelo governo em agosto] que beneficia obras de infraestrutura e deve demandar muitos caminhões. Há no horizonte fatores que nos dão confiança de uma situação melhor de demanda no Brasil em 2024. Na América Latina temos diferentes situações: na Argentina ainda não vemos muitas mudanças, os volumes estão estáveis, mas as eleições presidenciais este ano, em outubro, podem afetar o câmbio e a economia. Temos bons resultados em outros mercados da região como Peru e Colômbia, e no Chile o forte é a eletrificação, por isto já estamos levando para lá o [Mercedes-Benz] eActros [da Alemanha], o [Fuso] eCanter do Japão e o chassis de ônibus elétrico eO500U que começamos a produzir aqui e que também seguirá para outros mercados latino-americanos. Temos diferentes quadros na região mas no geral estamos mais otimistas com 2024. A Mercedes-Benz teve um arrojado ciclo de investimentos no Brasil de R$ 2,4 bilhões de 2018 a 2022, para lançar novos produtos e modernizar suas operações. Isto foi feito. E agora como fica? Com um plano de reestruturação em andamento a companhia continuará investindo no País como estão fazendo seus concorrentes? “ Estamos progredindo [com o plano de reestruturação]. O volume que temos hoje não é rentável, mas estamos lentamente melhorando a situação. Estou bastante confiante que em 2025 estaremos em um bom caminho.”

18 FROM THE TOP » ACHIM PUCHERT, MERCEDES-BENZ Setembro 2023 | AutoData Investimos pesadamente nos últimos anos em novos produtos, na preparação para o Euro 6, nas nossas fábricas... Mas também estamos investindo na nossa transformação, como o plano de demissão voluntária e outras atividades que são importantes para pavimentar nosso caminho até 2025. Tivemos já alguns resultados positivos, estamos em um bom caminho. Iniciamos discussões para o período 2025-2030 sobre investimentos em produtos e serviços. É um processo em andamento: divulgaremos quando tivermos números mais concretos. A Mercedes-Benz sempre investiu no desenvolvimento local de seus veículos na América Latina. Qual é o futuro desta área da empresa no Brasil? Temos no Brasil uma grande área de P&D. Para ônibus toda a competência global da companhia no desenvolvimento de chassis para ônibus, inclusive elétricos, está localizada aqui em São Bernardo, onde desenvolvemos produtos para o Brasil, América Latina e exportamos para o mundo. Do lado dos caminhões temos alguns desenvolvimentos locais em andamento e também olhamos para potenciais colaborações globais com nossos colegas na Europa e Ásia, tanto para adaptações de produtos para a região como para localizar componentes. As exportações são importantes para ocupar a capacidade das fábricas. O atual nível de vendas externas da Mercedes- -Benz do Brasil é suficiente? A participação das exportações aumentou de 2022 para 2023, mas porque a demanda local está mais fraca. Para reduzir a dependência que temos do “ Iniciamos discussões para o período 2025-2030 sobre investimentos em produtos e serviços. É um processo em andamento e divulgaremos quando tivermos números mais concretos.” Brasil está em nosso plano aumentar os volumes de exportação, um grande pilar para estabilizar as variações de produção. Nossos caminhões já são vendidos em mercados para além da América Latina, como Oriente Médio e países africanos. Um fato notável é que exportamos daqui motores e caixas de câmbio para Estados Unidos, Europa e outros mercados no mundo. Temos bom nível de exportações de componentes e precisamos também aumentar as vendas externas de veículos. A Mercedes-Benz começou este semestre a produzir seu primeiro veículo elétrico no Brasil, o chassis de ônibus eO500U. Como está o interesse dos clientes pelo produto? Existem planos de se produzir aqui outros veículos elétricos? Do lado dos ônibus vemos grande interesse: já temos cerca de cem chassis elétricos rodando em São Paulo que foram encomendados antes. Mas é bastante animador ver que muitos outros mercados internacionais estão interessados, ficaria feliz em vender mais, porém o desafio é ter baterias suficientes para produzir. Estamos trabalhando com nossos fornecedores nessa questão. Sobre caminhões elétricos temos algumas consultas

