Ano 33 | Abril 2025 | Edição 420 O JOGO OCULTO DA BYD Promessas de produção nacional e milhares de empregos escondem pedidos de benefícios fiscais para continuar importando From the Top Arcélio Júnior, Fenabrave ÔNIBUS AVANÇAM Mercado cresce acima das projeções VENDAS ON-LINE Digitalização muda relação com clientes
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» ÍNDICE Abril 2025 | AutoData 10 FROM THE TOP Arcélio Júnior, novo presidente da Fenabrave, fala de seus planos e prioridades para a endidade dos concessionários. GENTE & NEGÓCIOS Notícias da indústria automotiva e movimentações de executivos pela cobertura da Agência AutoData. 68 6 77 LENTES FIM DE PAPO Os bastidores do setor automotivo. E as cutucadas nos vespeiros que ninguém cutuca. As frases e os números mais relevantes e irrelevantes do mês, escolhidos a dedo pela nossa redação. Executivos e representantes de entidades da indústria debateram as oportunidades e os riscos do setor diante de quadro conturbado Renovações de frotas e programa Caminho da Escola reaquecem o mercado de ônibus no País, que tende a fechar 2025 acima das projeções Enquanto promete produção nacional e milhares de empregos a companhia chinesa pede benefícios ao governo para importar carros desmontados, sem peças nacionais Fabricante eleva para R$ 20 bilhões seu ciclo na América do Sul até 2028, com aporte de US$ 580 milhões na Argentina, para produzir a nova Amarok Primeiro modelo de nova ofensiva de lançamentos da GWM no País é SUV híbrido plug-in de luxo com grande capacidade off-road e preço de R$ 333 mil EVENTO AUTODATA MEGATENDÊNCIAS 2025 MERCADO ÔNIBUS AVANÇAM INDÚSTRIA O JOGO OCULTO DA BYD TODOS OS INVESTIMENTOS PARA ONDE VÃO OS RECURSOS LANÇAMENTO GWM TANK 300 Juro alto acende alerta de mercado menor e já puxa para baixo as vendas de caminhões e implementos rodoviários Era pós-pandemia aponta para um modelo híbrido de compra de carros com uso de novas ferramentas, como a inteligência artificial Atualização dos investimentos de R$ 118 bilhões divulgados por fabricantes de veículos leves e pesados no Brasil no período que vai até 2032 Mercedes-Benz, Hyundai e BMW premiaram as iniciativas socioambientais e o desempenho produtivo de seus fornecedores no Brasil EVENTO AUTODATA PERSPECTIVAS CAMINHÕES VENDAS ON-LINE DIGITALIZAÇÃO MUDA RELAÇÕES INVESTIMENTO VOLKSWAGEN AUMENTA APOSTA 52 58 62 54 18 28 32 44 38 PRÊMIOS RECONHECIMENTO A FORNECEDORES Divulgação/BYD
» EDITORIAL AutoData | Abril 2025 Diretor de Redação Leandro Alves Conselho Editorial Isidore Nahoum, Leandro Alves, Márcio Stéfani, Pedro Stéfani, Vicente Alessi, filho Redação Pedro Kutney, editor Colaboraram nesta edição André Barros, Caio Bednarski, Júlio Cabral, Lucia Camargo Nunes, Mário Curcio, Soraia Abreu Pedrozo Projeto gráfico/arte Romeu Bassi Neto Fotografia DR/divulgação Capa Foto divulgação/ GOVBA/Thuane Maria Comercial e publicidade tel. PABX 11 3202 2727: André Martins, Luiz Giadas Assinaturas/atendimento ao cliente tel. PABX 11 3202 2727 Departamento administrativo e financeiro Isidore Nahoum, conselheiro, Thelma Melkunas, Hidelbrando C de Oliveira, Vanessa Vianna ISN 1415-7756 AutoData é publicação da AutoData Editora e Eventos Ltda., Av. Guido Caloi, 1000, bloco 5, 4º andar, sala 434, 05802-140, Jardim São Luís, São Paulo, SP, Brasil. É proibida a reprodução sem prévia autorização mas permitida a citação desde que identificada a fonte. Jornalista responsável Leandro Alves, MTb 30 411/SP autodata.com.br AutoDataEditora autodata-editora autodataseminarios autodataseminarios Por Pedro Kutney, editor Vale o escrito No País do Jogo do Bicho todo apostador que faz sua fezinha sabe que, até na contravenção, para reclamar seu prêmio vale o escrito pelo apontador em um pedaço de papel. No caso das apostas da BYD no Brasil muitas promessas foram ditas mas poucas foram colocadas no papel. Talvez por isto mesmo a construção de sonhos, como é proposto no nome da companhia, Build Your Drems, ao menos por aqui, até o momento não passaram de devaneios. Reportagem que ilustra a capa desta AutoData revela o que, de fato, a fabricante chinesa escreveu: uma solicitação ao governo para reduzir significativamente, para 10% por três anos, o imposto de importação de seus veículos eletrificados que vão chegar parcialmente montados da China, em kits SKD, para simples montagem de poucos itens na linha que está em construção em Camaçari, BA, sem necessidade ou obrigação de comprar sequer um parafuso de algum fornecedor instalado aqui. Ainda que a BYD também tenha colocado neste mesmo papel que sua intenção é evoluir para o regime CKD – veículos completamente desmontados que receberiam desconto aduaneiro ainda maior, recolhendo apenas 5% – e, após 2028, passar à produção nacional peça a peça, também não há ali nenhum compromisso formal, por escrito, de que isto realmente acontecerá quando e se o benefício pretendido acabar. A proposta está longe de contemplar as promessas verbais feitas por executivos da empresa ao longo dos últimos três anos, de construir em Camaçari uma fábrica para produzir 300 mil veículos por ano com a contratação de 20 mil pessoas. Devido à falta de transparência da BYD, que não responde a nenhum questionamento sério sobre seu desenvolvimento no País, também não se sabe o que acontece daqui para frente se o governo negar a redução do imposto. Ao que parece a BYD quer receber sua aposta no Brasil sem nenhum comprovante e antes de saber do resultado de seu jogo. Um jogo oculto que não confirma o que foi prometido. Em respeito à indústria que está instalada no País há bom tempo, especialmente a de autopeças, o governo federal deveria pensar direito antes de aceitar o lobby, sob risco de conceder à BYD vantagens competitivas para seguir importando veículos e peças da China, com pouco ou nenhum valor agregado no Brasil. Serão vantagens sustentadas por benefícios fiscais, dinheiro do contribuinte, que os demais jogadores deste setor não têm.