19 AutoData | Setembro 2023 Nossa expectativa é que a eletrificação se consolidará primeiro no segmento de ônibus, e há tendência similar para caminhões leves e médios para entregas urbanas. Ao mesmo tempo os biocombustíveis e o próprio diesel continuarão a ter papel importante para aplicações rodoviárias e fora-de-estrada. A questão para o biodiesel é: ele terá preço competitivo e pode ser considerado verde? Para caminhões de longa distância ou offroad uma opção tecnológica interessante é a célula de combustível alimentada por hidrogênio, mas também estamos estudando motores a combustão com hidrogênio, que podem ter potencial nessas operações, mas, de novo, a questão aí é colocar a infraestrutura para funcionar. A Mercedes-Benz apresentou na última Fenatran um protótipo de caminhão autônomo Atego para operações em fábricas. Este projeto evoluiu? Este é um dos meus tópicos favoritos, porque mostra que no Brasil não estamos apenas seguindo rápido mas também desenvolvendo soluções que são novidades para o grupo. Em cooperação com a Lume Robotics já colocamos quatro caminhões autônomos nível 4 para rodar em aplicações de distribuição dentro da Ypê. Planejamos ampliar este negócio no Brasil e temos planos de adotar veículos autônomos dentro de nossas fábricas a partir de 2024. Temos caminhões autônomos rodando nos Estados Unidos mas também há interesse em adotar a tecnologia que desenvolvemos aqui para áreas cercadas. Esta é uma área em que estamos correndo à frente no grupo, em cooperação com startups que está se pagando. mas também muitas questões a respeito de custos e da infraestrutura necessária de recarga, que é mais fácil de resolver no caso de ônibus [que vão para as garagens à noite]. Estamos desenvolvendo novos veículos elétricos para o nosso portfólio global que poderíamos trazer para cá mas antes precisamos focar nas condições prévias [para desenvolver este mercado]. Com relação a outras alternativas de veículos comerciais pesados de baixa emissão de CO2 quais tendências são mais promissoras? Biocombustíveis como biodiesel e HVO são consideradas boas opções globais ou ficarão restritos ao Brasil?

Encontro pioneiro dos líderes do setor automotivo retorna ao normal: convidaremos presidentes de montadoras e de sistemistas, executivos das principais entidades ligados ao setor automotivo.

Fiquem atentos em nossos canais na Internet que em breve anunciaremos todos os pormenores deste que será o mais importante fórum para discutir o futuro da indústria automotiva do País. EVENTO PRESENCIAL EM NOVEMBRO. Informações/inscrições: (11) 93372 1801 seminarios@autodata.com.br www.autodata.com.br

22 Setembro 2023 | AutoData ENERGIA » ALTERNATIVA Por Leandro Alves | Colaborou Pedro Kutney Hidrogênio verde entra na rota de descarbonização do Brasil Projeto na USP testará a viabilidade da produção de H2 a partir do etanol para utilização em veículos elétricos com célula de combustível, que podem aposentar os carros a bateria O hidrogênio, o H2, é considerado a mais promissora das alternativas para a descarbonização de todas as atividades que utilizam qualquer tipo de energia fóssil ou contaminante. Na produção industrial, na geração de energia elétrica para o consumo em geral e, especialmente, na mobilidade por terra, água e ar. Todos estes setores poderão se Wanan Wanan/shutterstock

23 AutoData | Setembro 2023 Os protótipos Necar, de New Electric Car, marcaram as tentativas da Mercedes-Benz com as células de combustível: em 1994 foi apresentada a van Necar 1, em 1999 as células foram instaladas em um Classe A, o Necar 4, e já nos anos 2000 a fabricante mostrou o Classe B Fuel Cell. Nunca foram vendidos. livrar de toda ou boa parte das emissões de CO2 quando o hidrogênio chegar para valer. Há algumas vias para produzir H2 limpo, ou verde, e o Brasil tem todas à disposição – uma delas é extrair o gás de seu principal biocombustível, o etanol, amplamente conhecido, explorado e distribuído no País há mais de quarenta anos. O H2 é um gás abundante e velho conhecido da civilização moderna, vem sendo estudado e consumido desde o século passado, mas até agora poucas iniciativas conseguiram justificar investimentos que promovessem uma transição global contundente de matriz energética para o uso do gás na produção de eletricidade sem emissões de CO2. O problema é que, mesmo sendo o elemento mais abundante do universo – está presente em quase todos os elementos –, as rotas para obter o H2 muitas vezes partem de matriz considerada suja ou poluente, como é o caso do carvão. As principais fontes atualmente são combustíveis fósseis, especialmente o gás natural, e para extrair hidrogênio deles são inevitáveis as emissões de CO2 no processo. Por outro lado a extração do H2 da água é ineficiente, gasta-se mais energia elétrica para produzir o gás por meio da eletrólise do que ele entrega. E para que este processo seja livre de emissões de carbono a fonte de eletricidade utilizada deve obrigatoriamente ser limpa, eólica, solar ou hídrica, pois se a produção for alimentada por um gerador a diesel, por exemplo, haverá emissão de CO2 fóssil. ESFORÇOS FRUSTRADOS Dentre outras dificuldades para isolar o H2 e usá-lo como combustível, ou fonte de eletricidade, está a ausência de tecnologias economicamente viáveis para muitos desses processos e, principalmente, para utilização segura e em escala em diversas aplicações como fonte de energia motriz. Por estes motivos já foram considerados “esforços frustrantes” algumas das pesquisas com hidrogênio por parte de Divulgação/MB empresas do setor automotivo. Em 1999, quando era DaimlerChrysler, o grupo sustentava elevadas esperanças no seu Fuel Cell Project Group, como constava no comunicado de seu balanço anual: “Nos laboratórios do Nabern Technology Park, em Stuttgart, cientistas e engenheiros estão projetando motores que funcionam com produtos químicos e interação

24 Setembro 2023 | AutoData ENERGIA » ALTERNATIVA de hidrogênio com oxigênio, que produz eletricidade para alimentar veículos que emitem água pura e vapor. Numa era de aquecimento global, poluição atmosférica e escassez de combustíveis fósseis a longo prazo, as células de combustível da DaimlerChrysler são garantia da mobilidade sustentável no futuro, e a empresa está caminhando rapidamente para produção de carros pequenos e ônibus”. Era verdade, mas os altos custos da tecnologia e a escassez de fontes limpas de hidrogênio nunca tornaram viável a sombra comercial do projeto. Depois de muitos protótipos tecnicamente bem- -sucedidos, em 2020, sem muito alarde, segundo a publicação Car Experts, a Mercedes-Benz, histórica marca de carros da Daimler, encerrou todos os seus programas de desenvolvimento de propulsão a célula de combustível, mesmo com o aquecimento global e a poluição atmosférica batendo recordes e criando eventos extremos. LIMPEZA E VIABILIDADE O Brasil tem a solução para tornar o hidrogênio uma solução viável e limpa. O País surge como um dos futuros líderes globais na produção do H2 verde, sem emissões de CO2, porque pode fazer eletrólise da água com utilização de sua imensa matriz energética renovável, baseada em hidrelétricas e usinas eólicas e solares. Mas há, também, outras rotas, como a extração do gás de biocombustíveis, também abundantes por aqui. É possível retirar hidrogênio do etanol – e de qualquer outro combustível gasoso ou líquido – com uso de catalisadores, os chamados reformadores. Neste processo há emissão de CO2 mas muito baixa e que, no caso de etanol, é integralmente reabsorvida pelas plantações de sua principal matéria-prima, a cana-de-açúcar. Por enquanto a geração de H2 enfrenta dois grandes desafios: reduzir seu custo de produção e encontrar uma rota que faça sentido para os produtos que o utilizarão. Quanto ao primeiro desafio a expectativa é de que os custos do hidrogênio verde diminuirão 60% até 2030, segundo estudo da EPE, Empresa de Pesquisa Energética, vinculada ao Ministério das Minas e Energia. Estas projeções se sustentam na baixa remuneração para a utilização da energia limpa e renovável disponível no Brasil, responsável por 70% dos custos da obtenção do hidrogênio verde. A cotação internacional do gás livre de CO2 flutua ao redor de US$ 2 o quilo, e a expectativa é que caia para US$ 0,60 nos próximos anos com o avanço das tecnologias. Empresas de energia, fabricantes de automóveis e veículos comerciais e o mundo acadêmico se debruçam há anos para equalizar o segundo desafio, que é definir uma rota de utilização do H2 nos produtos. Há, por exemplo, iniciativas como a da Mercedes-Benz nos anos 1990 e seus protótipos de carros elétricos com célula de combustível embarcada – uma espécie de usina eletroquímica que usa a reação do hidrogênio com oxigênio para gerar eletricidade e emite apenas vapor d’água no escapamento. Uma das soluções ensaiadas na época foi embarcar também no carro o reformador que extrai H2 de combustíveis, produzindo hidrogênio dentro do próprio veículo. Mas esta alternativa, apesar de tecnicamente viável, foi abandonada pela fabricante alemã porque o reformador A Nissan testou no Brasil um furgão elétrico alimentado por células de combustível a hidrogênio extraído do etanol: abastecimento em qualquer posto no País. Divulgação/Nissan