6 LENTES Abril 2025 | AutoData Por Vicente Alessi, filho Sugestões, críticas, comentários, ofensas e assemelhados para esta coluna podem ser dirigidos para o e-mail vi@autodata.com.br Divulgação/Thuane Maria/GOVBA COMO NÃO CONSTRUIR SONHOS Demonstração de boa reportagem é a matéria de capa desta edição de AutoData. Deixa em situação instável a posição da produtora de veículos eletrificados BYD – Construa seus Sonhos, o mais bonito nome dentro de todo o universo automotivo. Em função disto, e de acordo com a reportagem, é encrencada a situação da empresa no Brasil: não cumpriu nenhuma das programações que prometeu ao longo dos meses nem a governos e nem à imprensa. Me lembra, este caso, com as devidas ressalvas de época, o caso da Asia Motors, que prometeu coisas bonitas, fábrica, alta geração de empregos e coisa e tal e apenas importou e vendeu milhares de veículos ao mercado interno brasileiro aproveitando benefícios fiscais concedidos diante de suas promessas. Era o governo FHC, meados dos anos 90. COMO NÃO CONSTRUIR SONHOS 2 O interessante é que o cenário potencialmente fabril era o da mesma Camaçari, BA, que tornou-se Ford e que, agora, ninguém sabe se abrigará uma BYD produtiva. Na época, e a valores de 2013, quando demanda judicial da Kia foi encerrada, a dívida da Asia com a Receita Federal era de mais de R$ 2 bilhões. Estava lá e vi com meus próprios olhos o presidente FHC ajudar na cerimônia da pedra fundamental, um calor de quase 40º à sombra naquelas dunas ao Norte de Salvador. Ele, num elegante fato bege, como convinha ocasião e horário, tinha mais de um lenço nas mãos, que não davam conta do sol, do calor, do mormaço, coisa do meio-dia. Ousou livrar-se do paletó, como muitos outros, para descobrir finas camisas sociais molhadas por inteiro. Não foi um bom dia para a nobreza de pé de cozinha do então presidente. (O brinde da Asia pela presença ao evento, o do assentamento da pedra fundamental de sua suposta futura fábrica, foi uma enorme lanterna logo apelidada por Carlos Brickman, também presente, de A Grande Piroca Luminosa da Asia.)
7 AutoData | Abril 2025 Divulgação/Anfavea COMO NÃO CONSTRUIR SONHOS 3 A maneira de construir sonhos, nós acreditamos, é elegendo a transparência como aliadas de jornada. Não importa o tamanho, nem o valor, do sonho: é recomendável calçar os objetivos com botas que mostrem claramente suas pegadas printadas no terreno. Se fosse campeonato de caminhar com as mãos seriam as impressões das digitais. Mas ou a BYD não teve tempo suficiente de chamar suas brigadas pela transparência ou se esqueceu disto, e a impressão que se tem é a da empresa agindo apenas por lobbies para abrir espaço solitário no universo das empresas fabricantes de veículos no Brasil – coisa que ela ainda não é. Mas de que valem os lobbies sem a transparência que alego aqui? Ora, ora, ouvir estrelas: exatamente o que não pode acontecer, neste caso, é o lobby definir situações atropelando a transparência. Vale a pena lembrar: um dos defeitos que não se pode, nem se deve, pespegar na antigamente foderosa Anfavea é o de fazer gestões por algum grupo de empresas associadas contra algum outro grupo de empresas associadas pois seu objetivo sempre foi o de atender a todas de maneira solidária. Ainda no caso da Anfavea uma associada somente obteve vantagens concorrenciais à custa de, exatamente, lobby – o pior é que, depois, logo depois, todo mundo ficou sabendo. Que papelão. A PROPÓSITO DA ANFAVEA Igor Calvet tomou posse na terça-feira, 15, recebido por Dan Ioschpe no grande salão do décimo-sexto andar da Fiesp. Ele é o primeiro presidente profissional-contratado da entidade em seus 69 anos de existência – será o presidente na festa dos 70 anos. Quem lá esteve diz que foi cerimônia quase intimista e com manifestações curtas a respeito do futuro da indústria de veículos e do mundo da mobilidade. Uma cerimônia que reuniu amigos, como deve ser, uma cerimônia discreta pelos tempos que se vive e pelos embates à frente. VOCÊ NÃO VIU A Comissão Nacional dos Salários Mínimos, órgão da Secretaria do Trabalho e da Previsão Social do governo do México, divulgou estudo comparativo sobre os salários mínimos em vigor, este ano, em dezesseis países da América Latina. O melhor salário mínimo pago é o do Chile, US$ 510, seguido pelo de Belize, US$ 487,13, e pelo do Uruguai, US$ 485,46. Os demais, em ordem descendente, são Guatemala, US$ 483,99, Equador, US$ 470, México, US$ 415,53, Colômbia, US$ 373,41, El Salvador, US$ 365, Honduras, US$ 353,07, Bolívia, US$ 350, Paraguai, US$ 348,45, Panamá, US$ 326, Peru, US$ 305,10, Argentina, US$ 287,93, Brasil, US$ 248,53, e Nicaragua, US$ 211,13.