25 AutoData | Setembro 2023 NOVO CITROËN C3 NÃO SIGA CAMINHOS, FAÇA O SEU. NO TRÂNSITO, ESCOLHA A VIDA!

26 Setembro 2023 | AutoData ENERGIA » ALTERNATIVA ocupava muito espaço e faltou confiabilidade em sua utilização. Recentemente a Nissan retomou esta rota e testou, no Brasil, um furgão elétrico que tinha um reformador de etanol embarcado, que extraia hidrogênio para alimentar uma célula de combustível de óxido sólido, chamada de SOFC. Após comprovar a eficácia da tecnologia em dois ciclos de testes, em 2016 e 2017, rodando por ruas e estradas brasileiras com a van elétrica abastecida com etanol, o desenvolvimento do veículo não ganhou escala até agora, ainda que seja uma solução bastante interessante. HIDROGÊNIO DO ETANOL NA USP Após vinte anos de estudos acadêmicos e em incubadoras de empresas vinculadas à Escola Politécnica da USP, Universidade de São Paulo, foi lançada em agosto a primeira iniciativa no mundo para a produção de hidrogênio verde a partir do etanol. O governo do Estado, a universidade e a iniciativa privada estão juntos no projeto que desenvolve uma estação experimental de abastecimento de H2 extraído do biocombustível por meio de um reformador. A operação prática terá início no segundo semestre de 2024. O reformador foi desenvolvido e é fabricado pela brasileira Hytron, empresa formada por ex-alunos da Politécnica que, desde o período de formação acadêmica, trabalham no desenvolvimento da tecnologia. Este é o equipamento que converte etanol em hidrogênio por meio de processo químico chamado reforma a vapor, que é quando o biocombustível, submetido a temperaturas e pressões específicas, reage com a água dentro de um reator. “Estamos unindo a tecnologia brasileira pioneira da Hytron para demonstrar que o hidrogênio produzido do etanol possa ter um papel ainda mais relevante e de elevado impacto para a transição energética do País e do mundo”, afirma Daniel Lopes, diretor comercial da Hytron. A iniciativa privada está representada por diversas empresas no projeto, como a Marcopolo, que fornecerá um ônibus a hidrogênio para rodar no campus da USP, e a Toyota, que trouxe a última versão do seu Mirai Fuel Cell, já em produção comercial no Japão e vendidos também nos O Toyota Mirai na USP: primeiro carro elétrico com células de combustível a ser vendido comercialmente vai iniciar testes com hidrogênio produzido a partir do etanol. Divulgação/Shell