10 FROM THE TOP » ARCÉLIO JÚNIOR, FENABRAVE Abril 2025 | AutoData Concessionário nato Mineiro de nascimento, economista de formação e concessionário de profissão – ele conta que começou a circular pela concessionária do pai aos 13 anos –, Arcélio Alceu dos Santos Júnior é o novo, e mais novo, presidente da Fenabrave, que aos 51 anos foi eleito para liderar a entidade que representa os concessionários reunidos em 57 associações de marcas que, juntas, têm espalhadas pelo país mais de 8 mil concessionárias de automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus, motocicletas e implementos rodoviários. Apesar de jovem não falta experiência a Arcélio Júnior – como ele prefere ser chamado –, tanto como empresário de uma linhagem de concessionários que há décadas dirige seu grupo sediado em Brasília, DF, como também na vida associativa no setor da distribuição: ele já foi diretor regional da Abrac, Associação Brasileira das Concessionárias Chevrolet, vice- -presidente e depois presidente do Sincodiv do Distrito Federal, por dois mandatos, e na gestão passada de Andreta Júnior na Fenabrave foi primeiro vice-presidente até ser eleito para a presidência para o triênio 2025-2027. Arcélio Júnior afirma que está “realizando um sonho” de dirigir a Fenabrave. Nesta entrevista ele conta como pretende aumentar a representatividade institucional da entidade, a começar pela liderança do grupo que discute formas de tornar viável o programa de renovação de frota de veículos do País, estacionado há anos no problema da falta de verbas para financiar o projeto. O que o motivou a ser presidente da Fenabrave? A minha história [como concessionário] e o meu sonho de ser presidente da Fenabrave, que começou há cerca de dez anos e foi conquistado cinco meses atrás, quando fui eleito por unanimidade, por todas as associações de marca. Minha história associativa começou na Abrac [Associação Brasileira das Concessionárias Chevrolet], seguindo o exemplo do meu pai, que foi presidente de associação de 2000 a 2002. Ali despertou o meu interesse para o trabalho associativo. Depois eu me tornei diretor regional da Abrac, comecei a participar do Sindodiv [sindicato dos concessionários de veículos]. Por estar sediado em Brasília acabei tendo contato mais próximo com o ex-presidente da Fenabrave Alarico [Assumpção Júnior, 2015-2021], que várias vezes me solicitou para representá-lo ou para acompanhá- -lo em compromissos. Assim começou o desejo de presidir a entidade. O senhor é o mais jovem presidente que a Fenabrave já teve em seus 60 anos de história e já é também o terceiro júnior consecutivo na presidência. A nova geração de uma longa linhagem de concessionários chegou ao poder? Entrevista a Pedro Kutney Clique aqui para assistir à versão em videocast desta entrevista
11 AutoData | Abril 2025 Divulgação/Fenabrave
12 FROM THE TOP » ARCÉLIO JÚNIOR, FENABRAVE Abril 2025 | AutoData em mais de 1 mil municípios, temos mais de 8,2 mil funcionários no País. Então é importante que as autoridades entendam essa representatividade. Nesse sentido já fizemos importantes visitas aqui em Brasília a várias autoridades de ministérios, no Executivo, com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Mota. Como eu resido em Brasília existe mais facilidade para trabalhar melhor nisto. Como o senhor disse uma de suas prioridades é tentar levar adiante o projeto da renovação de frota, pois o governo deu à Fenabrave a coordenação do grupo de discussão. Quais são os entraves para a adoção do programa e o que está sendo feito para superá-los? A gente sabe que esses entraves estão aí há décadas. Uma das coisas que me motivou para que a Fenabrave assumisse a liderança foi a empolgação que eu percebo no governo federal sobre projeto. Nós apresentamos para o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Mota, ele também se empolgou. Então vemos que existe vontade política no Executivo e no Legislativo. O problema “J uro alto com certeza afeta o desempenho das vendas, pois nosso setor é altamente dependente do crédito. Mas existem fatores que nos ajudam a sustentar a aprovação dos financiamentos. O primeiro é o baixo índice de inadimplência, o segundo é o Marco Legal das Garantias, porque gera segurança e aumenta o apetite dos bancos.” O ex-presidente da entidade gosta de brincar que para ser presidente da Fenabrave o nome tem de começar com A e terminar com Júnior, porque meu antecessor era o Andreta Júnior e o antecessor dele o Alarico Júnior. Mas realmente percebemos que existe uma nova geração, inclusive na diretoria eleita comigo, formada por pessoas experientes e mais jovens. Acredito que é muito importante a jovialidade, a garra, sem nunca esquecer o conselho dos experientes. Quais são as suas prioridades neste início de gestão? Fomos escolhidos por unanimidade para liderar o projeto do programa de renovação da frota, que tem dezessete entidades participando juntamente com o MDIC [Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comério]. Por isto aceitamos a tarefa. Este, com certeza, é o nosso grande foco. Outro ponto importante é mostrar a importância do nosso setor e aumentar a representatividade institucional e política da Fenabrave. Geramos mais de 300 mil empregos, representamos 5,79% do PIB, estamos presentes
13 AutoData | Abril 2025 O setor de distribuição de veículos no Brasil passou por momentos de grande prosperidade e alta nas vendas, sucedidos por crises que levaram ao fechamento de muitas concessionárias. Como o senhor classifica o momento atual do setor? Na história moderna do Brasil nunca houve um período maior do que sete anos sem crise. Este é um País com um sério problema de estabilidade econômica há décadas. Nosso setor, como todos os outros, sempre sofre essas ondas, mas é muito resiliente. Represento empresários que trabalham muito, a imensa maioria dos concessionários tem paixão pelo negócio. E essa paixão sempre ajudou o setor a manter sua resiliência, a superar os desafios. Eu tenho a certeza de que o concessionário brasileiro, em sua grande maioria, está preparado para superar as crises que virão. Como hoje estão as margens do negócio? É lucrativo ser concessionário? É lucrativo para quem faz boa gestão. Quem controla seus custos, tem bom relacionamento com a montadora, equilibra o departamento de novos, de usados, de pós-vendas, consegue ser rentável e crescer. Mas as margens de lucro estão muito baixas e não acredito que aumentarão. A concorrência é gigantesca e existem várias marcas chegando que incendiarão ainda mais a concorrência. Por isto acredito que todos os empresários têm de estar preparados para margens mais baixas. Como evoluíram nas concessionárias os processos de vendas on-line? O que observamos, principalmente é o suporte financeiro [do governo], pois temos o problema do equilíbrio fiscal. Na primeira reunião que fizemos, em 7 de fevereiro, na Fenabrave, tivemos uma tempestade de ideias para tentarmos outras maneiras de financiar o programa. Ficou definido que a renovação da frota será por etapas e a primeira será com caminhões, ônibus e implementos rodoviários. Não adianta fazer um programa para todos os segmentos, porque não haverá fundos. Isto também se justifica porque hoje existem 3 milhões de caminhões e ônibus no País e mais de 1 milhão estão com mais de trinta anos de uso. Como aproximadamente 52% das emissões de poluentes vêm justamente desses veículos, um dos melhores programas de descarbonização do País é a renovação de frota. “ Uma das coisas que motivou a Fenabrave a aceitar assumir a liderança do grupo que discute o programa de renovação de frota foi a empolgação que eu percebo no governo federal. Nós apresentamos também ao presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Mota, ele também se empolgou. Então vemos que existe vontade política no Executivo e no Legislativo.”