27 AutoData | Setembro 2023 Estados Unidos. O etanol para a produção de hidrogênio será fornecido pela Raízen, além da sua sócia Shell, que realizou investimento de R$ 50 milhões no projeto. “Com este projeto será possível produzir hidrogênio verde de baixo custo”, observa Júlio Meneghini, diretor científico do RCGI, Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa, da Escola Politécnica, local onde será construída a estação de abastecimento de hidrogênio. Segundo Cristiano Pinto da Costa, presidente da Shell Brasil, a intenção é endereçar novas alternativas de uso do biocombustível brasileiro nas principais rotas de descarbonização: “O objetivo deste projeto inovador é tentar demonstrar que o etanol pode ser vetor para hidrogênio renovável, aproveitando a logística já existente de distribuição de combustíveis. Sonhamos em ser líderes globais em hidrogênio verde proveniente do etanol. Podemos chegar a isso. A tecnologia poderá ajudar a descarbonizar setores que consomem energia de combustíveis fósseis”. O poder público, também parceiro e incentivador do projeto, esteve representado no evento pelo governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que comemorou a vanguarda do projeto e ainda questionou a viabilidade dos veículos sem emissão abastecidos só por eletricidade: “Será que o caminho para a indústria automotiva é elétrico puro? Talvez não. Verifiquem o peso das composições elétricas no caso dos ônibus e a exigência de carregamento para os veículos comerciais. Talvez não faça sentido termos esses veículos 100% elétricos. Por outro lado temos o etanol, o biometano e o hidrogênio verde. São alternativas que já estão prontas para descarbonizar a mobilidade”. POSTOS DE HIDROGÊNIO A intenção é, a partir deste projeto piloto, deixar o discurso de lado e acelerar a utilização da tecnologia em massa, o que seria possível com a instalação de reformadores em postos de combustíveis já existentes. Desta forma, em tese, qualquer ponto de abastecimento no País com uma bomba de etanol poderia se transformar em produtor de hidrogênio verde. Ricardo Mussa, presidente da Raízen, confirma que este processo poderá ganhar escala rápido, pois há todas as condições para utilizar o etanol já distribuído nacionalmente. O etanol é um eficiente transportador de hidrogênio. Para efeito de comparação, hoje, o deslocamento do biocombustível de cana ou milho do local de produção até o destino é feito por caminhões-tanque com capacidade para levar 45 mil litros, que armazenam em si o equivalente a aproximadamente 6 toneladas de hidrogênio. Este mesmo veículo conduzindo uma carga de hidrogênio comprimido conseguiria transportar apenas 1,5 tonelada do gás, ou seja, quatro vezes menos. Por isto a ideia do reformador instalado nos postos ganha sentido prático. Antes, porém, é preciso comprovar a viabilidade técnica do reformador de etanol para a equação da matriz energética justificar essa rota livre de emissões. Tarcísio de Freitas afirmou que o Estado de São Paulo tem todas as condições para sair na vanguarda da utilização do hidrogênio verde: “Basta a indústria automotiva definir seus investimentos em veículos que possam rodar com hidrogênio como combustível. Esses propulsores já estão desenvolvidos e sendo utilizados em outros países”. Scharfsinn/shutterstock