14 FROM THE TOP » ARCÉLIO JÚNIOR, FENABRAVE Abril 2025 | AutoData após a pandemia, é que o cliente inicia o processo da compra on-line e termina fisicamente em uma concessionária. Com todos os concessionários que converso, e são muitos, quando pergunto quantos carros já foram vendidos por processo on-line do começo ao fim a resposta é a mesma: nenhum, zero. Eu nunca ouvi um concessionário brasileiro falar que começou uma venda on-line e terminou on-line. Hoje o consumidor começa a busca no computador, faz a pesquisa, depois ele entra em contato com o vendedor, na maioria das vezes pelo próprio celular. Acredito que todo produto de alto valor, como um veículo, um imóvel, nunca o consumidor faz todo o processo digital, sempre termina no local da compra. Mas esses instrumentos on-line ajudam os concessionários? Ajudam, com certeza, bastante. Estou percebendo uma grande preocupação da rede em se preparar para a inteligência artificial. Vários fornecedores já nos oferecem produtos diferentes para atingir o consumidor de uma forma direta e particular, tornando a experiência digital mais agradável. Eu acredito que este ano e em 2026 teremos grandes mudanças nesse início da negociação digital. Neste início de ano as vendas de veículos no País cresceram acima das expectativas. Os juros em alta derrubarão este crescimento? Com certeza, pois nosso setor é altamente dependente do crédito. Mas existem alguns fatores que nos ajudam a sustentar a aprovação dos financiamentos. O primeiro é o índice de inadimplência que está controlado: em janeiro caiu para 4,4%. Em 2024 estava em 4,7%. Isso dá aos bancos apetite para financiar veículos. Apesar da previsão de mais uma alta Selic – estão falando em 15% [até o fim deste semestre] –, o segundo fator que nos ajudará a manter os financiamentos é o Marco Legal das Garantias [aprovado em janeiro de 2024], porque gera segurança para o operador financeiro ao desburocratizar a retomada do bem [de inadimplentes sem necessidade de autorização judicial]. Isto vai nos ajudar bastante este ano, como já está nos ajudando, mas muito pouco ainda porque somente agora começaram a ocorrer algumas retomadas. Então alguma coisa compensará a alta de juros. O que falta para o Marco Legal de Garantias fazer o efeito esperado? Qual o potencial de redução das taxas de financiamento ele terá? “ Só é lucrativo o concessionário que faz boa gestão, que controla seus custos. As margens de lucro estão muito baixas e não acredito que aumentarão. A concorrência é gigantesca e existem várias marcas chegando. Acredito que todos os empresários têm de estar preparados para margens mais baixas.”
15 AutoData | Abril 2025
16 FROM THE TOP » ARCÉLIO JÚNIOR, FENABRAVE Abril 2025 | AutoData O novo sistema tem grande potencial de impulsionar o crédito no nosso setor, ajudará na aprovação e também na redução do spread bancário. O porcentual ainda não posso falar porque o programa está sendo adotado gradualmente: existem alguns Detran que estão mais avançados, outros não, ainda estão preparando seus sistemas de TI, alguns cartórios têm dificuldades, os bancos também começaram a adequar recentemente os contratos baseados na nova legislação. Então acredito que ainda teremos mais seis a oito meses, até o fim do ano, para ter o Marco Legal funcionando a pleno vapor. Nos primeiros meses de 2025 as vendas diretas cresceram mais do que as vendas de varejo. Por que isso acontece? O correto é falar em faturamento direto [da montadora ao cliente final], que inclui, além de locadoras, também os PcDs [pessoas com deficiência], taxistas, produtores rurais, que compram assim para aproveitar o benefício fiscal que recebem. Eles não vão na fábrica comprar o carro diretamente, vão numa concessionária fazer o pedido e o fabricante faz o faturamento [no nome do cliente]. Então uma parte importante desse faturamento direto está sendo feito dentro das concessionárias. Mas após a reforma tributária, teoricamente, este instrumento perderá sentido. O preço médio de um automóvel hoje no Brasil é de R$ 138 mil. É possível fazer o mercado crescer com preços tão altos? Reconhecemos que R$ 138 mil é um valor alto para a renda do brasileiro. Acredito que é importante trabalharmos junto com Anfavea [associação dos “ Eu nunca ouvi um concessionário brasileiro falar que começou uma venda on-line e terminou on-line. Hoje o consumidor começa a busca no computador, faz a pesquisa, depois ele entra em contato com o vendedor, na maioria das vezes pelo próprio celular.” fabricantes], Sindipeças [que reúne dos fornecedores de autopeças] e governos federal e estaduais em um projeto para ter um carro mais acessível. O presidente Andreta, meu antecessor, trabalhou dias e dias nisto. A Fenabrave participou da elaboração da MP 1 175 [que, em 2023, criou por curto prazo descontos patrocinados pelo governo para a compra de veículos]. A MP 1 175 mostrou que com a redução de preço se aumenta a venda de veículos. Qual a sua opinião sobre o mercado de veículos elétricos e híbridos no Brasil atualmente? Os concessionários do país estão preparados para esta evolução? Com certeza. Inclusive a Fenabrave tem como associadas, há algum tempo, a AssoBYD e a AssoGWM. Nós acreditamos que o segmento elétrico terá o seu nicho aqui. No Brasil nós temos o etanol, que é bastante incentivado pelo governo federal e é uma alternativa de combustão de baixíssima emissão de carbono. Agora,
17 AutoData | Abril 2025 O senhor espera por alguma mudança na legislação que rege o setor de distribuição de veículos no País? A Lei Renato Ferrari é muito vibrante, viva e atuante. Existe uma ADPF [Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental da Constituição, que questiona no Supremo Tribunal Federal a legislação de venda de veículos zero- -quilômetro no País, condicionada à nomeação de concessionárias pelos fabricantes]. Mas já foram anexadas no STF manifestações da Presidência da República, do MDIC, Secretaria de Assuntos Jurídicos, Ministério da Justiça, AGU, Câmara dos Deputados e Senado, todas favoráveis à Lei Renato Ferrari. A Fenabrave entrou [no processo] como amicus curiae [especialista no assunto] e foi aceita pelo ministro Edson Fachin [relator da ADPF]. Todos percebem a importância da Lei Renato Ferrari. As várias manifestações reconhecem que a legislação promove equilíbrio econômico e defesa do consumidor, porque gera concorrência, dinamismo, cobrança da rede na montadora, atendimento ao consumidor. Quando a Lei Renato Ferrari foi criada, em 1979, existiam quatro montadores de automóveis do País. Hoje, só associadas à Fenabrave, são 24. Veja a concorrência que ela incentivou. Então a lei está vigente, está válida. Acredito que todas as manifestações positivas, todos falando que a lei é muito importante para o setor e haveria consequências gravíssimas se a ADPF promover alterações, são a prova mais contundente da importância da Lei Renato Ferrari. É muito importante sempre lembrar a segurança jurídica que ela traz. “ Reconhecemos que [o preço médio de] R$ 138 mil para comprar um automóvel é um valor alto para a renda do brasileiro. Acredito que é importante trabalharmos junto com Anfavea, Sindipeças e governos federal e estaduais em um projeto para ter um carro mais acessível.” o que estamos percebendo, tanto aqui no Brasil como nos Estados Unidos, é um crescimento de ganho dos híbridos. Qual a importância do negócio de veículos usados para as concessionárias? Desde os anos 1990 eu já ouvia falar que nos Estados Unidos, muitas vezes, o concessionário era deficitário na venda de novos e compensava com ganhos vendendo seminovos. Lá existe foco muito grande no departamento de usados. No Brasil também já existem vários grupos concessionários que estão bastante focados em usados. Temos de aproveitar o fato de a concessionária transparecer credibilidade para os consumidores, que se sentem mais seguros quando compram veículos em uma concessionária, porque sabem que vão ter respaldo em caso de algum problema, alguma questão de garantia ou de documentação. Principalmente nos últimos dois, três anos, percebo uma evolução, uma atenção do concessionário em carros usados.
18 Abril 2025 | AutoData EVENTO AUTODATA » CONGRESSO MEGATENDÊNCIAS 2025 O contexto atual marcado pelo tarifaço de Donald Trump nos Estados Unidos e pelo crescimento das importações de veículos da China, no cenário externo, aliado a percalços internos, como a demora na regulamentação do Mover, Programa Mobilidade Verde e Inovação, e a resistência do governo em retomar imediatamente os 35% de imposto de importação para carros eletrificados, Por Soraia Abreu Pedrozo Muitos riscos e algumas oportunidades no horizonte País tem trunfos como biocombustíveis e aumento da localização, mas mudanças são necessárias para ser mais competitivo em cenário conturbado que resulta em queda de investimentos poderá resultar na redução dos investimentos na indústria automotiva no País. Foi o que apontaram os presidentes da Anfavea, Márcio de Lima Leite, e do Sindipeças, Cláudio Sahad, durante o Congresso AutoData Megatendências 2025, realizado em 8 e 9 de abril, em São Paulo. Lima Leite apontou ainda outro fator de risco aventado nos corredores do governo: um pleito, por parte de empresa Fotos Patrícia Caggegi/AutoData
19 AutoData | Abril 2025 Presidentes da Anfavea, Márcio de Lima Leite (no telão), e do Sindipeças, Cláudio Sahad (no centro) Henry Joseph Júnior, diretor da Anfavea, participou on-line chinesa – que ele não citou nominalmente mas sabe-se que é a BYD –, para reduzir as alíquotas de importação de partes para montagem no Brasil em regime SKD, carroceria parcialmente montada, e CKD, totalmente desmontada. Pelo pedido a tarifa, que a partir de julho será de 35% [SKD] e 14% [CKD] para modelos elétricos e híbridos plug-in a serem montados no País com partes importadas, cairia para 10% e 5%, respectivamente. Da mesma forma seguem os pedidos já feitos ao governo por Anfavea e Sindipeças para retomar imediatamente a alíquota de 35% para importação de automóveis eletrificados, que obedece a cronograma escalonado estabelecido no fim de 2023 e que só tem previsão de alcançar este porcentual em julho de 2026. “Estivemos em Brasília no fim do ano passado e reforçamos nosso pedido de retomada imediata do imposto”, conta Sahad. “Estavam lá o presidente da República, o vice e ministro do MDIC, o ministro da Fazenda, do Trabalho. Todos foram favoráveis à medida, o único que não concordou foi o Rui Costa, da Casa Civil, e nada foi adiante depois disso.” Foi Costa, quando governador da Bahia, que iniciou as negociações para a instalação da BYD no Estado. Em outra frente há o risco de deslocamento de produção para o México, país com o qual o Brasil mantém acordo bilateral de livre comércio automotivo. Lima Leite alertou que o tarifaço de Trump, que elevou para 25% o imposto de importação de veículos nos Estados Unidos, poderá resultar em capacidade ociosa nas fábricas do país e perda de atratividade do Brasil em investimentos: “Se está ocioso no México por que investir em mais capacidade no Brasil?”. ATRASO NO MOVER O presidente da Anfavea também relatou que o atraso na regulamentação de metas de eficiência e de descontos no imposto previstos no Mover estão postergando investimentos e, diante do novo contexto global, poderá resultar em cancelamento de aportes já anunciados: “A indústria não convive com imprevisibilidade. Não temos ainda o valor que foi impactado, mas não só montadoras, autopeças também, estão postergando e revisando investimentos porque as regras não saem. O IPI Verde é todo mês adiado, prometido para o mês seguinte”. Coincidência ou não o decreto de regulamentação foi assinado dias depois, em 14 de abril, ainda com padrões de medições a serem divulgados. Para Henry Joseph Jr., diretor de sustentabilidade e parcerias estratégicas da Anfavea, os entraves sobre as medições de eficiência energética e emissões de CO2 já foram esclarecidos, o que não bastou para que as regras do IPI Verde fossem anunciadas: “O problema é que nada disso foi publicado e precisa ser de forma clara. Tem de sair logo, pois a indústria precisa começar a fazer medições e planejar produtos”.