28 Setembro 2023 | AutoData ENERGIA » ALTERNATIVA ENSAIOS Ao longo do funcionamento da estação experimental na USP os pesquisadores validarão os cálculos sobre as emissões de CO2 e custos do processo de produção de hidrogênio. Segundo Meneghini, do RCGI, a estimativa no momento é que o custo do hidrogênio extraído do etanol seja comparável ao custo do chamado hidrogênio cinza, retirado do gás natural no contexto da matriz energética brasileira. Já as emissões são comparáveis ao processo que realiza a eletrólise da água alimentada com energia elétrica proveniente de fonte eólica. Outro parceiro do projeto, o Instituto Senai de Inovação em Biossintéticos e Fibras, fará simulações computacionais para tornar o reformador de etanol mais eficiente, identificando oportunidades de aperfeiçoamento e aumentando a taxa de extração de hidrogênio renovável a partir do biocombustível. O hidrogênio produzido na estação abastecerá dois veículos elétricos: um ônibus e um carro. A Marcopolo cedeu o veículo que circulará exclusivamente no transporte de passageiros dentro da Cidade Universitária. Para testar o desempenho do hidrogênio do etanol a Toyota cedeu pelo período de um ano o Mirai, primeiro veículo a célula de combustível do mundo comercializado em larga escala, cujas baterias são carregadas a partir da reação química do hidrogênio com oxigênio. Rafael Chang, presidente da Toyota do Brasil, valorizou a vocação do Brasil com os biocombustíveis e o comprometimento da sua empresa com a descarbonização: “Fomos os primeiros a produzir no Brasil veículos híbridos flex. Entendemos o hidrogênio como uma fonte de energia limpa e renovável, que tem papel importante nos esforços para reduzir as emissões de CO2. A parceria neste projeto é o primeiro passo da empresa para testar o uso dessa nova tecnologia no País. Temos interesse e disposição para trabalhar em conjunto com o governo do Estado para tornar viável o transporte sustentável com uso do hidrogênio renovável a partir do etanol”. O governador Tarcísio de Freitas recebe da Marcopolo miniatura do ônibus elétrico a hidrogênio que vai circular na USP: estação de abastecimento com etanol. Divulgação/Shell

29 AutoData | Setembro 2023

30 Setembro 2023 | AutoData MERCADO » DESEMPENHO Por Lucia Camargo Nunes Na ressaca pós-descontos mais um ano andando de lado Crescimento efêmero das vendas em junho, julho e agosto não altera expectativas negativas diante de preços altos e crédito ainda muito restrito Muitos fabricantes turbinaram suas vendas com bônus adicionais aos descontos patrocinados, reduzindo preços de modelos mais caros e até criando versões especiais para o período, com planos pensados para um período em que consumidores foram atraídos às concessionárias de olho nas ofertas que tinham data para acabar. Os resultados na soma de junho e julho foram animadores, enquanto os de agosto mostraram sensível arrefecimento, com iStockphoto Passados três meses desde quando entrou em vigor a Medida Provisória 1 175 – que patrocinou com créditos tributários R$ 800 milhões em descontos de R$ 2 mil a R$ 8 mil para veículos leves que custam até R$ 120 mil, levando em conta preço, índice de nacionalização e eficiência energética – o mercado ainda digere os efeitos do programa sem expectativas positivas sobre a vida pós-descontos.

31 AutoData | Setembro 2023 queda de 13,2% nos emplacamentos de automóveis – os modelos mais beneficiados pelos descontos – na comparação com o mês anterior, que foi o melhor do ano até agora. Passada a festa o momento é de ressaca, com nível de preços voltando aos níveis de maio, antes do programa. De acordo com o presidente da Fenabrave, José Maurício Andreta Júnior, em agosto algumas marcas ainda tinham estoque de veículos com descontos patrocinados a oferecer, o que fez com que o resultado não fosse pior. A conclusão de analistas é que os descontos não devem somar mais emplacamentos ao ano e apenas animaram consumidores a antecipar as compras que aconteceriam no último trimestre. O horizonte, portanto, agora, é de retração do mercado. No máximo as ofertas serviram para aliviar uma situação que poderia ser ainda pior. MERCADO DE LADO A convergência de opiniões aponta que 2023 será o quarto ano “andando de lado”, como diz Milad Kalume Neto, diretor da Jato Dynamics no Brasil. A tendência, ele estima, é que o mercado feche 2023 na casa dos 2 milhões a 2,1 milhões de carros e comerciais leves emplacados – ou seja, quase o mesmo resultado pífio que já se previa em janeiro: “Já havíamos apontado BELL KA PANG/shutterstock esta tendência desde abril. Faltaram outros elementos para que as vendas permanecessem em patamar mais elevado”. O crescimento das vendas de veículos leves no acumulado de janeiro a agosto, de 10,7% na comparação com o mesmo intervalo de 2022, com pouco mais de 1,3 milhão de emplacamentos, não anima o presidente da Fenabrave: Andreta Jr pondera que os emplacamentos no primeiro semestre do ano passado tiveram desempenho abaixo da média histórica, devido principalmente à escassez de peças e componentes e à alta dos preços dos combustíveis, mas houve recuperação no segundo semestre: “Não há sinais de que teremos uma forte recuperação na segunda metade do ano”. Preço médio volta a subir Tíquete médio de automóveis – 2023 R$ 148 mil R$ 137 mil R$ 132 mil R$ 144 mil Maio Junho Julho Agosto Fonte: Jato Dynamics