20 Abril 2025 | AutoData EVENTO AUTODATA » CONGRESSO MEGATENDÊNCIAS 2025 O diretor informa que a publicação das metas é essencial para que as montadoras consigam planejar quais produtos pretendem lançar no País. A primeira medição das emissões deveria começar em setembro de 2026 e ir até setembro de 2027, mas o prazo está cada vez mais apertado. Ele citou também que os recursos em créditos tributários destinados a investimentos em projetos das empresas, para todo este ano, foram esgotados no primeiro trimestre. CHINA AMEAÇA INDÚSTRIA LOCAL Sahad, recém-reeleito para novo mandato na presidência do Sindipeças, pontuou que a China obrigou o resto do mundo a repensar suas práticas e a reanalisar os negócios: “Precisamos cada vez mais investir em novas tecnologias, inovação, digitalização, inteligência artificial. Isso exigirá das empresas capacidade de investimento muito grande. Para que possam ter essa musculatura, porém, haverá a necessidade de consolidação de empresas [leia-se fusões e aquisições], não porque querem, mas porque precisam”. O Brasil, inclusive, precisa ficar atento a uma grande ameaça: uma nova invasão chinesa, desta vez de carros similares aos produzidos no Brasil, mas 30% mais baratos e de alto volume. Foi o que alertou Pablo Di Si, hoje conselheiro de empresas, que foi CEO da Volkswagen do Brasil até 2022 e depois alçado à presidência do grupo nos Estados Unidos, onde ficou até 2024. “A balança comercial, antes de toda essa bagunça de tributação, era negativa para Estados Unidos com China em US$ 1 trilhão por ano. Todo esse negócio aqui não vai entrar mais nos Estados Unidos. Para onde acham que vai? Eles vão ter de encontrar um mercado alternativo.” Os chineses tentaram vender carros de entrada no Brasil há quinze anos e não deu certo mas, agora, têm gama completa, tanto de carros premium como de entrada, o que na visão de Di Si pode ser algo dramático para o setor automotivo nacional: “Se o País não tomar cuidado a indústria desaparecerá. E não tem que fazer estudo, tem que ser rápido, porque esse negócio será violento: os chineses já dominam o mercado latino-americano e não é com tecnologia, mas com preço”. GWM SEGUE COM PROJETO Apesar dos muitos atrasos a GWM segue com seu projeto de nacionalização. Andy Zhang, presidente da empresa no Brasil e México, em sua apresentação no Megatendências reforçou os planos da empresa para o mercado brasileiro. Ele confirmou que o início do processo de produção da fábrica de Iracemápolis, SP, está agendado para este primeiro semestre, começando com protótipos do Haval H6, ainda em fase de testes. Os veículos montados inicialmente em regime CKD chegarão às concessionárias no terceiro trimestre. Serão modelos híbridos com motores à combustão a gasoliPablo Di Si, de volta ao Brasil Andy Zhang, presidente da GWM Brasil e México
21 AutoData | Abril 2025 O SUV MAIS ACESSÍVEL DO BRASIL DESACELERE. SEU BEM MAIOR É A VIDA.
22 Abril 2025 | AutoData EVENTO AUTODATA » CONGRESSO MEGATENDÊNCIAS 2025 na – a previsão é lançar os híbridos flex em 2026. A capacidade instalada inicial da fábrica será de 30 mil veículos/ano, com horizonte de chegar a 50 mil. Segundo Zhang a localização da produção do Haval é uma aposta segura, pois o modelo tem boa aceitação global: já foram vendidas mais de 9,5 milhões de unidades do SUV desde o seu lançamento. A linha é líder de mercado na China há onze anos consecutivos. SCANIA VAI À CHINA No estilo se não pode com eles junte- -se a eles o presidente da Scania Latin America, Christopher Podgorski, afirmou que sua fábrica na China está quase pronta, com produção programada para iniciar na terceira semana de maio, após investimento de € 2,2 bilhões, o maior aporte da história da montadora. A capacidade será de 50 mil unidades por ano, volume previsto para ser atingido até 2029 – ao fim de 2026 a expectativa é chegar a 10 mil. Será a segunda maior da Scania: no Brasil a capacidade é para 30 mil veículos/ano, na Suécia o volume é de 70 mil. Podgorski revelou que no futuro é possível que sejam produzidos na mesma fábrica na China veículos de outras marcas do Grupo Traton – do qual a Scania faz parte junto com MAN e Volkswagen Caminhões e Ônibus. A unidade terá todas as áreas produtivas, menos a área de usinagem de motores, transmissões e outros componentes, que serão importados da Suécia e do Brasil e montados localmente. A ideia é que a nova unidade abasteça os mercados de Ásia e Oceania e que a brasileira siga como plataforma de exportação para a América do Sul e África. Por aqui a expectativa para 2025 é de usar 90% da capacidade instalada em São Bernardo do Campo, SP, e produzir 27 mil veículos até dezembro. “No ano passado produzimos mais de 30 mil veículos, chegando à capacidade máxima da fábrica. É difícil manter este ritmo, então 90% é um bom volume”. TARIFAÇO CRIA OPORTUNIDADES Sobre o tarifaço dos Estados Unidos a itens importados de quase todo o mundo o ex-embaixador, e CEO do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior, Rubens Barbosa, enxerga uma grande oportunidade para o agronegócio brasileiro, uma vez que a China buscará outros parceiros para se abastecer e o Brasil poderá se beneficiar disto. Poderá também haver negociação para reduzir a tarifa imposta ao aço importado, o que interessa à indústria estadunidense. Com relação aos riscos o setor automotivo poderá ser um dos afetados com o desvio de comércio à medida que países afetados, como os europeus, China e México, procurarão novos mercados, e o Brasil é um dos alvos. Além desta questão do desvio de comércio o País também sofrerá com a redução do crescimento ou queda da economia global, em desaceleChristopher Podgorski, presidente da Scania Latin America Rubens Barbosa, ex-embaixador e CEO do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior
23 AutoData | Abril 2025 ração que levará à queda das exportações brasileiras. Por outro lado a nova geopolítica deve acelerar novos acordos comerciais, principalmente da União Europeia com o Brasil: “Mas temos de procurar outros países asiáticos. Nós assinamos acordo com Cingapura e vemos oportunidades com Vietnã e Indonésia”. O economista chefe da Fiesp, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Igor Rocha, avalia que o aumento das incertezas globais, se prolongado, poderá ter efeitos negativos sobre os investimentos financeiros e produtivos e desencadear desaceleração da economia estadunidense. Exceto se a inflação fugir do controle a redução da atividade econômica dos Estados Unidos deverá resultar na queda dos juros no país. Como efeito em cadeia haverá menor pressão sobre o endividamento público brasileiro e um alívio tanto para a inflação como para a política monetária, ajudando a segurar a escalada dos juros no Brasil. Outro reflexo é a queda nos preços das commodities, por causa do menor crescimento global, o que desencadeará, por um lado, a redução da inflação, mas de outro uma pressão negativa sobre o real, pois pode haver redução de entrada de dólares pela via das exportações, tanto pela retração de embarques como pela redução dos preços internacionais. Considerando especificamente a tensão que se dá de forma mais intensa dos Estados Unidos com a China, Rocha reconhece que, em um primeiro momento, poderá haver enxurrada de produtos chineses no Brasil. Porém há também a possibilidade de abertura de mercado a produtos industrializados brasileiros nos Estados Unidos, uma vez que, lá, as sobretaxações reduzem a presença dos chineses e de outros concorrentes de peso. NECESSIDADE DE LOCALIZAÇÃO Gastón Diaz Perez, presidente da Bosch América Latina, e Sérgio Kramer, diretor geral da unidade de negócios de veículos comerciais e fora-de-estrada do Grupo Mobility América do Sul da Eaton, concordaram que, embora ainda não seja possível calcular o impacto das mudanças abruptas nas tarifas para exportar aos Estados Unidos, a guerra comercial torna ainda mais importante a necessidade de localizar produtos. No caso da Eaton o processo de localização foi uma dupla saída, pois representa a união da engenharia nacional e nacionalização da produção: “Hoje a nossas importações vêm se reduzindo em função dos nossos investimentos em P&D. Conseguimos avançar muito na diminuição das nossas dependências de importados. Reduzimos drasticamente. Nossa base de exportação é maior do que a de importação”. Na Bosch a situação é parecida: a companhia também exporta mais do que imIgor Rocha, economistachefe da Fiesp Gastón Diaz Perez (direita), presidente da Bosch América Latina, e Sérgio Kramer, diretor de unidade da Eaton América do Sul
24 Abril 2025 | AutoData EVENTO AUTODATA » CONGRESSO MEGATENDÊNCIAS 2025 porta. No entanto a maior parte dos embarques é para os Estados Unidos. De toda forma Perez esclarece que a guinada da economia mundial não influenciará as decisões de curto prazo. O executivo ressalta que a vocação da Bosch no Brasil e na região são os sistemas flex e biocombustíveis: “Investimos na fábrica de Campinas para continuarmos desenvolvendo os híbridos flex”. Os flex diesel-etanol também representam um novo filão para a empresa: “Começamos a mesclar diesel e etanol em motores do ciclo diesel, conseguimos mistura de até 50%”, afirmou, ao ressaltar a aplicação da tecnologia para veículos de mineração e agricultura. O Brasil responde por 20% desses setores mundialmente. ELÉTRICO A ETANOL Em uma demonstração das oportunidades que o Brasil traz na transição energética WEG e Horse uniram-se para desenvolver o primeiro sistema extensor de autonomia elétrica a etanol do mundo. O motor a combustão Horse fornece energia ao elétrico WEG. A solução já é aplicada em um ônibus Volare híbrido com tração 100% elétrica. Alex Passos, gerente de powertrain da WEG, justificou que somente o sistema elétrico a bateria não sustentaria a operação de um ônibus municipal ou interestadual, o que se torna possível com a extensão de autonomia garantida pelo motor-gerador a combustão: “Tudo que nós precisávamos para a hibridização de um veículo a etanol estava pronto. O produto foi bem aceito”. Ponto interessante é que o sistema permite baixar em torno de 50% o tamanho do módulo de baterias utilizado por um veículo puramente elétrico, garantindo redução de custo e peso. Para Márcio Melhorança, diretor de pesquisa e desenvolvimento da Horse, é isto que torna o projeto economicamente viável. O sistema, ainda em fase de homologação, pode ser regulamentado em termos de eficiência energética como veículo elétrico ou híbrido, afirma o executivo: “Estamos discutindo como regulamentaremos tudo isso para poder homologar a sua eficiência energética”. ELETRIFICAÇÃO É DESEJO, MAS CUSTA Emanuele Cappellano, presidente da Stellantis América do Sul, em sua apresentação disse acreditar que a eletrificação é uma exigência não só do governo mas, também, dos consumidores, que entendem e desejam partir para a eletrificação. Nas contas da companhia até 2030 mais de 50% das vendas de carros no Brasil será de modelos híbridos ou elétricos. “Hoje um carro elétrico, comparado a um a combustão, custa aproximadamente US$ 10 mil a mais”, disse, ressaltando ser esta uma medida no custo de produção do automóvel, não o seu preço de venda. “É muito difícil pensar que a frota circulante no Brasil possa ser equipada no curtíssimo prazo com tecnologia que custa R$ 55 mil Alex Passos (esquerda), gerente de powertrain da WEG, e Márcio Melhorança, diretor de pesquisa e desenvolvimento da Horse Emanuele Cappellano, presidente da Stellantis América do Sul
25 AutoData | Abril 2025 A Neo Rodas, empresa do Grupo ABG, foi reconhecida pela Hyundai como Fornecedor do Ano de 2024, reforçando nosso compromisso com a qualidade, inovação e a entrega de soluções que impulsionam a indústria automotiva.
26 Abril 2025 | AutoData EVENTO AUTODATA » CONGRESSO MEGATENDÊNCIAS 2025 a mais. O híbrido é um intermediário que custa R$ 5 mil ou R$ 6 mil a mais, é bem mais viável.” E há outras tendências tecnológicas, ressalta, ao falar da conectividade, presente hoje em mais de 80% dos veículos zero-quilômetro ofertados no Brasil. Mas tudo aumenta o custo: “O mercado brasileiro poderia ser potencialmente de 5 milhões de carros/ano mas ainda estamos abaixo de 4 milhões porque os carros custam e as tecnologias que precisaremos introduzir aumentarão ainda mais o custo. A única opção é localizar e desenvolver localmente as soluções que sejam aptas e consistentes para o dia-a-dia do Brasil”. DESFOSSILIZAR É O OBJETIVO Os termos eletrificação e descarbonização são questionados por Gonçalo Pereira, professor e líder do laboratório de genômica e bioenergia da Unicamp. Para ele o uso de baterias não deveria ser a única alternativa para retirar emissões de CO2 da atmosfera: “O problema não é o carbono mas o carbono fóssil [de derivados de petróleo]. Não é a combustão, mas o combustível. Precisamos desfossilizar o planeta”. Embora existam contrapontos, pois enquanto um motor térmico tem eficiência de apenas 35% e um elétrico chega a 90%, o professor enxerga a situação por outro viés, ligando o nível de emprego ao uso de outras tecnologias: “O motor normal tem peças e peça é emprego”, lembrando que um propulsor elétrico tem menos peças e, com isso, pode eliminar posições de trabalho sem chegar ao objetivo de diminuir as emissões globais. “O Brasil precisava de R$ 1,5 trilhão para ter rede mínima de suporte aos modelos elétricos. Se colocar ônibus a bateria de São Paulo para recarregar todos ao mesmo tempo o bairro simplesmente para.” Alternativa seria estabelecer o biometano como matriz para a transição ecológica dos ônibus, que pode vir de várias fontes de matéria orgânica, como cana, agave, aterros sanitários e criadouro de porcos. TRANSIÇÃO COM EMPREGOS Alessandro Pansanato Rizzato, gerente de transição ecológica em inovação do CNI Senai, afirmou que até 10 milhões de empregos deverão ser criados em áreas que promovem a descarbonização na indústria brasileira de 2025 a 2040. Conforme estimativa da CNI, Confederação Nacional da Indústria, a maior parte dos postos de trabalho, 3,5 milhões, deverá ser gerada nos setores de bioeconomia e biotecnologia. Outra parcela significativa de empregos deverá ser criada no segmento de agricultura sustentável, com 2 milhões de vagas. De acordo com o levantamento segmentos que também deverão gerar números expressivos de postos de trabalho são infraestrutura e adaptação climática, com 1,6 milhão, transição energética, com 1,4 milhão, economia circular, 1,2 milhão, indústria e mobilidade, 700 mil, e outros 300 mil. Gonçalo Pereira, professor e líder do laboratório de genômica e bioenergia da Unicamp Alessandro Pansanato Rizzato, gerente de transição ecológica e inovação do CNI/Senai
27 AutoData | Abril 2025 “Entendemos que políticas de incentivo à ciência, tecnologia e inovação, a exemplo do Programa Mover, poderão potencializar o avanço deste segmento.” ETANOL CRESCE No Brasil, segundo o diretor de inteligência setorial da Unica, Luciano Rodrigues, o etanol tradicional da cana-de- -açúcar responde, atualmente, por cerca de 80% da produção nacional. A parcela restante tem origem no milho, que vem crescendo ano a ano como matéria-prima para produção do biocombustível. A estratégia faz sentido, uma vez que o milho é plantado como segunda colheita, em geral, em terras que foram usadas pouco antes para o plantio da soja. Se antes o grão era pouco utilizado para produção de etanol no Brasil, agora é uma alternativa mais do que viável comercialmente. Dos 35,9 bilhões de litros produzidos anualmente no País, 6,3 bilhões foram derivados do milho. Embora as fontes atuais de etanol sejam cana e milho Rodrigues também destaca o promissor uso do agave, planta que tem uma variedade dedicada à produção de tequila e pode ser cultivada em regiões áridas, como no Nordeste brasileiro. Com longa história de uso de etanol o Brasil se apresenta ao mundo como um exemplo positivo, pois a produção de biocombustíveis no País, além de reduzir significativamente emissões fósseis, ocupa menos de 1% do território nacional e não concorre com o cultivo de alimentos. De acordo com Roberto Braun, diretor de comunicação corporativa e ESG da Toyota, o benefício da utilização de biocombustíveis fica claro em um Corolla híbrido com motor flex abastecido com etanol, que emite cerca de 70% menos CO2 do que um veículo com motor convencional a gasolina. A solução brasileira gera interesse crescente por biocombustíveis em outros países, como a Índia e o Japão, que buscam seguir o modelo brasileiro. Braun contou que até o momento híbridos flex são enviados comercialmente apenas para o Paraguai, país que já tem boa infraestrutura de abastecimento de etanol. Mas a Toyota também enviou protótipos para testes na Indonésia, Índia e Colômbia. “Nesta condição o Brasil já exporta para a Colômbia. Passaria, então, a exportar o veículo flex e o híbrido flex produzido aqui no Brasil. Da mesma forma a Bolívia, que tem produção de cana, e a Argentina, que tem produção de etanol, com cerca de 50% da cana e 50% do milho. Por lá há uma mistura de 12% de etanol, que poderia aumentar.” Pablo Di Si, que já foi chamado de dinossauro por defender o etanol, ressaltou que o combustível nunca funcionará na Alemanha: não porque eles não querem mas, sim, porque eles não têm: “Se tivessem etanol não teriam carros elétricos e, sim, a etanol” [Com reportagens de Caio Bednarski, Lucia Camargo Nunes e Júlio Cabral] Luciano Rodrigues, diretor de inteligência setorial da Unica Roberto Braun, diretor de comunicação corporativa e ESG da Toyota
28 Abril 2025 | AutoData EVENTO AUDODATA » FÓRUM PERSPECTIVAS CAMINHÕES Depois de um ano positivo em 2024 a expectativa era de manutenção do crescimento em 2025, porém a indústria de caminhões se deparou com uma forte neblina na estrada que embaçou o horizonte, causada pelo avanço da taxa de juros que encarece os financiamentos, instrumento essencial para a compra de novos veículos comerciais. Diante desse novo cenário AutoData reuniu executivos do segmento para debater o futuro deste mercado e os possíveis efeitos negativos que virão Por Caio Bednarski Juro alto liga alerta de mercado menor Financiamento caro e pressão nos custos assustam clientes de caminhões e de implementos rodoviários até dezembro no Fórum Perspectivas Caminhões, realizado no formato on-line em 18 de março. Um dia depois do evento o Banco Central elevou a taxa básica de juros Selic de já expressivos 13,25% ao ano para 14,25%. Foi a terceira alta seguida de 1 ponto porcentual e a expectativa é de nova elevação para 15% até maio. Para Alexandre Parker, diretor de relações públicas da Volvo América Latina e vice-presidente da Anfavea, os próximos três meses serão cruciais para indicar o
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