32 Setembro 2023 | AutoData MERCADO » DESEMPENHO Segundo Kalume Neto das quatro variáveis que afetam as vendas de veículos – preço, juros, oferta de crédito e confiança do consumidor – a taxa básica Selic caiu 0,5 ponto porcentual mas ainda não chegou na ponta do consumo nos financiamentos, e a confiança do consumidor melhorou, mas não o suficiente para aquecer vendas. Para o consultor há apenas um fator positivo no horizonte: “O que é esperado é a votação do Marco das Garantias, que poderá trazer maior liberação de crédito pelas instituições financeiras por garantir maior celeridade na retomada dos bens”. PREÇOS AO ALTO Levantamento da Jato aponta que os preços já voltaram a subir, o que em nada ajuda no desempenho do mercado. Antes dos descontos o preço médio de tabela considerando todos os automóveis vendidos no País, em maio, era R$ 148 mil, caiu para R$ 132 mil em julho, melhor mês do ano e ápice do programa de descontos, e em agosto subiu para quase R$ 144 mil. Roberto Barros, consultor da Standard & Poor’s para o mercado automotivo, considera que em agosto houve um efeito rebote com aumento de R$ 10 mil nos preços médios: “Na nossa expectativa o tíquete médio deve voltar para a casa dos R$ 144 mil [valor que vinha estável desde o fim de 2022 até junho]”. Ele diz que a redução de valores observada em julho foi decorrente do maior volume de vendas de veículos de entrada, justamente os que receberam os maiores descontos. Se a demanda é tão sensível a preço um caminho para aumentar as vendas e ocupar as fábricas seria rever planos e reduzir as tabelas. Mas Barros enxerga que já ficou bem definido que o importante não é mais volume, e sim margem, o que leva montadoras a apostar em carros mais caros. Com esta política, e sem crédito, o cliente mais prejudicado é o de menor renda que só poderia comprar modelos de entrada, justamente os que oferecem margens baixas às empresas. “Não vemos espaço para baixar preços, o que só poderia ocorrer com uma redução drástica do dólar, e isso não está no horizonte. O dólar tende a ficar em curso de subida leve. Então não podemos esperar por quedas”, ressalta o consultor. “Até 2027 os preços dos veículos devem crescer condizentes com a inflação.” O presidente da Fenabrave, Andreta Jr, endossa que o fator preço foi fundamental para a recuperação do mercado nos últimos meses: “A MP foi muito importante para aquecer momentaneamente o mercado, mas o resultado de vendas de automóveis em agosto, agravado pela piora na oferta de crédito, já deixa clara a necessidade de uma política de fomento industrial de longo prazo”. Barros não alimenta expectativas nesse sentido: “Não temos expectativa de que haja outra medida do governo para desonerar produtos. Muito ao contrário temos Veículos leves vendidos nos três meses dos descontos Comparação com os mesmos meses e último trimestre de 2022 – em mil unidades 592,3 528,7 562,6 Junho/julho/agosto 2023 Junho/julho/agosto 2022 Outubro/novembro/dezembro 2022 Fonte: Fenabrave

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